Nesta entrevista ao ‘Mundo Português, o Embaixador Luís Faro Ramos, presidente do Instituto Camões, fala sobre as valências do Português, uma língua que exerce um cada vez maior “poder de atração” em todo o mundo.
No dia 5 de Maio celebra-se pelo mundo, o Dia da Língua Portuguesa e da Cultura na CPLP. No presente ano letivo, o ensino da língua portuguesa ministrado diretamente ou com o apoio do Camões-Instituto da Cooperação e da Língua (Camões, I.P.)chega a quase 300 mil alunos no estrangeiro. Números que exemplificam as palavras do presidente deste Instituto, quando afirma que “há um crescimento generalizado da Língua Portuguesa em diferentes latitudes”.
Nesta entrevista, o Embaixador Luís Faro Ramos fala sobre esta língua que exerce um cada vez maior “poder de atração” em todo o mundo.
A sua nomeação para a presidência do Camões, I.P. foi um sinal do ministro dos Negócios Estrangeiros de que a Língua e a Cultura são um elemento importante para a política externa portuguesa?
Penso que sim. Sou, aliás, o primeiro diplomata a exercer estas funções e é realmente uma satisfação para mim. Mas gostaria de referir duas coisas.
A primeira é que considero que há um reconhecimento por parte do Governo, de que a carreira diplomática portuguesa tem valências em muitas destas áreas. Em segundo lugar, é como diz: o facto de ser um diplomata a presidir ao Camões, nesta altura, significa, entre outras coisas, que a promoção da língua e da cultura portuguesas e a execução da cooperação para o desenvolvimento são atividades centrais para a política externa de Portugal. E muito daquilo que se convenciona chamar o ‘soft power’, o ‘poder suave’ de Portugal a nível internacional, penso que passa por aqui, por estas atividades.
Enquanto embaixador, ajudou a lançar um programa de Português como língua estrangeira no ensino secundário na Tunísia e esteve intimamente ligado ao lançamento da cátedra Eça de Queirós na Universidade de Havana, Cuba. A Língua e a Cultura portuguesas eram áreas centrais nas suas funções enquanto diplomata?
Fazem parte das funções de qualquer diplomata e, neste caso concreto, de um chefe de missão. A diplomacia tem muitas vertentes. A tradicional, política, é obviamente importante, mas também o é a diplomacia económica, a diplomacia cultural, a diplomacia científica. São estas vertentes todas da atividade diplomática que qualquer chefe de missão prossegue.
No meu caso concreto, tive a satisfação de assistir na Tunísia, ao inicio do ensino do Português como língua opcional no secundário, e no caso de Cuba de ter inaugurado a cátedra Eça de Queirós na Universidade de Havana e de ter também estabelecido um leitorado que funciona já com resultados concretos. Em menos de três anos, o estatuto da Língua Portuguesa na Universidade de Havana já subiu de grau: era uma terceira língua e já é uma segunda língua. Dá-me particular satisfação ter estado associado a esses dois momentos.
“A existência da CPLP é uma ‘arma’ formidável, assim como a coordenação e a promoção conjunta da Língua Portuguesa que todos fazemos – e aqui há que dizer com toda a clareza que Portugal não é o proprietário da Língua Portuguesa, nem quer ser” |
As valências da Língua Portuguesa ultrapassam as iniciais componentes cultural e literária, é de sublinhar a sua dimensão como língua de economia e até de ciência. Mas o português é língua de um conjunto de países que não são, pelo menos atualmente, política e economicamente determinantes no cenário internacional. Por outro lado, são países espalhados por quatro continentes, o que dá ao Português um maior alcance geográfico. O que pesará então mais na balança?
Nunca nos devemos esquecer que esta é uma língua falada por mais de 260 milhões de pessoas. A Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) – a instituição que agrega todos estes países onde se fala a quinta língua mais falada em todo o mundo – representa uma diversidade que só nos enriquece. Uma diversidade geográfica, porque estamos a falar de países que estão quatro continentes. Há essa dispersão geográfica, mas há uma unidade na língua, e isso é fantástico. É um enorme valor acrescentado.
Quando refere que estão não são países com grande peso politico e económico, permita-me discordar. Bastam três casos em três continentes. O caso de Portugal na Europa através de todas as alianças de que faz parte. Portugal transporta o valor da CPLP em instâncias como a União Europeia, a Nações Unidas, a Unesco, entre outras. Em África, temos Angola e Moçambique, dois países com uma crescente influência regional. Portanto, dois países que, ao nível do continente onde se inserem, têm uma palavra a dizer em assuntos da política regional, da economia, etc. E depois temos, na América Latina, o Brasil, país com um peso considerável na região onde se insere. Portanto, cada um, na sua rede de alianças, desempenha um papel importante na cena política, económica regional.
É evidente que esta comunhão de língua enriquece imenso a CPLP e é um fator que joga cada vez mais na cena internacional. A CPLP tem três grandes objetivos: a concertação politico-diplomática, a língua e a cooperação. E do meu ponto de vista, e tenho-o afirmado várias vezes, é na língua que a CPLP mais se pode afirmar e é na língua que tem potencial para crescer, um potencial que se vai construindo e solidificando. A existência da CPLP é uma ‘arma’ formidável, assim como a coordenação e a promoção conjunta da Língua Portuguesa que todos fazemos – e aqui há que dizer com toda a clareza que Portugal não é o proprietário da Língua Portuguesa, nem quer ser.
Por falar no seu potencial, o cálculo do valor económico da Língua Portuguesa apontava para 17% do Produto Interno Bruto como referiu o ministro dos Negócios Estrangeiros, aquando da tomada de posse do Sr. Embaixador como presidente do Instituto Camões. Mas como se passa desse conhecimento para a ação?
Esses dados de 2014 foram depois atualizados no Novo Atlas da Língua Portuguesa, de 2016, e continuam a ser atualizados. Está provado que fazer negócios numa mesma língua, facilita esses mesmos negócios. E depois, há o poder de atração da Língua Portuguesa e a necessidade de aprendê-la que exerce junto de países externos à CPLP. E dou-lhe o caso concreto da China. Não há muito tempo, as autoridades chinesas consideraram a Língua Portuguesa como língua oficial de negócios em África. Isso quer dizer que a China entende que, sabendo Português, tem mais facilidades e fazer negócios em África. Essa é uma vertente muito prática de transposição do valor económico da língua.
Depois, temos que agregar também tudo o que representa cada um dos países da CPLP, por exemplo, em termos de reservas de hidrocarbonetos, as reservas naturais que têm países como Brasil e Angola. Tudo isso soma. Até há uns anos atrás dizia-se que o Português era, sobretudo, uma língua de valor literário, de comunicação entre gerações, mas agregaram-se outras: o valor económico; o valor científico; o valor de língua de trabalho oficial em organizações internacionais, que atualmente são mais de 30. Há um caminho cada vez mais claro de interesse na Língua Portuguesa em múltiplas valências, o que é de saudar.
“Está provado que fazer negócios numa mesma língua, facilita esses mesmos negócios. E depois, há o poder de atração da Língua Portuguesa e a necessidade de aprendê-la que exerce junto de países externos à CPLP. E dou-lhe o caso concreto da China. Não há muito tempo, as autoridades chinesas consideraram a Língua Portuguesa como língua oficial de negócios em África. Isso quer dizer que a China entende que, sabendo Português, tem mais facilidades e fazer negócios em África. Essa é uma vertente muito prática de transposição do valor económico da língua” |
Fazer do português uma das línguas oficiais da ONU ainda é um objetivo longínquo ou têm sido feitos progressos? Qual é o papel ou o contributo que o Camões pode dar? Em 2018, o Dia da Língua e Cultura Portuguesa foi celebrado nos jardins das Nações Unidas, em Nova Iorque. E em dezembro a Língua Portuguesa passou a ser ensinada na Escola Internacional das Nações Unidas. Pode dizer-se que são ‘vitórias’ nesse caminho?
São passos no sentido de que isso (ser língua oficial da ONU) venha a acontecer. Não posso dizer, é impossível prever, quando. Mas é um objetivo político assumido pela CPLP. Têm que ser dados passos nessa direção. A formação em Tradução e Interpretação é fundamental, e o (Instituto) Camões contribui nessa área. Mas os passos que referiu também são importantes. O facto de, pela primeira vez, ter havido uma parceria entre Portugal e Brasil para o ensino do Português na Escola Internacional das Nações Unidas, em Nova Iorque, que foi testemunhada pelo Secretário-Geral da ONU, um nacional de Portugal, é um passo nesse sentido. Como o é, qualquer passo dado para, por exemplo, celebrar o Dia da Língua Portuguesa e da Cultura (5 de Maio) em Nova Iorque, durante todo o dia, como aconteceu no ano passado, com a presença de António Guterres e de altos representantes de todos os países da CPLP. Há pouco falávamos da consciência por parte de países terceiros, para a importância desta língua.
Da língua global que é o Português hoje em dia, da afirmação, do número de falantes que será cada vez maior: há estimativas das Nações Unidas que indicam que no final do século cerca de 500 milhões de pessoas farão parte do mundo que fala Português. Portanto, tudo isso contribui para uma tomada de consciência da importância da Língua Portuguesa e do seu lugar central no conceito das línguas globais de hoje em dia.
Tem sublinhado o crescente interesse pela língua portuguesa ‘em todas as latitudes’. Onde é que esse crescimento se tem feito mais sentir?
Há um crescimento generalizado em diferentes latitudes: em África, na Europa, na América Latina, na Oceania. Mas posso dar três países como exemplo. Espanha, Estados Unidos da América e China. São países onde é cada vez maior o interesse pela Língua Portuguesa, por razões eventualmente diferentes.
Começando pela Espanha. É um país vizinho, um país onde há muito interesse nas escolas pelo ensino do Português. No ano passado tive o prazer de termos assinado um memorando com a Comunidade de Castela e Leão fechando assim o núcleo das comunidades transfronteiriças (espanholas) onde o Português é ministrado no ensino público espanhol. Há um crescimento muito grande do número de alunos em Espanha. Mas também os são nos Estados Unidos. Estive recentemente numa visita de trabalho ao estado da Califórnia, que é outro exemplo. Há nos Estados Unidos cerca de 50 mil alunos a aprenderem Português, e estes são dados que conhecemos da rede apoiada pelo Camões, porque há outros dados que não conheceremos. Nos EUA o crescimento é tanto a nível da nossa diáspora, portugueses e luso-descendentes, como a nível dos próprios norte-americanos.
A China é um caso muito interessante, por outros motivos. É um país onde a comunidade portuguesa não é significativa, mas onde há imenso interesse em aprender Português e onde a nossa língua é ensinada em múltiplos lugares e a múltiplos níveis, sobretudo nas universidades. Neste momento há mais de 30 universidades onde a Língua Portuguesa é ensinada. Macau desempenha um papel importantíssimo nessa área, temos lá o IPOR (Instituto Português do Oriente), de que o Camões é acionista maioritário, que participa numa série de ações de ensino da língua tanto em Macau como na China continental e na região da Ásia-Pacífico em geral. Estes três países são bons exemplos do interesse crescente pelo Português em várias latitudes.
Mas posso também falar do Senegal, país africano onde há cerca de 50 mil alunos a aprender Português.
“O nosso objetivo é que o ensino do Português seja integrado no currículo das escolas públicas do país em questão” |
Em outubro último, na apresentação da rede EPE (Ensino Português no Estrangeiro) para 2018/2019, que está em cerca de 80 países, apontou África, Ásia Central e América Latina como ‘regiões estratégicas’. Mantêm-se?
Sim, sem dúvida. Fazem parte da extensão da rede Camões para 2019. Aliás, há países concretos em que isso se pode aplicar. Em África abrimos novos leitorados na Costa do Marfim e na Guiné Equatorial. Em Gana e nos Camarões estamos também a realizar colaborações com estabelecimentos de ensino. A aposta na Ásia Central é relativamente nova, mas sabemos que há países com interesse pela Língua Portuguesa. Estamos neste momento em conversações com universidades no Casaquistão, numa parceria com o Brasil. E depois, a América Latina. Abrimos um leitorado na Universidade de Guadalajara (México), temos, também em colaboração, um curso no Panamá. Para além do que já existe: cátedras, colaborações com universidades no Chile, na Argentina, no Uruguai, etc.
O crescimento da rede faz-se também com o aumento do número de professores e elementos de coordenação. Recentemente foi contratado um coordenador-adjunto para os EUA. Este estado norte-americano é uma aposta do Camões no aumento do número de alunos? Que potencialidades tem e que ainda não foram alcançadas?
A Califórnia faz parte da aposta nos EUA. Havia já o anseio do Camões em reforçar a sua presença na Costa Oeste, que se concretizou com a nomeação de um coordenador-adjunto. Estive na Califórnia a visitar escolas, universidades, a participar em conferências, em eventos da nossa cátedra na Universidade da Califórnia – Berkeley. Tanto junto das escolas comunitárias como das públicas, a nível do secundário como das universidades, estamos muito apostados em, através deste coordenador-adjunto, reforçar a nossa presença e aumentar os números, porque na Califórnia há mais potencialidades. Falando especificamente na nossa diáspora, temos ali uma comunidade estimada em cerca de 300 mil pessoas e temos um número de alunos relativamente diminuto. Parece-me que os números estão aquém do potencial e que esta presença reforçada do Camões na Califórnia irá contribuir para que esses números cresçam.
Haverá outras contratações a esse nível para outros países este ano? Há previsão do alargamento da rede a outros países?
Nós temos este ano um novo coordenador-adjunto nos Estados Unidos e outro em França, que eram necessidades muito sentidas. Penso que neste momento a nossa oferta está adequada à procura. Porque, repare, temos muitas formas de intervenção: temos as coordenações, coordenadores-adjuntos, a rede EPE, mas temos parcerias, temos muitas formas de cooperação com estabelecimentos de ensino seja a nível secundário, seja a nível superior. Portanto, vamos acorrendo às necessidades com uma fórmula muito flexível e isso é muito bom, porque podemos intervir de várias maneiras.
Há aqui uma geometria variável que nós aproveitamos com os recursos financeiros que temos, que também são limitados. Não estão previstas novas contratações da maneira como referiu, mas está previsto que onde haja interesse – e isso é uma preocupação permanente do Camões – nós verificamos, analisamos e vemos qual é a melhor forma de entrarmos em parceria com as instituições desse país.
“Nós temos este ano um novo coordenador-adjunto nos Estados Unidos e outro em França, que eram necessidades muito sentidas. Penso que neste momento a nossa oferta está adequada à procura. Porque, repare, temos muitas formas de intervenção: temos as coordenações, coordenadores-adjuntos, a rede EPE, mas temos parcerias, temos muitas formas de cooperação com estabelecimentos de ensino seja a nível secundário, seja a nível superior. Portanto, vamos acorrendo às necessidades com uma fórmula muito flexível e isso é muito bom, porque podemos intervir de várias maneiras” |
E numa língua que se quer global, que importância tem o ensino junto das comunidades portuguesas?
É fundamental e os números aí também têm crescido. Não só não vamos interromper esse esforço, como vamos aumentá-lo. No ano passado aumentamos a rede de professores EPE. Não estamos ainda no nível que tínhamos há uns anos atrás, mas, enfim, a situação do país obrigou a que fossem tomadas medidas de racionalização. Porém, dentro dessa racionalização, temos aumentado. Uma preocupação constante da nossa parte é estar junto das comunidades (portuguesas) através das coordenações de ensino, da nossa rede de professores e dos centros de apoio pedagógico.
Foi um revés, a decisão do governo francês do Português deixar de ser língua que serve de prova específica do acesso à universidade? É uma discriminação para com a Língua Portuguesa, comparativamente ao inglês, alemão, espanhol e italiano? Pensa ser possível um acordo com o governo francês?
Nós tomamos conhecimento dessa proposta, penso que é ainda uma intenção que seria formalizada a curto prazo. Quando fomos alertados pelas nossas estruturas em França, não ficamos parados. Estamos a vários níveis, tanto em Portugal como em França, a sensibilizar as autoridades francesas e os nossos interlocutores, para o erro em que as autoridades francesas incorrerão se essa decisão for tomada. Desde logo, pelo peso da Língua Portuguesa e também pelo peso da comunidade luso-descendente em França. E também por uma outra questão, que nos parece importante: o facto da França, não há muito tempo atrás, ter solicitado a adesão à CPLP, como observador associado. Tudo isto nos parece conduzir a um raciocínio diferente daquele que nos foi transmitido como sendo a intenção das autoridades francesas. Enfim, estamos neste momento num processo de diálogo, de sensibilização. É tudo o que posso adiantar sobre essa matéria, frisando, mais uma vez, que, obviamente, este assunto nos preocupa e que esperamos que o desfecho possa ser outro.
O ensino complementar, introduzido no Luxemburgo e a alargar à África do Sul e à Suíça, é uma forma de compensar a inexistência de ensino integrado, onde este ainda não é possível oferecer? O modelo do Luxemburgo será aplicado nos outros países?
Temos, basicamente, três modalidades de ensino possíveis: o paralelo, o integrado e o complementar. O paralelo é uma modalidade que penso que continua a ser importante, em alguns países é mesmo a única existente. E temos depois o ensino integrado. O complementar apareceu como um meio caminho, como uma via que compromete mais as autoridades locais do que o ensino paralelo, mas ainda não as compromete tanto como o ensino integrado. Mas é muito interessante porque vimos que é uma caminho que podia ser seguido.
Está, como disse, a ser seguido no Luxemburgo e vamos, aliás, a curto prazo apresentar, juntamente com as autoridades luxemburguesas, alguns resultados da aplicação dessa modalidade de ensino. Foi uma modalidade ditada pelos acontecimentos, já que em 2017 foi necessário tomar uma atitude, conjuntamente com as autoridades luxemburguesas, para que o Português não deixasse de ser ensinado nalgumas escolas.
O ensino complementar está a ser testado também na África do Sul, demos instruções à coordenação de ensino para o fazer e estamos neste momento numa fase de avaliação. Penso que no próximo ano letivo – os anos letivos na África do Sul iniciam no princípio do ano – possa ser introduzido. A ideia é o coordenador apresentar-nos os resultados da avaliação a breve trecho. E eventualmente será introduzido na Suíça. Mas o nosso objetivo é que o ensino do Português seja integrado no currículo das escolas públicas do país em questão. Esse é o caminho que tem sido feito nalguns países, está a ser feito noutros. E temos já o ensino do Português no currículo do secundário em mais de 20 países.
“Quando fomos alertados pelas nossas estruturas em França, não ficamos parados. Estamos a vários níveis, tanto em Portugal como em França, a sensibilizar as autoridades francesas e os nossos interlocutores, para o erro em que as autoridades francesas incorrerão se essa decisão for tomada. Desde logo, pelo peso da Língua Portuguesa e também pelo peso da comunidade luso-descendente em França. E também por uma outra questão, que nos parece importante: o facto da França, não há muito tempo atrás, ter solicitado a adesão à CPLP, como observador associado” |
Em setembro do ano passado, o ministro dos Negócios Estrangeiros afirmava que o Governo queria “a breve prazo” duplicar o número de países com o português como língua de opção no ensino básico e secundário – dos atuais 20 para 40. Mas este é um objetivo que depende também dos governo e autoridades do setor da educação dos diversos países. Quais são as maiores dificuldades nesse sentido?
Também aí as latitudes são várias. Há a necessidade de negociação e de concertação com as autoridades locais, de ter que assumir desde logo se há interesse no ensino da língua, se há procura pelo ensino dentro do país. O passo seguinte é formalizar esse entendimento. Eu fiz isso na Tunísia. Nós assinamos com a Argélia, no âmbito da cimeira com aquele país (outubro de 2018), um memorando para o ensino do Português no secundário. Na Venezuela também, no ano passado. É um caminho que se vai fazendo. Estamos permanentemente a fazer esse esforço, através da rede diplomática, das estruturas do Camões, e é um caminho que vai sendo facilitado pela demonstração do valor da Língua Portuguesa. Portanto, o objetivo dos 40 países é exigente, mas é exequível.
O Camões tem apostado também nas plataformas digitais para levar mais longe a aprendizagem do português. Com o ‘Português + Perto’ e o ‘Camões Júnior’. São formas de levar mais longe o ensino?
O digital é fundamental. A plataforma ‘Português + Perto’, desenvolvida em conjunto com a Porto Editora, foi aplicada primeiros nos EUA e no Canadá e estendemos estendê-la, com utilização gratuita, à Venezuela, África do Sul e Austrália. É uma medida que tem mais de 600 utilizadores e temos que a divulgar. Aproveito, aliás, esta entrevista para sublinhar o valor desta plataforma.
Quanto ao ‘Camões Júnior’, está em fase de arranque e em período de testes. Destina-se a um público entre os 10 e os 17 anos, e vai ter um lançamento formal em Espanha. São duas ferramentas de ensino na área do digital nas quais o Camões quer apostar decisivamente.
A certificação veio dar mais credibilidade àquilo que os alunos aprendem? E a creditação (nos EUA, avalia as competências línguísticas em Português), vem abrir perspetivas a nível do ensino superior?
Sem dúvida. São duas grandes vitórias. Abrem outras perspetivas. São os chamados três ‘cês’: conteúdos, certificação e creditação. É o caminho que estamos a fazer nos Estados Unidos com os exames ‘NEWL’ (avaliam as competências linguísticas – compreensão de texto, compreensão oral, produção escrita e produção oral – de alunos a partir do 9º ano, ou com 14 anos completos, em quatro idiomas: árabe, coreano e russo e, desde 2017, o português). Tivemos um crescimento incrível de inscritos entre o primeiro e o segundo ano de aplicação e esperamos que os números este ano sejam também satisfatórios.
Estes três ‘cês’ são todos um processo, um ciclo que se reforça e se solidifica e abre outros caminhos.
Luís Filipe Melo e Faro Ramos nasceu em Lisboa em 25 de maio de 1962.
Diplomata, casado, com dois filhos, o Embaixador Faro Ramos é licenciado em Direito pela Universidade de Lisboa e ingressou no Ministério dos Negócios Estrangeiros em 1987. Esteve colocado em diversas representações portuguesas no estrangeiro, nomeadamente: Atenas (1993), Macau (1998), Genebra (1999), Bruxelas (2004), Tunes (2012) e Havana (2015), as duas últimas como Chefe de Missão. Desempenhou também funções como Chefe de Gabinete do Secretário de Estado da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar (2008-2009) e Diretor-Geral de Política de Defesa Nacional (2010-2012). Foi representante das categorias de secretário de embaixada e conselheiro de embaixada no Conselho Diplomático, entre 1996-1998 e 2008-2010. A 24 de outubro de 2017 foi nomeado Presidente do Camões – Instituto da Cooperação e da Língua por despacho do Ministro dos Negócios Estrangeiros. |
Ana Grácio Pinto (entrevista)
António Freitas (fotos)