O Governo avançou com a possibilidade de os trabalhadores com filhos até 6 anos recusarem adaptabilidade ou bancos de horas e dos com filhos até 8 anos poderem optar pelo teletrabalho, mas a CGTP considera a atual lei mais protetora.
O alargamento do acesso aos regimes de trabalho flexíveis para que os pais cuidem dos filhos é um objetivo do executivo com pelo menos dois anos, previsto no Programa para a Conciliação da Vida Profissional, Pessoal e Familiar, e determinado numa diretiva comunitária de 2019, que ganhou atualidade esta semana.
Na quarta-feira, na Comissão Permanente de Concertação Social, a ministra do Trabalho apresentou a Agenda para o Trabalho Digno e horas depois enviou aos parceiros sociais um conjunto de medidas para melhorar a qualidade do emprego, combater a precariedade laboral e melhorar a conciliação entre o trabalho e a vida pessoal e familiar.
No âmbito da promoção da igualdade entre homens e mulheres, o Governo propôs aperfeiçoar o regime de licenças de parentalidade e, para promover a conciliação entre o trabalho e a família, propôs a melhoria da gestão dos tempos de trabalho.
Nesta área, o documento do Governo prevê “fazer depender de autorização expressa dos trabalhadores a aplicação de regimes de adaptabilidade de horários de trabalho e bancos de horas a trabalhadores com filhos menores até 6 anos ou filhos com deficiência ou doença crónica, nomeadamente quando se demonstre impossibilidade de outro progenitor assegurar o acompanhamento da criança, podendo esta possibilidade ser ajustada às realidades setoriais e empresariais apenas através de negociação coletiva”.
A proposta a discutir com os parceiros prevê ainda “alargar aos trabalhadores e trabalhadoras com filhos menores de 8 anos de idade ou filhos com deficiência ou doença crónica o direito a exercer a atividade em regime de teletrabalho, condicionado a partilha entre homens e mulheres e quando compatível com as funções”.
Atualmente a lei prevê esta possibilidade para os trabalhadores com filhos até 3 anos e a recusa à adaptabilidade ou bancos de horas para as grávidas, puérperas ou lactantes.
Os parceiros sociais têm até 06 de agosto para enviar o seu parecer e ainda não tiveram tempo para analisar em detalhe o documento do Governo, mas Fátima Messias, da comissão executiva da CGTP, considerou que estas duas medidas “são enganadoras”, pois “a legislação atual favorece mais a conciliação entre o trabalho e a família, protegendo os trabalhadores com filhos até aos 12 anos”.
“As medidas relativas à organização do tempo de trabalho são sempre do interesse das empresas, por isso dizer que os trabalhadores podem não dar acordo à adaptabilidade ou aos bancos de horas é uma falsa questão, porque sabemos o difícil que é enfrentar a pressão patronal. Por isso, esta é uma medida enganadora e perigosa”, disse à agência Lusa.
Quanto à possibilidade de optar pelo teletrabalho quando se tem filhos menores de 8 anos, a sindicalista disse não perceber qual é a intenção do Governo, dado que nesta época de pandemia “ficou mais do que provado que o teletrabalho não é compatível com o cuidar de crianças pequenas”.
Para a dirigente da CGTP, “a atual lei está bem feita e os trabalhadores estão muito mais defendidos, porque podem pedir o horário flexível até os filhos completarem 12 anos”.
Fátima Messias, que coordena a comissão da igualdade da CGTP e integrou o grupo de trabalho criado na Concertação Social para analisar as questões relacionadas com a conciliação entre o trabalho e a família, defendeu que “a melhor forma de conciliação é a redução do horário de trabalho”.
“A CGTP reivindica a redução do horário de trabalho semanal para as 35 horas e há livros que mostram que os trabalhadores produzem mais com horários mais reduzidos, sofrem menos ‘stress’ e têm maior possibilidade de conciliar a vida profissional com a familiar”, disse.
O grupo de trabalho tripartido sobre a conciliação, que funcionou entre setembro de 2019 e o início de fevereiro deste ano, debateu um conjunto de medidas promotoras da conciliação, propostas pelo Governo, nomeadamente a possibilidade de fazer depender de autorização expressa dos trabalhadores a aplicação de regimes de adaptabilidade de horários de trabalho e bancos de horas a trabalhadores com filhos menores até 12 anos ou com deficiência ou doença crónica.
O “aumento da margem de acesso à gestão flexível dos horários, como horários reduzidos, concentrados, ou teletrabalho, e dispensas de trabalho por parte de trabalhadores” foram também discutidos nessa sede.
Em julho de 2019 foi aprovada a diretiva europeia 2019/1158, que terá de ser transposta para a legislação nacional até agosto de 2022, e que determina que os Estados-membros “devem tomar as medidas necessárias para garantir que os trabalhadores, com filhos até uma determinada idade, de pelo menos 8 anos, e os cuidadores tenham o direito de solicitar regimes de trabalho flexíveis para poderem ocupar-se da prestação de cuidados”.
“A fim de incentivar os trabalhadores que são progenitores e cuidadores a permanecerem no ativo, é importante que possam adaptar os horários de trabalho às suas necessidades e preferências pessoais. Para o efeito, e com ênfase nas necessidades dos trabalhadores, eles deverão ter o direito de solicitar regimes de trabalho flexíveis, para adaptarem os seus ritmos de trabalho, nomeadamente, se possível, pela utilização de regimes de teletrabalho, horários de trabalho flexíveis ou uma redução das horas de trabalho para poderem prestar cuidados”, diz a diretiva.