A área ardida aumentou este ano cerca de 35% em relação a 2019, mas 2020 apresenta-se entre 01 de janeiro e 31 de agosto com o valor mais reduzido do número de incêndios florestais da última década.
A área ardida aumentou este ano cerca de 35% em relação a 2019, mas 2020 apresenta-se até à data com o valor mais reduzido do número de incêndios florestais da última década, segundo dados provisórios do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) entretanto divulgados.
Os dados provisórios indicam que, entre 01 de janeiro e 31 de agosto, deflagraram 7.207 incêndios rurais, que resultaram em 38.647 hectares (ha) de área ardida, entre povoamentos (17.176 ha), matos (15.971 ha) e agricultura (5.500 ha).
“Comparando os valores do ano de 2020 com o histórico dos 10 anos anteriores, assinala-se que se registaram menos 48% de incêndios rurais e menos 57% de área ardida”, destaca o ICNF, sublinhando que o ano de 2020 apresenta, até ao dia 31 de agosto, o valor mais baixo em número de incêndios e o quarto mais reduzido de área ardida desde 2010.
Em comparação com o mesmo período do ano passado, o número de incêndios baixou ligeiramente, registando até 31 de agosto menos 592 fogos, enquanto a área ardida aumentou 35,5%.
Segundo os dados do ICNF, este ano os fogos rurais consumiram 38.647 hectares, mais 10.131 do que no mesmo período de 2019, quando as chamas atingiram 28.516 hectares.
O ICNF frisa também que em 2020 os incêndios com área ardida inferior a um hectare são os mais frequentes, representando 87% do total, tendo ainda ocorrido sete fogos com uma área ardida superior ou igual a mil hectares.
Já aqueles que atingiram uma área ardida total igual ou superior a 100 hectares, considerados “grandes incêndios”, foram 45 até 31 de agosto, que resultaram em 31.678 hectares de área ardida, cerca de 82% do total.
Os dados provisórios mostram também que, até à data, o mês de julho é aquele que apresenta maior número de incêndios rurais, com um total de 3.143 incêndios, o que corresponde a 44% do número total registado, seguido de agosto, com 2.069 fogos.
No que respeita à área ardida, até à data, julho é também o mês que apresenta maior área ardida, com um total de 20.771 hectares, o que corresponde a 54% do total de área ardida registado no ano.
Estes dados não refletem, no entanto os incêndios do mês de setembro, designadamente o incêndio que deflagrou em Proença-a-Nova e que alastrou aos concelhos de Oleiros e Castelo Branco. Neste, só no concelho de Oleiros, a Câmara Municipal estima que terão ardido cerca de 20 mil hectares de floresta.
Também não está contabilizado o incêndio que lavrou durante vários dias em Ponte de Lima cujas chamas “consumiram mais de 400 hectares de floresta”, sendo considerado “o maior incêndio do ano no distrito de Viana do Castelo”. Nem o incêndio que deflagrou na freguesia de Abedim, concelho de Monção.
Ministro diz que o desafio está na “transformação da floresta”
O ministro da Administração Interna afirmou que o grande desafio relacionado com os incêndios está no trabalho de transformação e gestão da floresta.
“O trabalho de transformação da floresta, a gestão florestal, a conclusão do cadastro e a aposta na alteração da paisagem – é aqui que está o grande desafio que não é no verão que é desenvolvido, mas que convém falar agora para não ser esquecido ao longo do ano”, afirmou Eduardo Cabrita.
O ministro da Administração Interna (MAI) falava aos jornalistas em Sobreira Formosa, Proença-a-Nova, depois de o incêndio que começou neste concelho e que se alastrou a Oleiros e Castelo Branco.
Eduardo Cabrita apontou para os exemplos da Austrália e do “drama” na costa ocidental dos Estados Unidos para mostrar como é fundamental “ações de prevenção” dos incêndios.
“Conseguimos reduzir o número de ocorrências. É o terceiro ano em que o número de ocorrências é cerca de 50% inferior à média dos últimos dez anos. Este ano, as condições meteorológicas determinaram que ocorrências de dimensão e de risco potencialmente muito significativo acontecessem”, constatou.
O ministro recordou que o incêndio que deflagrou em Proença-a-Nova foi o 11.º fogo deste ano com mais de mil hectares ardidos, tendo sido na região do Pinhal Interior que se registaram os dois maiores incêndios do ano, até ao momento.
“Há menos ocorrências, mas com um nível de dificuldade muito significativo”, realçou.
Apesar disso, Eduardo Cabrita salientou que o trabalho preventivo já começa a dar alguns frutos, sendo notório, em determinados casos, que o incêndio contornou povoações que tinham zonas de proteção definidas.
“2017 fez toda a diferença na sociedade portuguesa. O trabalho tem vindo a ser feito intensamente. A criação de redes [no dispositivo de combate] e a interligação das entidades produzem efeitos mais depressa. As alterações nas características económicas destas regiões e na floresta exigem um esforço que leva mais anos a concretizar e que só produzem efeitos a uma maior distância”, disse.
Ainda Pedrógão Grande: Autarca de freguesia diz que novo incêndio “será pior” do que em 2017
O presidente da junta de freguesia de Vila Facaia, em Pedrógão Grande, avisou que se houver um novo incêndio naquele território do interior Centro “será pior” do que em 2017, devido ao material combustível existente.
Numa audição na comissão eventual de inquérito parlamentar à atuação do Estado na atribuição de apoios na sequência dos incêndios de 2017 na zona do Pinhal Interior, na Assembleia da República, em resposta a uma pergunta da deputada Fabíola Cardoso (BE), José Henriques frisou que “todos os pinheiros que caíram” no incêndio ocorrido há três anos “estão lá todos no chão” e se voltar a haver um incêndio são “pólvora”.
“Até à data não se fez foi nada, se houver um incêndio vai ser pior do que o outro”, argumentou.
Também em resposta a uma questão relacionada com a parte florestal, formulada por Paulo Leitão (PSD), José Henriques reafirmou que as árvores “assim como caíram, lá ficaram”.
Por outro lado, lamentou que a “pequena” junta de freguesia a que preside não tenha meios para poder usar material de combate a incêndios que lhe foi oferecido e criticou a forma como estão a ser feitas as faixas de gestão de combustíveis junto às estradas.
“Foi-nos entregue um kit de incêndios [na sequência de uma candidatura da associação de vítimas do incêndio] e o que venho a constar é que foi um presente envenenado. Dão-nos o kit e não temos dinheiro para comprar a viatura para ele, está lá encostado, está lá, novo, no chão, não tenho carro para ele”, lamentou.
“E estão-se a fazer agora as faixas de contenção, mal feitas, a 10 metros da estrada e daqui a um mês ou dois está tudo igual. Bom serviço era fazer a faixa e andar uma máquina por detrás a arrancar as raízes”, enfatizou o presidente de junta.
O autarca deixou ainda críticas ao facto de a junta de freguesia a que preside ter sido “posta de lado” nos levantamentos de habitações danificadas ou dos prejuízos agrícolas provocados pelas chamas.
“Quando há uma catástrofe desta natureza e as juntas são colocadas de lado, isto é de lamentar”, frisou.
“Conhecemos os fregueses, porta a porta, era feito um levantamento caso a caso e conseguiríamos fazer um levantamento mais justo do que o que foi feito, é óbvio que iria correr muito melhor, eu conheço a freguesia de uma ponta à outra, sabemos onde é a casa das pessoas”, alegou.
“A junta não foi chamada para nada! Não fomos envolvidos em nenhum processo, ninguém nos dizia nada”, reforçou, insistindo que tal sucedeu nos levantamentos feitos por entidades oficiais, mas também nas redes de apoios social e de saúde à população criadas após o incêndio.
Em resposta a diversas questões dos deputados sobre os apoios à reconstrução de habitações ou reposição do potencial produtivo agrícola, José António Henriques assinalou, entre outros aspetos, o caso de casas devolutas “que nunca foram habitadas” e foram reconstruídas, mas também outras, “que ficaram sem telhado ou só com a fachada” que, nos dias de hoje, mais de três anos depois, continuam dentro de aldeias ou na paisagem, destruídas.
Um dos momentos mais tensos da audição ocorreu quando o presidente de junta foi questionado, pelo BE e pela deputada socialista Joana Bento, sobre os donativos em dinheiro que distribuiu à população de Vila Facaia.
José António Henriques explicou que a junta recebeu vários donativos “que iam chegando, ao longo de semanas e meses”, provenientes de particulares e empresas e que totalizaram cerca 15 mil euros. “Era dinheiro que não era nosso”, notou o autarca, explicando que a junta criou uma “conta solidária” e decidiu distribuir a verba a quem apresentasse faturas de gastos com obras, repartindo “200 euros por cada” residente na freguesia nessa situação.
“Foi uma ajuda simbólica, uma pequena ajuda a quem estava mais lesado e não tinha sido ressarcido”, argumentou.
A deputada Fabíola Cardoso questionou o “papel paralelo” da junta de freguesia na reconstrução das casas e indagou sobre se “estará no plano das juntas voltar a pedir ou a receber” donativos com essa finalidade.
“Acha que alguém dá um donativo após aquilo que se passou? [as alegadas irregularidades nos apoios à reconstrução]”, ripostou José Henriques.
A deputada do PS Joana Bento foi mais longe e perguntou “que obras se pagam com 200 euros a três meses de eleições autárquicas”, questionando um alegado propósito eleitoralista da distribuição de donativos.
“Duzentos euros foi simbólico, não podia dar mais, porque dando a uns tinha de dar a outros, o dinheiro não era nosso. Duzentos euros é para pagar uns sacos de cimento ou uma palete de blocos, há uma pessoa que comprou os blocos e o barracão está lá no chão, não tem dinheiro para fazer o resto”, exemplificou. “Há pessoas que ficaram sem nada. A gente não imagina o que é ficar sem nada e temos de ajudar, não estamos a viver numa cidade”, desabafou.
No final da sessão, o presidente da junta manifestou-se agastado com a “insinuação grave” da deputada do PS: “Os donativos foram distribuídos depois das eleições [de outubro de 2017]. Falhou-me [na audição] responder-lhe, mas o que ela disse é grave e tenho de lhe dizer isso”, frisou.
Na audição, José Henriques deixou várias críticas ao Governo, lembrando que “no início”, após o incêndio que matou 66 pessoas, fez mais de 250 feridos, destruiu 500 casas e queimou 53 mil hectares, “era só promessas”.
“Todos os dias eram ministros e secretários de Estado [em Pedrógão Grande]. Passaram três anos e está pior, está tudo abandonado, foi tudo embora de lá. A minha freguesia foi onde morreu mais gente, morreram 30 pessoas e nunca ninguém veio ter comigo a perguntar ‘precisa de alguma coisa’? Se não fosse o donativo das pessoas, dos portugueses, o que seria daquela gente”, questionou.