Especialista defende regulação dos mercados, controlo de preços e apoio às famílias

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 O professor e especialista em políticas sociais Carlos Farinha Rodrigues receia que a crise energética seja a ponta do icebergue de outros problemas e defende a regulação dos mercados, o controlo dos preços, mas também o apoio às famílias.

Em declarações à agência Lusa, o professor do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG), da Universidade de Lisboa, apontou que a crise energética e o atual aumento do preço dos combustíveis “pode ser a ponta de um icebergue de vários problemas”, nomeadamente a dependência energética da Europa, não só ao nível dos preços do barril de petróleo, mas também do gás natural.

Perante a situação atual, Carlos Farinha Rodrigues entende que se deveria estar “a pensar muito bem” no tipo de resposta a dar e defende desde logo que a União Europeia assuma uma ação conjunta.

“Porque além das consequências, que a mim me preocupam muito, sobre as populações mais pobres, este aumento de preços pode por em causa grande parte da recuperação económica que é desejável e isso exigia algumas atitudes ao nível da própria União Europeia”, defendeu, apontando que até agora só foram feitas algumas sugestões pontuais, em forma de intenções, sem nada de concreto.

Em segundo lugar, o professor de economia defende uma intervenção na própria formação dos preços, nomeadamente dos combustíveis, salientando que, apesar de a carga fiscal ser uma componente muito significativa, nos últimos anos tem havido também “alguma desregulação do mercado de combustíveis”.

Lembrou, a propósito, que quando o preço do barril de petróleo “desceu fortemente”, isso não se repercutiu “a sério” no preço de venda aos consumidores, enquanto “agora que está a subir já está a repercutir”.

“Eu claramente acho que é necessário, em Portugal, e provavelmente também a nível europeu, formas de regulamentação do mercado de combustíveis que sejam mais eficazes”, defendeu.

Sobre essa questão frisou também que é preciso ver com cuidado uma redução da carga fiscal porque apesar de este ser um argumento verdadeiro, os recentes aumentos dos combustíveis não são resultados do aumento da carga fiscal, lembrando que durante o período da ‘troika’ houve um “aumento muito expressivo” dos impostos sobre os combustíveis.

Afirmou mesmo ter algum receio que uma descida de impostos acabasse por reforçar mais a margem de lucro dos comerciantes e dos distribuidores em vez de se traduzir numa redução efetiva do preço ao consumidor.

Alertou, por outro lado, para o que, em consequência, pode ser outra grande crise, e que tem a ver com o facto de a redução do preço dos combustíveis incentivar a que mais pessoas usem o carro, quando o que se pretende é o oposto.

“Não podemos dar sinais contraditórios no sentido em que as alterações energéticas que temos de introduzir não são compatíveis com sinais de algum facilitismo em termos de estimular o uso do automóvel e o consumo deste tipo de combustíveis”, salientou, sublinhando que Portugal “não é nem de perto nem de longe” o país da Europa com os combustíveis mais caros, apesar de também não ser o país com maior poder de compra.

Farinha Rodrigues defendeu também que se esta crise energética se prolongar terão de ser consideradas medidas de proteção da população mais vulnerável, apontando que estes aumentos ainda não estão a ter impacto nas contas de eletricidade, mas a continuarem serão “um risco claro”.

“Durante o período mais grave da pandemia, por exemplo, admitimos que as famílias não fossem penalizadas e que não pagassem a conta da eletricidade, e, portanto, isso será uma possibilidade, outra será haver suporte financeiro, ou seja, transferências monetárias para as famílias mais vulneráveis para que este aumento dos custos da energia, se se verificar, não seja tão penoso”, defendeu.

Farinha Rodrigues sublinhou que o impacto desta crise energética “vai depender muito de quanto tempo durar”, apontando que este aumento do preço dos combustíveis resulta essencialmente do preço do crude nos mercados internacionais, como resposta ao aumento da procura nos países mais desenvolvidos em fase pós-pandemia.

Sobre a pobreza, o especialista disse que o impacto irá depender muito da duração no tempo e que haverá efeitos diretos e indiretos.

“O problema é que se esta situação de mantiver, este aumento de preços vai-se transmitir a outros preços e aí claramente nós podemos ter consequências muito graves em termos das condições de vida das famílias”, alertou.

“Basta pensarmos que até agora não tivemos um aumento do preço dos transportes, mas se isso acontece, e se os transportes públicos tiverem um aumento significativo de preço, isso é uma quebra de poder de compra para as famílias mais vulneráveis terrível”, acrescentou.

Por outro lado, lembrou que todos os estudos conhecidos mostram que as famílias portuguesas “são as mais vulneráveis em termos de manter a casa devidamente aquecida”.

Farinha Rodrigues admitiu que não é possível antecipar como é que os mercados se vão comportar, mas destacou que a realidade será a de haver vários países em processo de recuperação económica acentuada e que isso vai ser um incentivo sobre a procura de bens energéticos.

“Temos de garantir que isso não é um travão ao processo de recuperação e simultaneamente não é algo que comprometa o caminho desejado em termos de alterações energéticas e que isso não se torne um fator de agravamento para as famílias mais vulneráveis”, sublinhou.

Relativamente a Portugal, defendeu que o país pode tomar medidas sem estar exclusivamente à espera das medidas europeias, admitindo, no entanto, que com o enquadramento europeu essas medidas seriam mais eficazes.

Salientou que neste momento o país tem várias fontes de financiamento que podem ser usadas na transição energética, defendendo um processo mais amigo do ambiente e medidas que protejam os consumidores mais pobres.

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