Construir um biomaterial capaz de remover do estômago a bactéria cuja infeção está associada ao cancro gástrico é o projeto de investigação que nove Inês Gonçalves. Identificar as moléculas envolvidas no processo de transmissão da malária e alterar a capacidade do parasita se instalar, para descobrir novas pistas que levem à criação de uma vacina é o que pretende Joana Tavares. Reutilizar os gases de anestesia, reduzindo os custos e os desperdícios hospitalares é o trabalho que Luísa Neves está a desenvolver. Estes projetos de investigação valeram às três cientistas portuguesas, escolhidas entre cerca de 100 candidatas, as Medalhas de Honra l’Oréal Portugal para as Mulheres na Ciência.
Lançado em 2004, numa parceria da LOréal Portugal, Comissão Nacional da UNESCO e Fundação para a Ciência e a Tecnologia, o programa científico tem por objetivo “incentivar jovens investigadoras que efetuam a sua pesquisa em Portugal, já doutoradas e com idade até aos 35 anos, a prosseguir estudos originais e relevantes para a saúde e o ambiente” refere uma nota divulgada pela organização do galardão. Na 10ª edição do programa, o júri científico presidido pelo professor Alexandre Quintanilha selecionou os trabalhos de Inês Gonçalves, Joana Tavares e Luísa Neves entre cerca de 100 candidaturas.
Tratamento inovador do cancro gástrico
Construir um biomaterial capaz de se ligar à bactéria ‘Helicobacter pylori’ – cuja infeção está associada ao cancro gástrico – e que permita removê-la do estômago, é o que se propõe Inês Gonçalves. A investigadora quer eliminar a bactéria do estômago, através do desenvolvimento de novos biomateriais com a forma de microesferas. “Quando tomadas por via oral, estas pequenas esferas irão ligar-se às bactérias presentes no estômago, removendo-as pelo trato gastrointestinal”, explica a nota divulgada à imprensa.
Produzidas com um polímero natural proveniente da quitina existente no endosqueleto da lula, e revestidas com açúcares semelhantes aos existentes na parede e mucos do estômago, as microesferas terão diferentes dimensões e porosidades para que possam alcançar e ligar-se às bactérias nas várias regiões do estômago.
O objetivo de Inês Gonçalves é desenvolver um tratamento inovador que possa ser usado em alternativa aos antibióticos. Isto porque, apesar de serem a única forma de combater a infecção por ‘Helicobacter pylori’, os antibióticos mostram-se ineficazes num em cada cinco casos. Estima-se que o tratamento convencional por infeção de ‘Helicobacter pylori’ baseado em antibióticos, falhe em cerca de 140 milhões de casos.
Uma vacina para a malária
Ao entrar na circulação sanguínea, o parasita da malária injetado pelo mosquito fica retido nos sinusóides hepáticos, o que lhe permite instalar-se no fígado. Identificar as moléculas envolvidas nesse processo e alterar a capacidade do parasita se instalar no fígado, pode abrir novos caminhos para o desenvolvimento de uma vacina que previna a malária. É esse o desafio de Joana Tavares, numa investigação a dar continuidade aos trabalhos que realizou no Instituto Pasteur, em Paris, durante o seu pos-doutoramento.
Joana especializou-se na utilização de técnicas de imagem em tempo real para decifrar os mecanismos que o parasita da malária utiliza, nomeadamente pela forma injetada pelo mosquito, para conseguir vencer as defesas do hospedeiro e instalar-se no fígado. “Durante este estudo, verificou que, numa fase inicial, esta forma do parasita fica retida de modo eficaz nos sinusóides hepáticos”, e agora quer identificar a molécula ou moléculas do parasita “que são responsáveis por este fenómeno”. “Ao fazê-lo, Joana poderá interferir com a capacidade do parasita ficar retido na circulação hepática e avaliar se as alterações produzidas poderão constituir um alvo a considerar no desenho de uma vacina para a malária”, explica a mesma nota.
Reduzir desperdícios hospitalares
Já Luísa Neves pretende criar um processo de reutilização dos gases de anestesia através da remoção e captura do dióxido de carbono que se produz pela expiração dos doentes e que contamina o gás anestésico. O objetivo é reduzir os custos e os desperdícios hospitalares.
O projeto da investigadora da Universidade Nova de Lisboa propõe a criação de um processo inovador para a remoção eficiente e segura de dióxido de carbono que se produz sempre que o doente expira durante a cirurgia, contaminando o gás de anestesia e impedindo que este volte a ser utilizado.
“Ao remover o dióxido de carbono, o gás anestésico pode ser reutilizado (nomeadamente o gás Xenon), reduzindo os custos hospitalares na área da cirurgia. O impacto económico será também relevante porque a estratégia proposta permite eliminar também a despesa hospitalar associada à incineração do hidróxido de cálcio, que é atualmente utilizado para a captura de dióxido de carbono. Para além de eliminar este custo, o processo proposto possibilita igualmente a captura do dióxido de carbono”, lê-se na nota da organização.
A investigadora propõe conjugar um líquido iónico biocompatível e a enzima ‘Anidrase Carbónica’ que vão remover o dióxido de carbono de forma seletiva. A utilização de um contactor de membranas caracterizado por uma elevada área de transferência de massa num reduzido volume permite o desenvolvimento de um equipamento compacto, adequado para uso hospitalar.
Ana Grácio Pinto
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