Ao fim de dois meses parados, por causa da covid-19, os músicos da Orquestra Gulbenkian voltaram esta semana aos ensaios, em pequenas formações, para a própria Fundação Calouste Gulbenkian testar protocolos, a pensar na próxima temporada de música.
“É tudo uma aprendizagem, é tudo inédito”, afirmou o diretor-adjunto da Gulbenkian Música, Miguel Sobral Cid junto ao grande auditório da fundação, onde duas pequenas formações de músicos da orquestra faziam os primeiros ensaios, depois de semanas de paragem forçada.
A atual temporada de música da Gulbenkian ficou em suspenso desde março, à semelhança de toda a atividade cultural no país, por causa da pandemia da covid-19, e afetou quase duas centenas de instrumentistas e cantores da Orquestra e Coro Gulbenkian.
A fundação remeteu para setembro o anúncio da próxima temporada e até lá planeia internamente testar procedimentos de segurança, circuitos de circulação e protocolos de atividade para que o grande auditório volte a acolher concertos com público.
“Estamos a tentar aos poucos incrementar os músicos em palco, mas o horizonte que nós temos, com muita prudência e cautela, e pensando nas recomendações hoje da possível evolução [da covid-19], estamos a pensar que nunca muito mais do que 50 elementos [da orquestra] em palco, de setembro a dezembro”, disse Miguel Sobral Cid.
Até lá, o regresso dos músicos ao trabalho é feito em pequenas formações para ensaios e gravações que serão transmitidas ao longo das próximas semanas, pela fundação, na sua página na Internet.
Nos ensaios, duas pequenas formações de câmara preparavam-se para gravar composições de Mendelssohn e Beethoven, com os músicos dispostos em meio círculo e praticamente a ocupar todo o palco do grande auditório, por causa das distâncias de segurança.
De acordo com as regras estabelecidas pelo Governo, para a reabertura das salas de espetáculos a 01 de junho, os músicos devem manter-se afastados “pelo menos dois metros sempre que possível”, e em relação às orquestras deve ser assegurada uma distância mínima de dois metros entre músicos de sopro e 1,5 metros entre os restantes.
No caso da fundação Calouste Gulbenkian, todos os trabalhadores, incluindo os músicos, têm de medir temperatura à entrada do edifício, desinfetar as mãos e utilizar obrigatoriamente máscara.
O violinista Francisco Lima Santos, primeiro concertino auxiliar da orquestra Gulbenkian, explicou que a profissão de músico exige tempo livre para aperfeiçoar, “mas dois meses sem palco é um exagero”, embora admita sentir-se “privilegiado” por não ter ficado sem rendimentos durante o período de confinamento.
Nos ensaios, reconheceu que a distância exigida dificulta o entrosamento entre músicos: “Em termos acústicos, a pessoa que está à minha frente está muito longe. Assim tão longe, é muito difícil”, disse.
Se ter a Orquestra Gulbenkian a atuar em plenitude será difícil nestas condições, para o Coro Gulbenkian é, para já, impossível.
“O coro é o maior problema, não podem cantar de máscara e exige uma proximidade muito grande dos elementos. Apesar de já ter havido muitas experiências com outros coros, ainda não se encontrou uma forma que permitisse ter o coro ativo”, disse Miguel Sobral Cid.
Da programação de verão, a fundação não anunciou ainda o que irá definir com os músicos da orquestra, nem confirmou a realização do festival Jazz em Agosto.
Segundo Miguel Sobral Cid, do ponto de vista técnico, as gravações de ensaios e atuações sem público que vão ser feitas e transmitidas ao longo das próximas semanas servirão também para “ensaiar capacidades” e experimentar cenários perante a pandemia.
Uma das hipóteses, ainda a avaliar, é a transmissão de concertos em ‘streaming’, de forma gratuita ou com bilhete, de concertos que virão a acontecer com público no grande auditório.
“Tudo indica que o auditório terá restrições em termos de público, não conseguimos ter 1.200 pessoas em todos os concertos. O que muito provavelmente vai obrigar-nos a outros tipos de expedientes em ‘streaming’. (…) Não sabemos qual vai ser a duração destas medidas, mas temos de estar preparados para tudo”, disse.