Há 153 anos faleceu o abade de Baçal o sacerdote mais notável de Bragança

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Francisco Manuel Alves nasceu em Baçal a 9 de abril de 1865, há 153 anos, e ali faleceu a 13 de novembro de 1947. Também conhecido por Abade de Baçal, é considerado o sacerdote mais notável de Bragança e um dos mais destacados a nível nacional.

«A educação rural ministrada, idêntica à dos filhos dos camponeses similares da época em aldeia de gente pacata e simples, moldou-lhe o carácter e os valores: sempre os princípios e comportamentos da ruralidade trasmontana o impregnarão por inteiro», escreve o antigo diretor do Museu Abade de Baçal, no tomo I das “Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança”, reeditado em 2000.

Entra na escola aos 10 anos e em 1889, com 24 anos, termina os estudos eclesiásticos no Seminário de S. José, em Bragança. Pároco em Mairos (Chaves), recebeu em 1895 a mesma missão para a sua terra natal.

Em 1907 inicia as «excursões arqueológicas». A sua obra em 11 volumes, “Memórias arqueológico-históricas”, é um repertório riquíssimo do distrito de Bragança que abrange um enorme leque temático e um longo período cronológico, desde os tempos pré-históricos até ao início do século XX.

É eleito vereador da Câmara Municipal brigantina a 1 de novembro de 1908, cargo que ocupa até 1910. Colabora em revistas das especialidades a que se dedicou, como a arqueologia, etnografia e história, e na imprensa regional.

No ano de 1911 é nomeado sócio correspondente da Associação dos Arqueólogos Portugueses, e dois anos mais tarde é eleito na mesma categoria da Sociedade Portuguesa de Estudos Históricos.

No dia 8 de maio de 1915 é nomeado membro da Junta Geral do Distrito de Bragança, e no ano seguinte é eleito sócio da Academia das Ciências de Lisboa. Em 1917 é nomeado presidente do Instituto Científico-Literário de Trás-os-Montes.

É nomeado sócio fundador honorário do Instituto Etnológico da Beira (1921), eleito sócio correspondente do Instituto Histórico do Minho (1921) e sócio correspondente da Academia das Ciências de Lisboa (1923). Em 1935 é nomeado sócio de honra da Associação dos Arqueólogos Portugueses, e a 17 de maio desse ano é galardoado com o título de grande oficial da Ordem Militar de Sant’iago da Espada. Em 1938 é nomeado académico supranumerário da Academia Portuguesa da História.

Interessou-se também pela melhoria das condições agrícolas da região. Fez a organização e enriquecimento do Museu do Abade de Baçal, bem como do Arquivo Distrital, instituições de que foi diretor até 1935, ano em que se jubilou. A ele se deve a reposição do cruzeiro da Praça da Sé, e também o restauro da “Domus Municipalis”.

A sua jubilação, a 9 de abril, «é um acontecimento nacional em que as mais altas figuras da cultura nacional o vêm homenagear, as universidades se fazem representar, os dirigentes políticos distritais e centrais não deixam de discursar, a par da presença de amigos, familiares e povo anónimo. É nesta altura que o nomeiam patrono do Museu e o seu busto é descerrado no jardim António José de Almeida», assinala João Manuel Neto Jacob.

O mesmo investigador refere que é a partir daquela data que a «imagem de homem-bom, notável estudioso e escritor que deu visibilidade e entendimento à história distrital se consagra definitivamente, se agiganta e se institucionaliza, onde todos os trasmontanos se revêem no temperamento, nos comportamentos, no saber, no modo de vida. É o pai da nação trasmontana que nasce».

Em Baçal recebe figuras como Leite de Vasconcelos, Teixeira Lopes, Abel Salazar, Paulo Quintela, Jorge Dias e Egas Moniz, nomes que apontava epigraficamente, a par da data das visitas, na parede da varanda romana.

«É de uma fé granítica. Além de transmontano é um cristão convicto e foi um sacerdote que exerceu o seu ministério e conseguiu conciliá-lo com as várias funções que foi assumindo na sociedade, inclusive a de diretor do museu regional, na altura, de vereador municipal, mas salvaguardando sempre a identidade cristã», realça o atual bispo de Bragança-Miranda.

D. José Cordeiro, em declarações ao jornal “Público” de 13 de abril de 2015, salienta também «a sua naturalidade, a sua humildade e o estar sempre ligado à terra, às raízes, sem nunca perder a sua ligação à família, à Igreja, ao Nordeste Transmontano».

O Abade de Baçal distinguiu-se igualmente na defesa do arquivo diocesano, um dos mais completos do país ainda em posse da Igreja: «Também me causava alguma interrogação como é que a diocese perdeu a Casa Episcopal, que hoje é o museu dele, mas não perdeu o arquivo. Foi por causa dele».

«Os bispos que estiveram logo a seguir à implantação da República pediram ao Abade de Baçal que, a par da investigação que fazia, trouxesse das paróquias o espólio mais importante. E é graças a ele que temos um arquivo diocesano incontornável neste país, porque os outros estão quase todos na posse do Estado», recorda D. José Cordeiro.

Na mesma edição do “Público”, o prelado considera que «a figura do Abade ajudou a conciliar muitas atitudes, muitas pessoas, muitas circunstâncias que ocorreram no tempo dele”, numa altura de grande atribulação na diocese.

«Há muita gente que pensa que o Abade dedicou-se àquilo para que era pago pelo Estado mas não ligou ao ministério e não tinha ligação com a Igreja. Não é verdade. Nunca perdeu a lealdade com o bispo, a fidelidade à Igreja, a Cristo e ao seu ministério», frisa.

Antes das “Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança” «o que havia era tudo muito esparso», acentua, por seu lado, Luís Carlos Amaral, professor da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, que acrescenta: «Teve a preocupação de compor um todo, de juntar as várias peças e tentar dar uma explicação global a esta região. Antes dele não há nada que se compare, com esta envergadura, para nenhuma região de Portugal».

Luís Carlos Amaral considera que há dois traços fundamentais no Abade de Baçal: «Em primeiro lugar, é a sua atitude como ser humano. Estamos perante alguém muito grande, que teve uma atitude humana no seu lugar e no seu tempo, com os seus concidadãos, verdadeiramente notável. E manifestou-a enquanto etnólogo, enquanto etnógrafo, enquanto historiador, enquanto sacerdote também».

Para a atual diretora do Museu Abade de Baçal, Ana Afonso, o sacerdote «é uma figura e um ícone da região, acarinhada por todos os transmontanos»: «Foi um construtor da nossa identidade».

A 13 e 14 de novembro, o auditório Paulo Quintela, em Bragança, recebe o congresso “Vida, obra e pensamento de Francisco Manuel Alves, Abade de Baçal”, que vai ser aberto por D. José Cordeiro.

“A etnografia transmontana na obra de Francisco Manuel Alves” (Teresa Soeiro), “O Abade de Baçal e a História Contemporânea” (Gaspar Martins Pereira), “O Abade de Baçal e a cultura regional” (Adérito Branco), “Sem ‘ridículos nem puerilidades’, o Abade de Baçal e a Igreja nos alvores da República” (Vítor Teixeira), “Abade de Baçal testemunha de uma época de rutura” (Arnaldo Pinho) e “A ideia de Portugal no pensamento do Abade de Baçal” (José Eduardo Franco) constituem alguns dos temas em análise no encontro.

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