MUSEU DE CERÂMICA DE SACAVÉM
Fábrica de Loiça de Sacavém foi uma célebre unidade industrial de produção cerâmica fundada em 1850 e situada na freguesia de Sacavém, tendo marcado profundamente o quotidiano da povoação e celebrizado-a, não apenas dentro de Portugal, como também fora dele – de tal forma que a frase «Sacavém é outra loiça!» se tornou o expoente máximo dessa fama. Hoje em dia é sede do Museu da Cerâmica de Sacavém.
A fábrica situava-se na Quinta do Aranha, junto da da actual linha de caminho-de-ferro da Azambuja, tendo chegado a ocupar, na sua época áurea, uma superfície de 70 000 m²; a essa implantação não era alheia a construção do primeiro ramal de comboio em Portugal (ligando Lisboa ao Carregado, com paragem em Sacavém), que viria a ser inaugurado em 1856, permitindo assim uma mais fácil expedição das mercadorias e matérias-primas.
A fábrica teria sido instituída em 1850 (pelo menos, assim o indicava um dos painéis de azulejos colocados à entrada da fábrica, e que foi visível até meados da década de 1990), por Manuel Joaquim Afonso.
Nos anos em que esteve à frente da fábrica, Manuel Joaquim Afonso teve que fazer face a diversos problemas financeiros, pelo que entre 1861 e 1863 a fábrica acabou por ser vendida a um inglês, John Stott Howorth, que introduziu novas técnicas de produção oriundas do Reino Unido. Em poucos anos, a Fábrica da Loiça tornava-se numa das mais importantes em Portugal no ramo da produção cerâmica, destacado-se pela produção de faiança fina baseada no caulino (uma argila com alto grau de pureza); o sucesso alcançado é tal que o rei D. Luís I confere a Howorth título nobiliárquico (Barão de Howorth de Sacavém), e ainda o privilégio de a fábrica se poder intitular Real Fábrica de Loiça de Sacavém. Para além disso, nos últimos anos da sua vida, o rei-consorte D. Fernando II executou e pintou várias peças cerâmicas na Fábrica, dada grande amizade que o unia ao Barão de Sacavém.
À data da sua morte, em 1893, já a louça de Sacavém se achava fortemente implantada no mercado, rivalizando por exemplo com a Vista Alegre, de Ílhavo; no ano seguinte a baronesa Howorth de Sacavém estabeleceu uma sociedade em comandita com o antigo guarda-livros da fábrica, James Gilman, a qual assegurará a administração da mesma até à morte da Baronesa, em 1909, altura em que Gilman assume sozinho o governo da empresa.
Mantém-se a aposta na ligação estratégica ao mercado inglês, tanto ao nível da exportação do produto final, como da aquisição de novas tecnologias para a fábrica – em 1912, por exemplo, é inaugurado um forno-túnel com 8 metros de altura e 85 metros de comprimento, obra de dimensões colossais, e onde pela primeira vez se utilizou betão armado em Portugal.
A Fábrica de Loiça tornou-se numa das principais unidades fabris da cintura industrial da zona oriental de Lisboa (compreendida entre o Beato e Vila Franca de Xira), e o seu sucesso foi tal que conduziu ao aumento vertiginoso da população de Sacavém (que, por alturas da fundação da fábrica, teria pouco mais de 350 habitantes, tendo, porém, a partir de então aumentado a população da freguesia de uma forma constante e sustentada), sendo que em 1890, mais de metade dos quase 1890 habitantes da povoação tinham o seu emprego na Fábrica de Loiça. Muitos dos que aí trabalhavam eram oriundos de várias partes do País, que se deslocavam para a capital e zonas suburbanas na busca de melhores condições de vida.
“De longe vieram homens e mulheres, a maioria alentejanos e beirões, mas também de outras paragens nacionais e estrangeiras. Eram sobretudo rurais, em busca de um sonho e salário certo, saídos dos campos para engrossar as fileiras do operariado fabril. Habituados ao trabalho de sol a sol, depressa se acostumaram à sirene da fábrica. Uns vinham à descoberta, outros com destino certo e familiares já empregados.
Os mais afortunados conseguiram uma habitação patrocinada pela fábrica, no Bairro da Covina, da Cortiça, do Manuel Dias ou da Sacor; os restantes ficavam pelas pequenas vilas e pátios particulares, próximos das unidades fabris, uma correnteza de casas térreas arrendadas” segundo publicação da Câmara Municipal de Loures, acerca da exposição “ museu de Cerâmica de Sacavém”
Dessa forma, numa povoação fortemente terciarizada, não é de estranhar que a maior parte dos habitantes fossem adeptos de doutrinas como o socialismo e o republicanismo, tendo-se desenvolvido fortemente o associativismo (é pelas mãos dos operários que nascem, por exemplo, a Cooperativa de Crédito e Consumo «A Sacavenense»Pela sua gerência inglesa, a Fábrica de Loiça de Sacavém foi pioneira em certas medidas que denotam a existência de preocupações sociais da parte do patronato: a criação de uma escola dentro da fábrica, a existência de um caixa de socorros mútuos para os seus trabalhadores, o direito a férias remuneradas, e a instituição de campos de férias para os filhos dos trabalhadores da fábrica.
Nas primeiras décadas do século XX, o pintor Jorge Colaço executou na fábrica os azulejos para diversas das suas mais significativas obras: a Estação de São Bento, no Porto (1903), o Palace-Hotel do Buçaco, no Luso (1907), o Pavilhão dos Desportos, em Lisboa (1922), ou a Casa do Alentejo, também na capital.
Em 1921, com a morte de James Gilman, sucede-lhe à frente da fábrica o seu filho Raul Gilman, tendo como sócio um outro inglês, Herbert Gilbert.
A povoação continua a crescer, em grande parte devido à fábrica, de tal forma que em 1927, o governo de ditadura militar saída da Revolução Nacional de 28 de Maio de 1926 decide atribuir o estatuto de vila à povoação de Sacavém.
Esse crescimento desta empresa fabril estende-se fora desta localidade, nomeadamente, associando-de à Fábrica Cerâmica do Carvalhinho, em Vila Nova de Gaia, e que era o decorador de interiores Dr. Fiel Viterbo o intermediário entre os seus sócios..
Em 1962 ascendia à administração o filho de Herbert Gilbert, Leland Gilbert, e em 1970, entrava-se na última fase de vida da fábrica, com o derradeiro dono, Clive Gilbert.
Após o 25 de Abril de 1974, a Fábrica de Loiça entra num conturbado período, tanto a nível laboral, como financeiro, acabando a fábrica por encerrar em 1983 (em 6 de Dezembro do ano anterior, Monteiro Pereira, o administrador da fábrica, fora assassinado à saída da sua casa, em Almada, por uma rajada de metralhadora, num atentado perpetrado pelo grupo terrorista F.P.’s – 25 de Abril); em 23 de Março de 1994, o Tribunal Cível da Comarca de Lisboa declarou a sua falência, fechando definitivamente as portas a 7 de Abril.
A isto se seguiu a venda dos seus bens em hasta pública.
MUSEU DE CERÂMICA DE SACAVÉM
Este museu tem a tutela da Câmara Municipal de Loures e tem como diretora : Patrícia Silva. Fica localizado na Urbanização Real Forte – Rua Álvaro Pedro Gomes (Entrada piso 1) – 2685-137 SACAVÉM / Praça Manuel Joaquim Afonso (Entrada piso 0) – SACAVÉM
E-mail:museu_ceramica@cm-loures.pt Site: http://www.cm-loures.pt/
No acervo do Museu de Cerâmica de Sacavém destacam-se dois núcleos: peças fabricadas na Fábrica, abrangendo as tipologias de loiça doméstica, loiça decorativa, loiça de higiene/sanitária e cerâmica de revestimento e os materiais e utensílios usados na fabricação, como moldes de gesso e madeira, materiais de experimentação e do laboratório, maquinarias, pigmentos originais instrumentos de trabalho. Em termos cronológicos abrange um período desde 1865 até à década de 80 do século XX num total de 8.000 peças.
O Museu de Cerâmica de Sacavém foi inaugurado a 7 de julho de 2000. A decisão de instalar um Museu em torno do Forno 18 (património da antiga Fábrica de loiça de Sacavém, de construção do final do século XIX, com 10 bocas para alimentação a lenha) e com a missão específica de abordagem da História da Fábrica, foi consequência do processo de encerramento da unidade fabril e da importância que a comunidade local e o Município atribuíam à necessidade da permanência dos vestígios significativos da Fábrica e em torno da qual a própria localidade se desenvolveu.
Memórias da Fábrica de Loiça de Sacavém
No local onde originalmente se encontrava a fábrica desenvolveu-se uma urbanização que, entre as contrapartidas negociadas pelo município com a empresa construtora, promoveu a preservação de um pequeno espaço da zona fabril, onde se veio a implantar o Museu de Cerâmica de Sacavém (http://www.cm-loures.pt/aa_patrimonioredemuseussacavema.asp), inaugurado em 2000. Este museu integrou parte dos arquivos da antiga FLS no acervo do Centro de Documentação Manuel Joaquim Afonso (http://www.ipmuseus.pt/pt-PT/rpm/museus_rpm/admin_local/PrintVersionContentDetail.aspx?id=1234) e apresenta algumas centenas de peças da produção da fábrica, promovendo ainda exposições e actividades regulares de divulgação da história, do património e do saber-fazer na cerâmica.
O Museu Nacional do Azulejo (http://mnazulejo.imc-ip.pt/) é também depositário de parte do património cerâmico da Fábrica de Loiça de Sacavém, conservando nas sua reservas exemplares de particular relevância na história dos vidrados, da modelagem e das diversas técnicas da fábrica.
Em 2007 constituiu-se a Associação Amigos da Loiça de Sacavém, que conta entre os seus associados com Clive Gilbert, último administrador e proprietário da fábrica.
ANTÓNIO FREITAS com site do museu e CM Sacavém ( fotos e referencias bibliográficas)