Nma entrevista exclusiva à RFI, uma jovem saudita, que fugiu do marido após um casamento forçado, conta como conseguiu escapar. Vítima de violência doméstica, conseguiu ser considerada como refugiada na França.
Tal como sua compatriota Rahaf Mohammed al-Qunun, que no mês passado chamou a atenção do mundo ao fugir da família durante uma escala em Bangkok, a jovem saudita, que não quer ser identificada e pede para ser chamada de Julia, aproveitou uma passagem no aeroporto de Paris para escapar do cárcere privado. Casada à força em seu país, sempre recusou o matrimônio. “Ele era mais velho que eu, rico e nojento. Um louco, que tentava violar-me e que me privava de comida quando eu não queria dormir com ele. Quase me matou e eu cheguei a pensar em suicídio”.
Julia não podia fugir em seu país, já que na Arábia Saudita as mulheres vivem sob a autoridade de um tutor masculino (pai, marido, tio ou irmão), que controla toda sua vida, inclusive a obtenção de um passaporte. Mas quando, há cinco anos, desembarcou com o marido no aeroporto internacional de Paris para a viagem de lua de mel, aproveitou o momento de retirada das bagagens e alertou as autoridades. “Quando ele foi recolher as malas, eu disse ‘é agora ou nunca’”, conta a jovem. “Dirigi-me a um polícia e pedi para me salvarem”, recorda. “Eu chorava tanto que o policia percebeu que estava acontecendo algo. Ele afastou meu marido e ficou com o meu passaporte.”
Julia diz que ficou tão feliz e aliviada que imediatamente tirou seu hijab e sua abaia, trajes típicos usados pelas mulheres muçulmanas na Arábia Saudita, que cobre todo o corpo e parte do rosto. “Joguei tudo no lixo. Quando meu marido viu aquilo, ficou furioso. Eu só chorava de alegria. Era como se tivesse nascido de novo naquele momento”.
A jovem foi em seguida encaminhada para as autoridades para dar entrada na documentação para solicitar o status de refugiada. Julia, que atualmente tem 27 anos, vive na França e tem pouco contato com a Arábia Saudita. Mas é cética quando questionada sobre os avanços em termos de liberdades individuais anunciados recentemente pelo governo de seu país. “Eu só vejo propaganda, e não mudanças. Eles autorizam as mulheres a conduzir para mostrar ao mundo que elas têm direitos. Nós não pedimos apenas o direito de dirigir carros. Queremos o direito de escolher nossas vidas”.