Nasceu a 17 de fevereiro de 1869 em S. Brás de Alportel, mas foi registado em Belém (Lisboa) de onde partiria 53 anos depois a bordo do Lusitânia e na companhia do seu grande amigo Sacadura Cabral para a primeira travessia do Atlântico, ligando Lisboa ao Rio de Janeiro.
Distinguiu-se como cartógrafo e geodeta desde a sua primeira comissão em Timor, cartografando todo aquele território mas também o Niassa, o Congo, Zambézia e S. Tomé e Príncipe, tendo feito a delimitação da fronteira entre Angola e o Zaire. Foi no decurso destes trabalhos que fez a pé a travessia de África onde conheceu o seu amigo Sacadura Cabral.
A amizade com Sacadura Cabral foi sempre especial. Foi este que o incentivaria a dedicar o seu conhecimento ao problema da navegação aérea que estava a despontar por todo o mundo, entregue à acção de meia dúzia de aventureiros, sem qualquer base científica. Apoiado pelo amigo desenvolveu o sextante de horizonte artificial, que posteriormente foi comercializado pela empresa alemã Plath com o nome “Sistema Gago Coutinho”.
Juntos inventaram ainda um “corretor de rumos” (o “plaqué de abatimento”) aparelho que compensava o desvio causado pelo vento. Para testar essas ferramentas de navegação aérea, realizaram em 1921 a travessia aérea Lisboa-Funchal, para no ano seguinte “atacarem” então o grande Oceano Atlântico.
A grande Travessia Aérea do Atlântico Sul
São 7 horas da manhã do dia 30 de março de 1922. A chuva cai miudinha, mas nem assim se alteram os planos. O biplano “Fairey II” corre quinze segundos pelas águas do Tejo e eleva-se nos ares em direção ao Bugio, marcado como primeiro ponto de referência pela navegação aérea de precisão. Aos comandos seguem os aviadores Gago Coutinho e Sacadura Cabral e têm como destino o Rio de Janeiro.
Cinco dias antes (a 25 de Março) largaram os navios de guerra República, Cinco de Outubro e Bengo, que iriam prestar assistência de voo, durante a travessia.
A primeira etapa da viagem decorreu sem percalços de maior, durando 8 horas e 17 minutos de Lisboa até Las Palmas. A seguir, em Guando o traçado do percurso teve ainda de ser revisto porque a provisão de combustível não seria suficiente para um voo sem escala de Cabo Verde a Fernando de Noronha.
A segunda etapa iniciou, assim, na madrugada de 5 de abril com uma descolagem da ilha de Guando, alcançando S. Vicente de Cabo Verde, após 10 horas e 43 minutos, amarando em mar calmo e sem dificuldades. Apesar do sucesso destas duas primeiras fases de voo, que originara o baptismo do avião por decreto, como Lusitânia, adivinhava-se praticamente impossível um voo directo entre S. Vicente e Fernando de Noronha, devido aos elevados consumos de combustível.
Perante a vontade de continuar a viagem e provar a precisão do voo aéreo, e dos instrumentos utilizados, Gago Coutinho e Sacadura Cabral decidiram fazer escala nos Penedos de S. Pedro e S. Paulo, onde o cruzador República lhes prestaria assistência.
Na terceira etapa da viagem, cuja partida se deu a 18 de abril, persistiam as dificuldades a nível do combustível e o vento não ajudava numa deslocação mais rápida do avião. A precisão dos cálculos de Gago Coutinho permitiu que o avião iniciasse a sua descida até aos penedos quando apenas restavam dois a três litros no tanque. Verificou-se ,assim, uma descida forçada sobre o mar cavado, que arrancou um dos flutuadores, o que levou a que o hidroavião se inclinasse para bombordo, tendo, por isso, entrado água na proa.
Mas tal como estava previsto o cruzador República acorre ao acidente, salvando os pilotos, os livros, o sextante, o cronómetro e ainda outros instrumentos, tudo transportado de seguida juntamente com os dois pilotos para a ilha de Fernando de Noronha.
Para perpetuar o ocorrido, os aviadores deixaram nos penedos um padrão de chapa de ferro, onde está cravado a letras de latão: «Hidroavião Lusitânia – Cruzador República».
uma nação em delírio
A Nação portuguesa entrou em delírio e o clima emocional levou o Governo a enviar outro avião, oferecido pelo Ministério da Marinha. Durante estes contratempos, os dois heróis ficaram ancorados na ilha de Fernando de Noronha, a bordo do República, onde decidiram que a nova etapa não devia iniciar naquela ilha, sendo preciso voltar atrás e sobrevoar os Penedos de S. Pedro, rumo ao Brasil, para que toda a distância fosse cumprida.
O novo avião “Fairey”, para o qual foram transplantadas as asas do outro avião, a fim de lhe proporcionar uma maior sustentação, levantou voo da ilha de Fernando Noronha, na manhã de 11 de maio.
O voo prosseguiu sem problemas de maior, mas, após sobrevoar os penedos e já em direcção ao Brasil, o motor parou obrigando os pilotos a uma amaragem de emergência. Embora esta tenha sido perfeita e em mar calmo, a longa espera por auxílio teve como consequência uma situação trágica, dado que os flutuadores metiam água e foram afundando o aparelho lentamente. Com a chegada do cargueiro britânico Paris-City, solicitado pelo comandante do República, mais uma vez os pilotos foram resgatados e, consequentemente, louvados na sua Pátria. Aquando da chegada a Fernando de Noronha, o Governo Português foi novamente procurado para enviar um outro avião.
A quarta e última etapa teve início com o envio do “Fairey 17”, o único de que dispunha agora a Aviação Naval Portuguesa, mais pequeno e com menos autonomia do que os outros, mas considerado suficiente para que a viagem prosseguisse em modestas etapas até ao Rio de Janeiro.
Assim, no dia 5 de junho, Sacadura Cabral e Gago Coutinho levantaram voo de Fernando de Noronha e iniciaram o final desta histórica e gloriosa viagem, já sem quaisquer problemas ou incidentes mecânicos.
Recife, Salvador da Baía, Porto Seguro, Vitória, e, finalmente, Rio de Janeiro, onde o terceiro Fairey, baptizado de Santa Cruz, desce, ao princípio da tarde de 17 de junho, na enseada da Guanabara, levando os corações de portugueses e brasileiros a baterem alvoraçadamente e em uníssono.