A pandemia impediu o avanço da nova fase de intervenção no Teatro Romano de Lisboa, que levaria, por exemplo, à substituição do tapume com cobertura de zinco que há 20 anos ocupa boa parte da Rua da Saudade.
O projeto incluía, conforme explicou à Lusa a coordenadora do polo do Teatro Romano do Museu de Lisboa, Lídia Fernandes, um novo edifício sobre esse sítio arqueológico, com 700 metros quadrados, onde está uma parte da zona central e da base das bancadas do teatro, do século I, num projeto de arquitetura do ateliê de Ricardo Bak Gordon, “que foi pago”.
Estavam também previstas uma intervenção de requalificação na via pública da zona sob a qual está o Teatro Romano (que abarca, além da Rua da Saudade, a parte norte da Rua de São Mamede), a construção de um auditório e de novos espaços para o museu (em lotes municipais que na década de 1960 foram comprados para permitir a escavação e expansão do projeto) ou “a musealização de outras estruturas arqueológicas já intervencionadas e que não estão à vista”, segundo Lídia Fernandes.
Em 2020, deveriam ter avançado trabalhos de engenharia para o começo da concretização deste projeto, aprovado pela EGEAC (empresa municipal que gere espaços culturais), pela Câmara Municipal de Lisboa (CML), pela Junta de Freguesia de Santa Maria Maior e pela Direção-Geral do Património Cultura (DGPC), mas “veio a pandemia e tudo parou” e, depois, “o dinheiro foi canalizado para a cultura”, nas palavras da coordenadora.
“Agora estávamos à espera que tudo isto passasse para retomar o calendário das obras, mas entretanto mudou o executivo [da câmara] e temos de apresentar o projeto [ao novo executivo]”, acrescentou, dizendo que ainda não houve essa oportunidade.
Os primeiros vestígios do Teatro Romano de Lisboa, na encosta do Castelo de São Jorge, virado para o Tejo, foram descobertos em 1798, na sequência dos trabalhos de reconstrução da cidade depois do terramoto de 1755.
Ficaram alguns registos, mas os donos dos terrenos voltaram a construir sobre as ruínas do teatro e só na década de 1960 se voltou a falar do monumento, quando em 1964 um professor da Universidade de Lisboa, Fernando de Almeida, entrou num rés-do-chão em obras da Rua de São Mamede e se deparou com colunas romanas a servir de suporte a estruturas do prédio.
Seguiram-se, até 1971, a compra e a expropriação, pela CML, de sete edifícios na zona, com vista à demolição dos prédios para permitir a escavação. Nas décadas seguintes, avançaram alguns destes trabalhos, de forma intermitente, que puseram a descoberto aquilo que se estima ser pelo menos cerca de um terço do total do teatro romano.
Nem todos os edifícios comprados pela câmara foram demolidos e, ao longo dos anos, o projeto do teatro, embora centrado num monumento considerado único em Portugal, pela sua conservação, data de construção e localização, transformou-se e cresceu para um projeto que pretende preservar e mostrar toda a história desta zona de Lisboa.
Prova disso é o espaço que corresponde hoje ao museu propriamente dito, com entrada pela Rua de São Mamede, onde funciona a administração e a receção do Museu de Lisboa – Teatro Romano e onde estão instaladas as exposições ou onde se desenrolam diversas atividades.
São dois edifícios de épocas diferentes e sob os quais estão musealizadas e abertas ao público áreas já escavadas e intervencionadas, que destaparam importantes estruturas do teatro, mas também edifícios dos séculos que se seguiram e estruturas anteriores, permitindo a visualização direta da sobreposição de camadas da história de Lisboa.
A área de exposições do museu, por exemplo, foi instalada numa antiga fábrica de malas, que ali funcionou até ao século XX.
Com a ajuda da “engenharia de estruturas”, que acompanha os trabalhos arqueológicos, há hoje, assim, “o museu, que vai até 10 metros de profundidade, mas que mantém o património do século XIX, século XX à vista e que está bem conservado”, reforçou Lídia Fernandes.
Em paralelo, o museu tem feito registos das memórias dos residentes mais idosos de uma zona da cidade que sofreu transformações profundas a nível social nas últimas décadas, como acontece, por exemplo, com o impacto do turismo.
Para Lídia Fernandes, “nada é para apagar, tudo é para conservar quando tudo é digno de memória”.