Dirigentes e conselheiros da diáspora portuguesa na África do Sul consideram que os portugueses na economia mais desenvolvida de África vão sentir-se “mais esquecidos” por Lisboa com o cancelamento das celebrações do 10 de Junho.
O Presidente da República de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, anunciou recentemente a anulação das comemorações do 10 de Junho, Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, que estavam previstas na Madeira e junto das comunidades portuguesas na África do Sul, devido à pandemia da covid-19.
“Foi indubitavelmente uma decisão acertada, lamentamos não poder receber o mais alto magistrado da Nação para presidir às comemorações de uma efeméride deveras importante [para as comunidades portuguesas]”, disse José Luís da Silva, conselheiro da diáspora madeirense na África do Sul.
Todavia, o representante da comunidade madeirense imigrante na África do Sul considerou que “estar com a comunidade nessa data é bom, mas seria muito melhor que estivesse sempre com esta diáspora mais vezes e de forma mais sentida”.
Para José Luís da Silva, a África do Sul é também a “segunda pátria” de milhares de portugueses desde há muito tempo, onde têm passado por várias vicissitudes e que “são tratados pelo Portugal a que pertencem muitas vezes como ‘filhos de um Deus menor'”.
A visita de Marcelo Rebelo de Sousa à África do Sul foi anunciada recentemente em Joanesburgo e na Cidade do Cabo pelo ministro dos Negócios Estrangeiros português, Augusto Santos Silva, que instou as comunidades portuguesas no país a criarem uma comissão local de receção aos seus dirigentes políticos.
“É uma profunda deceção, uma vez que também a situação na África do Sul desde meados da década de 1980 alterou-se bastante e há associações em dificuldades”, disse, por sua vez, Alexandre Santos.
O dirigente da Federação das Associações Portuguesas da República da África do Sul (FAPRAS), que junta atualmente 14 clubes e coletividades no país, considera que a visita do chefe de Estado seria uma “oportunidade única” para motivar a mostrar ao Presidente da República e ao chefe do Governo português “as realidades e a dinâmica da comunidade [portuguesa] na República da África do Sul, para lhes transmitir as ansiedades e para explicar como é que a comunidade está a viver aqui, num país em transição”, sublinhou.
Nesse sentido, a visita de Marcelo à África do Sul, onde o movimento associativo luso tem edificado também desde a década de 1980 várias instituições de solidariedade e apoio social no país, poderia ajudar ainda a “elevar” a imagem que Lisboa atribui à diáspora lusa no sul de África, uma das maiores do Mundo, considerou o conselheiro Vasco Pinto de Abreu.
“Era importante porque há problemas sociais na comunidade, de segurança, de emprego e a comunidade está preocupada com a situação no país até porque há uma recessão económica e agora, com a pandemia da covid-19, a recessão vai aumentar, os casos sociais vão aumentar também, as reformas não chegam, o custo de vida sobe todos os dias, e era importante que viessem cá ver no terreno a realidade”, declarou o conselheiro das comunidades portuguesas na área de Joanesburgo.
A falta de oportunidade deixa agora “um sabor amargo”, como referiu por outro lado Rui Santos, dirigente da tertúlia Academia do Bacalhau na Cidade do Cabo.
“Era uma boa oportunidade para que eles conhecessem a maneira como nós nos moderamos aqui, convivemos uns com os outros e nos organizamos, embora tenha a esperança que seja apenas uma situação adiada”, comentou.
Já José Contente, dirigente da União Portuguesa de Joanesburgo, uma das coletividades mais antigas no país, alertou para o risco de “esquecimento” a que o Governo de Lisboa poderá remeter a diáspora portuguesa na África do Sul.
“Certamente que adia, nós tínhamos vindo a ouvir que teríamos cá um alto representante das Misericórdias, o que também já não vai acontecer, mas cá estaremos para enfrentar as dificuldades como fizemos no passado, porque, como sabe, desde o tempo da descolonização que temos vindo a ser praticamente esquecidos e temos vencido”, disse José Contente.