O caso das golas antifumo distribuídas à população no âmbito do programa “Aldeia Segura” e a escolha das empresas por ajuste direto levaram hoje à realização de buscas e à demissão do secretário de Estado da Proteção Civil.
A 26 de julho, o Jornal de Notícias notíciou que 70 mil golas antifumo fabricadas com material inflamável e sem tratamento anticarbonização, que custaram cerca de 165 mil euros, foram entregues pela proteção civil no âmbito do programa “Aldeia Segura” e “Pessoas Seguras”.
As golas antifumo, fabricadas em poliéster, “não têm a eficácia que deveriam ter: evitar inalações de fumos através de um efeito de filtro”.
Depois de ter considerado “irresponsável e alarmista” a notícia sobre as golas antifumo, o ministro da Administração Interna determinou a abertura de um inquérito urgente à Inspeção-Geral da Administração Interna “face às notícias publicadas sobre aspetos contratuais relativamente ao material de sensibilização”.
A 29 julho, Francisco Ferreira, adjunto do secretário de Estado da Proteção Civil, demitiu-se, após ter sido noticiado o seu envolvimento na escolha das empresas para a produção dos ‘kits’ de emergência para o programa “Aldeias Seguras”.
Francisco Ferreira, também presidente da concelhia do PS/Arouca, foi quem recomendou as empresas para a compra das 70 mil golas antifumo inflamáveis, 15 mil ‘kits’ de emergência com materiais combustíveis e panfletos entregues às 1909 povoações abrangidas pelo programa, segundo várias notícias publicadas na altura.
O portal da contratação pública inclui dois contratos no âmbito dos programas “Aldeia Segura” e “Pessoas Seguras” com a empresa Foxtrot Aventura, um dos quais relativo a “kits de autoproteção”, onde se incluem as golas.
No âmbito dos programas “Aldeia Segura” e “Pessoas Seguras”, que procuram garantir uma maior proteção das aldeias em caso de incêndio, são designados oficiais de segurança, figura que tem como missão transmitir avisos à população, organizar a evacuação do aglomerado, em caso de necessidade, e fazer ações de sensibilização junto da população.
No último balanço feito pela Proteção Civil, os programas “Aldeia Segura” e “Pessoas Seguras” estão a ser realizados em 1909 aldeias, existindo 1507 oficiais de segurança local e 1466 locais de abrigo.
Os programas “Aldeia Segura” e “Pessoas Seguras” foram criados seguindo as recomendações da Comissão Técnica Independente aos incêndios de 2017 e que foi nesse âmbito que foram produzidos diversos materiais, como as golas antifumo.
A 30 de julho, o Ministério Público instaurou um inquérito relacionado com o caso das golas antifumo de proteção contra incêndios.
Após estas notícias, a Proteção Civil pediu ao Centro de Investigação de Incêndios Florestais (CIIF), dirigido por Xavier Viegas, que realizasse testes às golas, tendo concluído que não inflamam quando expostas ao fogo.
O relatório preliminar, conhecido na altura, revelou que as golas não inflamaram “mesmo quando colocadas a uma distância inferior a 50 centímetros das chamas, durante mais de um minuto”, chegando a furar a cerca de 20 centímetros das chamas, mas sem arderem.
Mais de meia centena de buscas estão hoje a ser efetuadas no âmbito de uma investigação do Ministério Público sobre as práticas enquadradas nos Programas “Aldeia Segura”, “Pessoas Seguras” e “Rede Automática de Avisos à População” por suspeitas de fraude na obtenção de subsídio, de participação económica em negócio e de corrupção, segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR).
Uma nota da PGR refere que se encontram em curso oito buscas domiciliárias e 46 não domiciliárias, no âmbito de um inquérito dirigido pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP).
Em causa estão práticas levadas a cabo no contexto de uma operação cofinanciada pelo Fundo de Coesão da União Europeia (…), enquadradas nos Programas “Aldeia Segura”, “Pessoas Seguras” e “Rede Automática de Avisos à População”, precisa a mesma nota.
As buscas decorrem em vários locais, incluindo o Ministério da Administração Interna, a Secretaria de Estado da Proteção Civil, a Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil e Comandos Distritais de Operações de Socorro.
No dia em que a PJ realiza as buscas, o secretário de Estado da Proteção civil, José Artur Neves, demitiu-se do cargo “por motivos pessoais”, quando faltam 18 dias para a realização das eleições legislativas, marcadas para 06 de outubro.