A história de D. Luís: Monarca de dia, dr. Tavares à noite

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…E Lipipi para a mãe. O Rei D. Luís era bem diferente do irmão e antecessor, D. Pedro V: apreciava clubes noturnos, mulheres, tabaco e boa comida. Mesmo depois de subir ao trono, manteve uma vida dupla: de dia era Rei, marido de D. Maria Pia de Saboia e pai de Carlos e Afonso; à noite, Dr. Tavares.

O Rei preferia não ser reconhecido e, acompanhado do amigo Magalhães Coutinho (esse, sim, médico), adotava o pseudónimo para percorrer a noite de Lisboa. A primeira amante terá sido a atriz Rosa Damasceno. D. Maria Pia sabia das traições do marido, mas não fazia escândalo. Vingava-se de outras formas: o marido apreciava a pontualidade, ela atrasava-se para tudo (jantar, ir à ópera, sair para um passeio ou visita oficial); o marido fumava e gostava de acompanhar as refeições com pão com manteiga, ela queixava-se do fumo e da falta de cuidado com a dieta no palácio. A maior desforra refletia-se nos gastos: Maria Pia era o equivalente a uma shopaholic de hoje. Adorava joias e roupa cara, demorava dias a desembalar as compras que fazia em Paris. Quando a criticavam, respondia: “Querem Rainhas? Paguem-nas!”

Rei de Portugal

D. Luís herdou a coroa em novembro de 1861, sucedendo ao seu irmão D. Pedro V por este não deixar descendência, e foi aclamado rei a 22 de dezembro do mesmo ano. A 27 de setembro do ano seguinte casou-se, por procuração, com D. Maria Pia de Saboia, filha do rei Vitor Emanuel II da Itália. Quando infante serviu na marinha, visitando a África Portuguesa. Exerceu o seu primeiro comando naval em 1858.

Luís era um homem culto e de educação esmerada, como todos os seus irmãos. De grande sensibilidade artística, pintava, compunha e tocava violoncelo e piano. Poliglota, falava corretamente algumas línguas europeias. Fez traduções de obras de William Shakespeare.

Durante o seu reinado e, em consequência da criação do imposto geral de consumo, que a opinião pública recebeu mal, originou-se o motim a que se chamou a Janeirinha (em finais de 1867). Também a 19 de maio de 1870, se verificou uma revolta militar, promovida pelo marechal Duque da Saldanha e que pretendia a demissão do governo. À revolta de 19 de maio, respondeu o monarca em 29 de agosto, com a demissão do ministério de Saldanha, chamando ao poder Sá da Bandeira.

Em setembro de 1871, subiu ao poder Fontes Pereira de Melo, que organizou um gabinete regenerador, o qual se conservou até 1877. Seguiu-se o Duque de Ávila, que não se aguentou durante muito tempo por lhe faltar maioria. Assim, e depois do conflito parlamentar que rebentou em 1878, Fontes foi chamado outra vez para constituir gabinete. Consequentemente, os progressistas atacaram o rei, acusando-o de patrocinar escandalosamente os regeneradores. Este episódio constitui um incentivo ao desenvolvimento do republicanismo. Em 1879, D. Luís chamava, então, os progressistas a formarem governo.

No seu tempo surgiu a Questão Coimbrã (1865-1866) e ocorreu a iniciativa das Conferências do Casino (1871), a que andavam ligados os nomes de Antero de Quental e Eça de Queiroz, os expoentes de uma geração que se notabilizou na vida intelectual portuguesa. De temperamento calmo e conciliador, foi um modelo de monarca constitucional, respeitador escrupuloso das liberdades públicas. Do seu reinado merecem especial destaque o início das obras dos portos de Lisboa e de Leixões, o alargamento da rede de estradas e dos caminhos-de-ferro, a construção do Palácio de Cristal, no Porto, a abolição da pena de morte para os crimes civis, a abolição da escravatura no Reino de Portugal, e a publicação do primeiro Código Civil.

Em 1884, foi efetuada a Conferência de Berlim, resultando daí o chamado Mapa Cor-de-Rosa, que definia a partilha de África entre as grandes potências coloniais: Alemanha, Bélgica, França, Inglaterra e Portugal.

Fértil em acontecimentos, é no reinado de D. Luís I que são fundados alguns dos partidos políticos portugueses: o Partido Reformista (1865), que ascendeu ao poder em 1868, o Partido Socialista Português (1875), com o nome de Partido Operário Socialista, e o Partido Progressista (1876), que chega ao poder em 1879. Em 1883, dá-se a realização do Congresso de Comissão Organizadora do partido Republicano. No final do seu reinado, o Partido Republicano apresenta-se já como uma força política perfeitamente estruturada.

D. Luís era principalmente um homem das ciências, com uma paixão pela oceanografia. Investiu grande parte da sua fortuna no financiamento de projetos científicos e de barcos de pesquisa oceanográfica, que viajaram pelos oceanos em busca de espécimes. Praticou, com sucesso, fotografia.

Luís seguiu os passos de sua mãe – D. Maria II, mandando construir e fundar associações culturais. Em 1 de Junho de 1871, D. Luís esteve no Seixal (uma vila fundada pela sua mãe), para testemunhar a fundação da Sociedade Filarmónica União Seixalense. Neste mesmo dia terminava a Guerra Franco-Prussiana.

Morre, depois de um longo sofrimento, na cidadela de Cascais, a 19 de outubro de 1889, a poucos dias de completar 51 anos. Sucede-lhe o seu filho D. Carlos, sob o nome de D. Carlos I de Portugal. Jaz no Panteão Real da Dinastia de Bragança, no Mosteiro de São Vicente de Fora, em Lisboa.

No dizer dos biógrafos, D. Luís, era: “muito agradável e liberal. […] A Sr.ª D. Maria Pia, dizia que ele era um pouco doido, aludindo a certas aventuras de amor. […] Além de tais aventuras, nada satisfazia mais o Sr. D. Luís que o culto da arte. Escrevia muito, traduzia obras estrangeiras, e desenhava; mas o seu entusiasmo ia sobretudo para a música. Tinha uma grande coleção de violinos, e um bom mestre-escola […]”

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