O empresário e presidente da Confederação Empresarial Portuguesa (CIP) é de opinião que “o Estado tem que cumprir o seu papel de fiscalizador, de regulador”, mas não mais do que isso, porque “é a iniciativa privada que faz acontecer”. Em declarações ao «Mundo Português» à margem do Encontro Mundial de Empresários da Diáspora, que reuniu em Viseu cerca de 40 homens e mulheres de negócios portugueses radicados no estrangeiro, António Saraiva deixou um recado aos governantes: “é preciso promover o investimento directo estrangeiro”.
Trata-se de promover o investimento directo estrangeiro, independentemente de estarmos a falar da Diáspora ou de outros povos que queiram investir em Portugal. Há que dotar a economia portuguesa de mecanismos de apoio destinados ao investimento e eles passam pela burocracia, pela carga fiscal – é preciso saber que carga fiscal Portugal exige aos investidores – e pela previsibilidade porque as regras não podem mudar a meio do jogo. Não podemos em junho ou julho alterar regras que vinham de janeiro e aplicá-las a partir do mês seguinte e a meio do ano, porque os orçamentos das empresas fazem-se com um ano de antecedência e não vamos alterar preços e toda a estratégia empresarial em função de uma alteração de impostos.
Por isso, diria que são importantes três factores: carga e previsibilidade fiscal, desburocratização e justiça económica alterada. Lamentavelmente, ainda hoje em Portugal um processo em primeira instância demora cerca e 980 dias a ser julgado, quando, por exemplo, na República Checa demora cerca de 150 dias. Temos de tratar também de reformar a justiça económica.
Basta resolver essas três questões ou há ainda algo mais a fazer?
Tem existido até agora um erro de comunicação em relação às melhorias que se fizeram em Portugal a nível do investimento, seja interno ou externo. Porque promoveram-se grandes alterações. A reforma do licenciamento industrial com a criação do Programa de Indústria Responsável (PIR) e o Sistema de Indústria Responsável (SIR), o programa «Licenciamento Zero» e as Zonas Empresariais Responsáveis (ZER) – parques industriais onde as empresas se podem instalar estando previamente licenciadas, porque o parque está licenciado por todo o conjunto de legislação exigido.
Fez-se muito caminho no sentido de atrair investimento e que muitas vezes é desconhecido pelos investidores. Falta, fundamentalmente, levar ao conhecimento da diáspora, aquilo que Portugal alterou para melhor, dizer àqueles que querem cá investir o que o país de facto lhes oferece e não lhes oferecia há cinco anos atrás, por exemplo. Quer na legislação laboral, quer na ambiental.
Reafirmo que há ainda reformas por fazer: na carga fiscal, na justiça económica. Mas a grande reforma é desde já na Administração Pública. Que Estado devemos ter, qual a sua dimensão, onde se deve manter e de onde deve sair. O Estado deve dar mais espaço à iniciativa privada – ou privatizando, ou concessionando serviços que hoje estão na mão do Estado. Por isso na minha intervenção referi que não pode ser um empecilho, tem que ser um facilitador.
Aquilo que falta de facto é uma maior e melhor comunicação, porque muitos dos investidores da Diáspora desconhecem o que Portugal tem para lhes dar, Esse é um erro de comunicação que tem que ser ultrapassado. Os investidores precisam também de financiamento, se não houver capitais próprios. E havendo a necessidade de recurso a capitais alheios, ou seja, bancários, precisam ter taxas de juro em condições atractivas.
E hoje, também a esse nível, encontramos algumas dificuldades, porque os spreads, as taxas de juro praticadas pela banca portuguesa ainda são de alguma maneira elevadas, comparativamente a outros países. Digo e repito que não faz sentido estarmos numa União Europeia onde um empresário al emão para investir paga 1% de taxa de juro e eu que estou em Portugal – com a degradação do rating que sofremos e que acabou por afectar os bancos – tenho que pagar 7%, 8% para o mesmo valor de investimento. Não há aqui uma verdadeira união económica. Aí, são as políticas comunitárias que têm que ser revistas, ser alteradas para que os Estados membros tenham alguma capacidade de atrair investimento.
Referiu ainda que “estamos carentes de vontade de iniciativa privada”. Vê alguma luz ao fundo do túnel?
Vejo. Lamentavelmente criou-se nos últimos sete anos algum desencanto, alguma quebra de confiança dos empresários de um modo geral. E essa quebra tem a ver com todo este conjunto de factores que referi e todas as barreiras burocráticas que enfrentam nos seus investimentos. Por isso, ser empresário em Portugal, hoje, é ser mal visto. «Diabolizaram-se» os empresários, são vistos como «facínoras» que só compram bons carros, boas casas, e pagam baixos salários e fogem ao fisco.
Temos efectivamente algumas desigualdades sociais que devemos ultrapassar, porque o combate ao desemprego faz-se pela (iniciativa) privada e não pela pública. O Estado não vai ser empregador, antes pelo contrário: a reforma do Estado vai levar a algum desemprego. São as entidades privadas que vão criar postos de trabalho e por isso, temos que ter incentivos, estímulos. Não é darem-nos dinheiro, porque já não há dinheiro a fundo perdido e ainda bem que não, porque isso criou alguns vícios que hoje todos lamentamos. Mas que nos limpem o caminho os «pedregulhos» que esta estrada do desenvolvimento económico ainda tem: desburocratizando, licenciando mais facilmente, etc. Para que o Estado deixe de ser o grande patrão que é. Hoje, 39 anos depois do 25 de Abril, a iniciativa privada deveria estar mais liberta das pesadas «mochilas» que o Estado tem às costas, como a dívida pública e a dívida externa que felizmente conseguimos melhorar. O certo é que as pesadas «mochilas» do Estado não podem pesar sobre a iniciativa privada. Dêem-nos o terreno para crescermos e não irmos tropeçando constantemente.
Ana Grácio Pinto
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