O fundador do CDS Diogo Freitas do Amaral recordou o seu “percurso singular” de intervenção política, afirmando que acentuou valores ora de direita ora de esquerda, face às conjunturas, mas sempre “no quadro amplo” da democracia-cristã.
Freitas do Amaral falava no lançamento do seu livro “Mais 35 anos de Democracia – Um percurso singular”, editado pela Bertrand, o terceiro dedicado às suas memórias políticas e que abrange o período entre 1982 e 2017, no Centro Cultural de Belém, em Lisboa, perante o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.
“De facto, o meu percurso político foi singular”, considerou o fundador e primeiro líder do CDS, que terminou a sua intervenção a citar alguns versos da canção “My Way”, na sua versão em inglês, com letra de Paul Anka, que ficou famosa na voz de Frank Sinatra, para ilustrar o seu “percurso diferente”, feito “no exercício de uma plena liberdade política”.
Freitas do Amaral, que fez parte de governos da Aliança Democrática (AD), entre 1979 e 1983, e mais tarde do PS, entre 2005 e 2006, após ter saído do CDS em 1992, ressalvou que respeita a opção das pessoas que “ficam quase sempre onde começaram”, mas realçou que no seu caso “as coisas aconteceram de forma diferente”.
“Houve uma primeira fase em que, com o país demasiado virado à esquerda, acentuei sobretudo valores de direita. E uma segunda fase em que, julgando eu que o país estava demasiado virado à direita, acentuei sobretudo valores de esquerda. Sempre no quadro amplo, vasto e profundo da democracia-cristã”, afirmou.
Contudo, declarou que não se arrepende de nada e defendeu que nunca deixou a matriz da “democracia-cristã, inspirada na vida e nos ensinamentos de Jesus Cristo”, e o sentido de “dever especial de solidariedade com os mais pobres”.
“Olhando para trás, para estes 45, 50 anos, penso que aquilo que mais me marcou foi a minha filiação democrata-cristã. Em primeiro lugar, a democracia, a qual explica quatro recusas de convites feitas pelo meu mestre e amigo, doutor Marcello Caetano, durante o Estado Novo. E explica mais de uma dezena de ‘sins’ que fiz conscientemente depois do 25 de Abril. Mas democracia-cristã, inspirada na vida e nos ensinamentos de Jesus Cristo”, disse.
“E enquanto tiver um sopro de vida tenciono continuar a dar prioridade a esse aspeto”, acrescentou.
Freitas do Amaral referiu que a última fase da conclusão desta obra “não foi uma fase muito fácil”, por razões de saúde, e frisou que estas são “memórias políticas, que não são nem privadas, nem familiares, nem pessoais, nem académicas”, com as quais não pretende “ajustar contas com ninguém”.
“Escrevi, sobretudo, para deixar um testemunho, tão objetivo quanto possível. Sei que esta verdade é apenas a minha parte da verdade. Mas um testemunho feito com a intenção da imparcialidade possível, para que um dia os historiadores independentes possam dispor uma fonte onde vão encontrar algumas explicações que se calhar mais ninguém deu ou dará”, justificou.
No início do seu discurso, Freitas do Amaral agradeceu a presença de Marcelo Rebelo de Sousa e disse que os dois têm “uma velha e longa amizade” e tiveram “alguns momentos de cumplicidade política”, por exemplo, durante a AD.
Professor universitário de direito, nascido em 21 de julho de 1941, na Póvoa de Varzim, no distrito do Porto, Freitas do Amaral foi fundador e primeiro presidente do CDS, pelo qual foi eleito deputado à Assembleia Constituinte, em 1975, e depois à Assembleia da República, em diversas legislaturas, até se desfiliar do partido, em 1992.
No período de governação da AD, entre 1979 e 1983, foi vice-primeiro-ministro, ministro dos Negócios Estrangeiros, primeiro-ministro interino, após a morte de Francisco Sá Carneiro, e mais tarde ministro da Defesa Nacional. Voltou a exercer as funções de ministro dos Negócios Estrangeiros no primeiro Governo chefiado por José Sócrates, entre 2005 e 2006.
No plano internacional, foi presidente da Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), entre 1995 e 1996, e da União Europeia das Democracias Cristãs, de 1981 a 1983.