Os cartazes gigantes colocados estrategicamente nas vias rápidas e estradas nacionais divulgam o “mês da enguia” e Salvaterra de Magos assume-se como a “sua capital” sem nunca ter registado a marca. Como já manda a tradição, março volta a trazer ao concelho de Salvaterra de Magos uma nova edição do Mês da Enguia.
Desta vez a 23ª edição consecutiva deste certame que, segundo a Câmara Municipal, ano após ano se tem afirmado no panorama nacional, trazendo ao seu concelho apreciadores da sua gastronomia que se tornam, a cada visita, amigos do seu território. Sair num a terça feira de Carnaval de Lisboa rumo a Salvaterra e encontrar todos os restaurantes com filas de espera de gente para almoçar, é sinónimo que o evento mexe com a economia do concelho, e que nas duas dezenas de restaurantes aderentes, que se identificam pela sinalética da “bandeira ou escaparate” à porta, neste mês em Salvaterra são consumidas umas boas toneladas de enguia e cuja dose com arroz de feijão seco custa só o prato 15,00 euros.
De caldeirada, de ensopado ou fritas com arroz de feijão, as enguias são as verdadeiras rainhas à mesa das duas dezenas de restaurantes que voltam a integrar o Mês da Enguia, com todo o seu saber fazer e bem receber, como um verdadeiro ponto de partida para a descoberta do concelho de Salvaterra de Magos.
O Mês da Enguia tem a grande capacidade de mobilizar distintas áreas de atividade concelhias, constituindo-se num produto revelador da identidade ribeirinha e ribatejana. Organizado pela Câmara Municipal, o evento gera em 31 dias uma árdua procura sua restauração, do comercio local, do alojamento local, das casas vinícolas, do artesanato, dos produtos locais, dos passeios no Tejo, dos espaços culturais e patrimoniais, ao mesmo tempo que permite dar voz e espaço às forças vivas que formam a nossa cultura. O programa cultural elaborado pela Câmara é vasto e diversificado e almoçando nos restaurantes se recebe um cupão de participação numerado, que se vai entregar numa tômbola no turismo ou na Feira do Artesanato, que assim a câmara fica com dados dos visitantes, – nome, mail e telefone, de onde é, onde se comeu e pode-se até ser sorteado com um dos 6 prémios instituídos.
Salvaterra de Magos, é região de produção de arroz, e neste concelho com história que se estende da Lezíria à Charneca e que delega na Falcoaria Real e no Tejo patrimónios impares que quer dar a conhecer.
A Feira Nacional de Artesanato e de Produtos Tradicionais conta com uma centena de expositores.
Na visita a Salvaterra, obrigatório se torna dar um “salto” a Escaroupim
típica aldeia piscatória, formada em meados dos anos 30 por pescadores oriundos da Praia da Vieira (Marinha Grande), que sazonalmente vinham ao Tejo fazer as campanhas de pesca de inverno, sobretudo o sável, procurando no Tejo o sustento das suas numerosas famílias, num Tejo rico em pescado, regressando à Praia da Vieira no Verão. Muitos destes pescadores foram ficando pelas margens do Tejo, deixando de ir à sua Praia da Vieira, e assim formaram pequenas povoações piscatórias aos longo do rio. Nestas povoações as habitações são feitas em madeira, pintadas de cores vivas e assentes em estacaria, de modo a estarem protegidas das frequentes cheias do rio.
A peculiaridade das suas casas é extensiva aos seus barcos de pesca, também em madeira e pintados de cores vivas. Em Escaroupim, Câmara Municipal criou um museu – Casa Típica Avieira – cuja origem resulta das recolhas efectuadas pela autarquia junto da população local, com o intuito de preservar a memória colectiva destes pescadores que um dia deixaram Vieira de Leira e se fixaram nas margens do Rio Tejo.
O escritor e pai do neo-realismo – Alves Redol definiu estes grupo de pescadores como “ciganos do rio”, pois eles representam uma das mais interessantes migrações que Portugal assistiu, durante os meses do Inverno famílias de pescadores, deslocavam-se de Vieira de Leira para o Rio Tejo, para pescar o sável, no princípio do verão voltavam novamente à sua terra natal, para pescar no mar.
A Casa Típica Aviera é de pequenas dimensões, pintada com cores vivas, assente em pilares devido às cheias do Tejo, o acesso é feito por umas escadas, no interior destacam-se três espaços: a cozinha onde o elemento que mais se destaca é a lareira ladeada por tijolos e cheia com terra batida, a mesa das refeições e várias prateleiras completam esta divisão, a sala é a outra divisão onde estão dois baús para guardar roupa, neste espaço dois manequins envergam os trajes típicos dos avieiros, a última divisão são os dois quartos de pequenas dimensões com camas em ferro, por cima dos quartos uma última divisão que serve de sótão para guardarem os materiais relacionados com a pesca.
Contactados alguns pescadores que estavam junto dos seus barcos, como corre a pesca da enguia, atendendo que estamos no seu mês as respostas, foram unânimes- é proibido pescas, não as podemos pescar, apesar de muitos de nós arriscarem”. Fica a dúvida afinal de onde provém tantas toneladas de enguias que se comem neste mês, nos restaurantes do concelho? Terão alguma coisa a esconder? A União Europeia quer proibir a sua pesca, mas de verdade a maior parte da enguia é pescada no rio Tejo, em muitos casos ainda através do lançamento tradicional de redes. O ciclo de vida da enguia inclui uma fase continental e uma fase oceânica. A espécie passa quase toda a sua vida em águas costeiras ou continentais, antes de migrar para o mar dos Sargaços, onde se repoduz, e, segundo se pensa, morre. A fase continental inicia-se com a enguia de vidro (angula ou meixão), quando entra nos estuários, e termina com a enguia prateada, que migra para o local de reprodução para desovar. Entre uma e outra fase existem as enguias amarelas (fase de crescimento), que permanecem por tempo variável na massa de água continental, algumas em sistemas marinhos.
Mas Salvaterra a nível piscícola não é só enguia e a sua gastronomia rica, na cozinha tradicional da zona de Salvaterra de Magos não se resume à enguia. Outros peixes do Tejo, como o sável, a saboga, a fataça e a lampreia dão sabor a outros pratos que se encontram um pouco por toda a borda d’água. O torricado de bacalhau é outra receita típica da lezíria que ainda pode ser degustada, bem como as suas carnes da “charneca e lezíria” de gado bovino. E, para acompanhar, há ainda os bons vinhos tintos e brancos que se produzem no concelho.
António Freitas