O processo legislativo aberto pelo debate das leis sobre a morte assistida, no parlamento, pode levar tempo a encerrar, se for hoje aprovado pelos deputados.
Os cinco projetos de lei vão ser apresentados e votados na reunião plenária que começa às 15h (hora de Lisboa).
Serão apresentados, por ordem, os projetos do Bloco de Esquerda (BE), do PAN (Partido das Pessoas, dos Animais e da Natureza), do Partido Socialista (PS), do PEV (Partido Ecologista ‘Os Verdes’) e da Iniciativa Liberal (IL).
A conferência de líderes decidiu que a votação dos cinco projetos-lei que pedem a despenalização da eutanásia será nominal, como aconteceu há dois anos sobre a mesma matéria.
Desta forma, os 230 deputados terão de anunciar, de forma individual, o sentido de voto nos cinco projetos de lei que preveem a despenalização da morte assistida, mas sob diversas condições.
Todos os diplomas preveem que só podem pedir a morte medicamente assistida, através de um médico, pessoas maiores de 18 anos, sem problemas ou doenças mentais, em situação de sofrimento e com doença incurável.
Propõem também a despenalização de quem pratica a morte assistida, nas condições definidas na lei, garantindo-se a objeção de consciência para os médicos e enfermeiros.
Caso sejam “chumbados” os projetos de lei do BE, PS, PAN, PEV e Iniciativa Liberal, o “dossier” cai e os grupos parlamentares, a exemplo do que aconteceu em 2018, deverão remeter o assunto para mais tarde, eventualmente após as próximas eleições legislativas, cujo prazo normal é 2023.
Mas tudo indica que pelo menos o projeto de lei do PS sobre a morte assistida deverá ser aprovado hoje.
Se não houver faltas e mudanças de voto de última hora, os votos dos deputados do PS e do Bloco de Esquerda serão suficientes para o aprovar.
Se algum dos cinco projetos for aprovado na generalidade segue para a comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos Liberdades e Garantias, que se engarregará do chamado debate na especialidade e os partidos vão tentar chegar a um “texto comum”, resultado de negociações relativamente a textos que não são muito diferentes entre si.
Nesse cenário, as semanas e meses que se seguem darão também tempo aos movimentos pró-vida e anti-eutanásia, com o apoio da Igreja Católica, para recolher as assinaturas – são necessárias 60 mil – e propor no parlamento uma iniciativa legislativa de cidadãos para um referendo nacional.
Segundo a lei do referendo, uma proposta que resulte de uma iniciativa popular ou da vontade de deputados ou grupos parlamentares são obrigatoriamente discutidas e votadas pela Assembleia da República e, aí, os partidos de esquerda, apesar de posições diferentes quanto à eutanásia, como o PCP, que vota contra, são contrários ao referendo.
E o PS já anunciou que pretende que uma nova lei esteja concluída antes do verão, em votação final global.
Presidente da República pode vetar
Caso os diplomas sejam aprovados na generalidade e ultrapassada a fase de discussão na especialidade sem mais surpresas, o texto comum votado em comissão será aprovado em votação final global e seguirá para Belém, tendo o Presidente da República três hipóteses: promulgar, vetar ou enviar a lei para o Tribunal Constitucional (TC).
Marcelo Rebelo de Sousa, católico praticante, prometeu silêncio sobre o tema até ao final do processo, mas o semanário ‘Expresso’ noticiou, no sábado, que o Presidente estará a ponderar dois cenários: ou veto ou remeter a lei para o Tribunal Constitucional.
Se for vetado pelo Presidente, os partidos, em tese, podem ter os deputados necessários para confirmar um eventual diploma. Basta, segundo o artigo 136º da Constituição portuguesa, a maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções. Nesse caso, ainda segundo o mesmo artigo, “o Presidente da República deverá promulgar o diploma no prazo de oito dias a contar da sua receção”.
Outra possibilidade é Marcelo Rebelo de Sousa remeter o diploma aos juízes do tribunal das leis.
A discussão passa, então, para outro nível, sendo certo que, à partida, existem posições distantes sobre a eutanásia entre políticos e especialistas.
Para apenas citar dois exemplos, Jorge Miranda, deputado em 1975 e um dos “pais” da Constituição, é pela inconstitucionalidade, e Costa Andrade, atual presidente do TC, antes de ser eleito para o cargo, afirmou o contrário, há dois anos.
Nesse caso, se for suscitada a questão constitucional, os prazos decorrem durante semanas até o plenário de juízes anunciar o acórdão.
Constitucionalmente, o “chumbo” de um diploma pelo TC, que depois é vetado obrigatoriamente pelo Presidente e devolvido ao parlamento, pode ser ultrapassado alterando as normas apontadas como inconstitucionais. Mas entre deputados dos vários partidos com projetos de lei ouvidos pela agência Lusa, esse cenário é visto como o “fim da linha” para a lei para despenalizar a morte medicamente assistida.
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