O médio do Sporting da Covilhã, da II Liga de futebol, Filipe Cardoso é formado em Medicina, mas afirma estar totalmente focado no futebol e pretende no futuro voltar a vestir a bata, quando deixar de jogar.
O ‘trinco’ de 26 anos, de Canidelo, Gaia, cresceu com a bola nos pés no Coimbrões, conta com uma passagem pelo Boavista, onde se cruzou com Bruno Fernandes, e sempre teve uma prioridade: conseguir viver do futebol e chegar aos campeonatos profissionais.
“O meu único sonho era ser jogador de futebol. Esse sempre foi o plano A”, contou o médio defensivo, à agência Lusa.
A mãe, educadora de infância, e o pai, bancário, incutiram-lhe a importância dos estudos e nunca teve de levar qualquer “puxão de orelhas”, porque Filipe Cardoso desde cedo percebeu que nem todos conseguem chegar aos principais palcos desportivos e, mesmo atingindo o patamar profissional, há imponderáveis, lesões, a carreira acaba cedo e deve existir uma rede para evitar quedas desamparadas e o abismo de quem não se precaveu com uma solução alternativa.
“Um jogador de futebol está sujeito a um futuro muito incerto. É importante estar preparado para quando o futebol acabar”, acentuou, em declarações à agência Lusa.
A possibilidade de estudar Medicina surgiu no ensino secundário, com a perspetiva de poder aliar a profissão ao desporto, seja num clube ou numa clínica, quando o relvado deixar de ser o seu espaço de trabalho.
No Coimbrões pediam-lhe conselhos, avaliou sobrolhos abertos ou o resultado de algum choque, “sempre situações fáceis”.
Habituou-se a que no balneário, por vezes, lhe chamem, na brincadeira, “senhor doutor”, embora garanta que os colegas apenas em conversas casuais o questionem sobre assuntos médicos. Quando sabe, responde. Se não estiver ao seu alcance, frisou, encaminha. O que quer, vincou, é ser visto como jogador.
“Eu quero ser falado por ser jogador de futebol, é essa a minha profissão neste momento e, felizmente, as coisas estão a correr bem”, acrescentou.
Com dias muito preenchidos, muita “organização e espírito de sacrifício”, foi conciliando os estudos com os treinos e jogos no Campeonato de Portugal. A tão ambicionada oportunidade, o convite do Sporting da Covilhã, com quem assinou o primeiro contrato profissional, surgiu “na altura certa”, em 2019, aos 24 anos.
“Eu acabei o curso em junho e, em julho, estava no Covilhã a treinar”, recordou. Se não tivesse acontecido, teria começado o ano comum, a trabalhar num hospital e a dar primazia à Medicina. Aconteceu o contrário. Arrumou por enquanto o estetoscópio e focou-se no futebol, salientou o jogador, em final de contrato e com o futuro profissional em aberto.
Se por um lado se confrontou com um nível de exigência maior, tal como uma maior intensidade de treino e de trabalho, estranhou o tempo livre, quase todo passado no hotel e no ginásio.
A covid-19, que em janeiro lhe provocou cinco dias de dores musculares nas costas e coxas, que interrompeu no ano passado o campeonato e obrigou ao isolamento físico, teve um aspeto virtuoso: permitiu-lhe fazer uma pós-graduação em Medicina Desportiva, remotamente.
Com a pandemia, ainda não calhou visitar a Faculdade de Ciências da Saúde na Covilhã, nem o hospital universitário local, mas o interesse pela área está sempre presente e as conversas com o fisioterapeuta serrano são uma constante, motivadas pela curiosidade de quem quer no futuro exercer medicina física e de reabilitação.
“Trocamos impressões sobre coisas que ambos aprendemos, pergunto porque faz isto ou aquilo, quanto tempo certa lesão leva a curar. Aprendo muito com ele nesta parte prática. Interesso-me por esses processos, que no futuro vão ser importantes”, enfatizou o jogador.
Filipe Cardoso, com 30 jogos cumpridos e três golos marcados esta temporada, é uma versão que quer ver melhorada e reconhecida, com a certeza de que estas páginas serão viradas quando as leis da vida e a soberania do tempo ditarem a sua sentença e chegar a hora de o médio defensivo, bom a construir jogo, a subir, a aparecer em zona de remate e no jogo aéreo, pôr em prática o plano B.
Agora, quer continuar a melhorar a recuperação de bolas. No futuro, pretende recuperar a condição física de quem o consultar, quando trocar o esférico pelo estetoscópio.