A Fundação Inatel vai fazer um inventário de todos os documentos de som existentes na posse das entidades suas associadas, com vista a identificar, proteger e valorizar esse património sonoro, segundo um protocolo assinado em Lisboa.
Trata-se de um acordo de colaboração entre a Equipa Instaladora do Arquivo Nacional do Som e a Fundação Inatel, que se insere no projeto de criar um arquivo que guarde, preserve e disponibilize para consulta documentos sonoros, ou seja, conteúdos áudio.
Este protocolo prevê a realização de um inquérito junto das cerca de 2.500 associações – Centros de Cultura e Desporto – do Inatel, que constitui “um dos maiores arquivos nesta matéria”, para fazer um levantamento dos seus documentos sonoros, desde filmes a discografias, passando por gravações de cassetes ou espetáculos ao vivo, disse Francisco Caneira Madelino, presidente da Fundação Inatel.
Estas entidades abrangem áreas tão diversas como associações de etnografia, de desporto, sociedades musicais, bandas filarmónicas, teatros musicais, entre outras, destacou, assinalando que, no âmbito deste protocolo, a Fundação Inatel vai “apoiar o arquivo de som a estabelecer a sua relação com estas associações”.
Segundo o etnomusicólogo Pedro Félix, responsável pela equipa que está a preparar a criação e instalação do Arquivo Nacional do Som (ANS), o primeiro passo deste processo é a avaliação “do estado da arte na arquivística do som”, e avaliar qual “a estrutura técnica necessária”.
Em segundo lugar, importa perceber quais as instituições passíveis de participar na iniciativa, estimando-se que cerca de cinco mil produzam ou detenham documentos sonoros.
Finalmente, será lançado um inquérito – peça central do protocolo – para recensear as associações que detêm documentos sonoros e identificar acervos que têm documentos da maior importância.
“Identificar, mapear, mas também perceber os erros e fazer pequenas intervenções para salvaguardar os documentos (que estejam em suportes frágeis), até haver uma estrutura arquivística, para que tenham futuro”, disse.
Todo este projeto materializa uma “estratégia que assenta na federação de recursos, para preservar o património sonoro e garantir o acesso em condições seguras e permitir a sua utilização”, sublinhou o responsável, acrescentando que o objetivo é “tratar estes sons enquanto património e fontes documentais”.
O Ministro da Ciência e do Ensino Superior, Manuel Heitor, lembrou que a recuperação e proteção do património sonoro é uma “questão crítica para conhecer melhor Portugal, os portugueses e a cultura portuguesa”.
Para o governante, com a mobilização de muitas instituições, será possível “dar mais um passo para no futuro dignificar a nossa memória através do som”.
A ministra da Cultura, Graça Fonseca, recordou, por sua vez, que a equipa instaladora do ANS está a completar um ano da sua aprovação, e que, ao longo desse período, tem feito um trabalho de recenseamento, de identificação de boas práticas, e que tem estado a “contactar com instituições e com arquivos importantes que têm de ser recenseados”.
O protocolo hoje assinado é “importante para fazer o inquérito para um recenseamento rigoroso e cuidado do que existe, do que está em mais ou menos risco, e perceber qual a prioridade para as primeiras ações de reabilitação e preservação do espólio do som”, explicou Graça Fonseca.
A ministra apontou ainda duas áreas a trabalhar no âmbito deste projeto, a primeira das quais – que constitui “a parte menos visível e mais de ‘trabalho de formiguinha’” – é a inscrição na rede europeia internacional de equipas congéneres de arquivo de som.
Portugal é um dos poucos países da Europa que não tinha ainda um arquivo de som, lembrou.
A segunda prioridade, que é também a parte mais visível, é instalar o ANS, que “precisa de uma estrutura tecnológica, mas que tenha presença física, para que qualquer pessoa que queira saber mais sobre um registo sonoro, ou investigadores, ou realizadores do cinema e audiovisual”, possam aceder e consultar, adiantou.
O filme português “A Herdade”, que se estreou em 2019 e que foi distinguido em Veneza, é um exemplo de obra cinematográfica que recorreu a arquivos sonoros da RTP, para uma cena que utiliza um arquivo áudio do dia 25 de Abril.
Os dois ministérios estão a trabalhar para encontrar um local que possa ser visitado e onde exista uma estrutura tecnológica, para instalar o arquivo.
A equipa do Arquivo Nacional do Som foi criada em fevereiro do ano passado, e está a trabalhar desde março de 2019 neste projeto, com a dupla participação dos ministérios da Ciência e da Cultura.
Posteriormente foi constituído o Conselho Consultivo, cuja estrutura – publicada em julho em Diário da República – compreende o etnomusicólogo António Tilly, o responsável pela Área de Conteúdos Rádio da Subdireção de Arquivo da RTP Eduardo Leite, o musicólogo Paulo Ferreira de Castro, a investigadora e diretora do Museu do Fado Sara Pereira e a professora catedrática de Etnomusicologia Salwa Castelo-Branco.
Em setembro, foram lançadas as bases para esse arquivo, com a apresentação do plano estratégico para a sua instalação e, assim, colmatar uma lacuna com mais de 40 anos.
Trata-se de criar uma estrutura técnica e tecnológica que permita arquivar, preservar e disponibilizar o património fonográfico português, recorrendo aos arquivos dispersos existentes, mas também a entidades públicas ou privadas que detenham registos áudios – como as associadas do Inatel – passiveis de serem registados e guardados.