A poesia quinhentista de Francisco Rodrigues Lobo é revelada pela música de Rita Redshoes no domingo, numa atuação no Castelo de Leiria que marca o encerramento do festival Ronda Leiria Poetry Festival.
Quatro séculos separam a obra de Rodrigues Lobo (1574-1621), conhecido como “o poeta do Lis”, rio de Leiria – de onde era natural – das composições de Rita Redshoes, que aceitou o desafio da organização do festival de poesia Ronda para musicar textos do poeta.
“Não era conhecedora da obra, embora já tivesse ouvido falar dele enquanto contemporâneo de Camões, e fiquei curiosa”, conta à agência Lusa.
A cantora e compositora partiu para a tarefa com “algum receio” de que “fosse difícil encaixar” os poemas na música, mas após a leitura, a perspetiva alterou-se.
“Gostei imenso e achei bastante musical”.
Rita Redshoes escolheu três poemas de Francisco Rodrigues Lobo e aventurou-se também numa versão de “Minuciosa formiga”, de Alexandre O’Neill, texto de que se lembrou a partir de um dos escritos de Rodrigues Lobo.
“Nem me lembrei que já tinha sido musicado e cantado pela Amália e depois pela Adriana Calcanhotto. Agora ficou com mais uma versão”.
Para as palavras de O’Neill, criou “um blues com ritmo swing”, enquanto a poesia ingénua e sensível de Rodrigues Lobo é explorada através do omnichord, “que tem um som um bocadinho etéreo e infantil”.
“Há uma candura, uma sabedoria intrínseca, uma crítica e sentido de observação muito apurado em relação à sociedade, além da ligação à natureza e aos animais. Ele tem uma ligação muito terrestre, mas sempre com algo ligado às estrelas e ao firmamento”, descreve, sobre a obra do poeta que viveu nos séculos XVI e XVII.
De Rodrigues Lobo escolheu “Mil anos há que busco a minha estrela”, “Écloga I” e “Que amor sigo?”.
“Foi um prazer musicar os poemas. Fiquei muito contente, porque pensei que ia ser muito mais doloroso e não foi. Deu algum trabalho, de experimentação e procura, mas no qual [exercício] me encontrei também e consegui transportar a minha identidade musical, harmónica e melódica, para as palavras destes poetas”, diz Rita Redshoes, que em Leiria se estreia num festival de poesia, no Castelo de Leiria, “com uma vista maravilhosa sobre a cidade”.
A participação no Ronda surgiu como um oásis no atual momento difícil para a artista, devido à pandemia: na gaveta tem um novo disco pronto há um ano, que “está à espera de melhores dias” para sair.
Durante o confinamento, “para manter a sanidade mental e financeira”, reinventou-se e criou um ‘podcast’ sobre sonhos, para a Rádio Comercial, e lançou também um projeto de atividades para crianças, na Rádio Zig Zag.
“Fui criando coisas para me entreter e ter objetivos. É muito frustrante não poder trabalhar”, assume.
Mas a partir do desafio lançado pelo festival Ronda pode surgir, entretanto, um novo projeto.
“Tinha a ideia de um dia fazer um disco ou um ciclo de canções sobre bichos. Uma destas canções de Francisco Rodrigues Lobo será a primeira pedrinha desse trabalho”.
Ronda Leiria Poetry Festival decorre até domingo, envolvendo na programação mais de 200 convidados de 40 países, num total de 65 horas de programação ‘online’.
Fotografia facebook Rita Redshoes