O amor a Portugal de todos aqueles que um dia emigraram nunca esteve em causa, mas o nosso jornal foi testemunha ao longo da sua história de actos que ultrapassam tudo o que se possa imaginar.
Assim aconteceu, por exemplo, em 1975 quando um grupo de trabalhadores portugueses da Baixa Saxónia (Alemanha) entregaram um donativo ao Ministério do Trabalho através do nosso jornal.
O novo regime democrático conhecia então algumas dificuldades para se impor nomeadamente no campo da economia, daí que estes trabalhadores tenham juntado um pouco mais de 40 contos (hoje seriam 200 €, mas na época era uma pequena fortuna) para entregar ao estado português afirmando: “Nós emigrantes estamos conscientes de que temos de trabalhar muito, pois só assim conseguiremos realizar o nosso sonho de viver e trabalhar na nossa Pátria, sem sermos obrigados a abandonar as nossas famílias, os nossos costumes e o cantinho onde nascemos”.
Nesta altura a fé a confiança no novo regime era inabalável e as palavras dos que contribuíram com este donativo testemunhavam isto mesmo “Temos fé de que unidos ajudaremos o MFA (Movimento das Forças Armadas) e o novo governo a atingir a meta desejada de todo o Povo Português, pois só a união e livre vontade de todos conseguirá aniquilar toda a obra fascista que durante tantos anos roubou a liberdade do nosso Povo”.
E bem se podia dizer que era um amor recíproco, já que o novo regime cedo percebeu que as remessas dos emigrantes seriam vitais, para que Portugal não viesse a cair na bancarota, como de facto não aconteceu.
A sociedade portuguesa começava pela primeira vez a perceber o que tinha realmente significado para o país a emigração. A Obra Católica das Migrações revelava a dimensão humana do fenómeno dando a conhecer que entre 1960 e 1972 tinham emigrado legalmente mais de 114 mil famílias, o que junto à emigração ilegal daria um total de 150 mil famílias e perto de meio milhão de cidadãos.
Pela primeira vez também era possível conhecer algumas realidades da emigração portuguesa, até então abafadas pela censura que se fazia sentir sobre o nosso jornal. Ficou-se a saber por exemplo, que mais de 90 por cento dos filhos dos emigrantes não aprendiam o português elementar. Segundo dados fornecidos pela Direcção Geral do Ensino Básico até ao 25 de Abril apenas tinham sido criados 479 cursos de português para uma população escolar superior a 150 mil alunos só na Europa. Também neste campo o trabalho das missões católicas se fez sentir e foi bastante importante, pois muitas vezes colmatou, até no plano cultural, estas falhas junto da nossa comunidade emigrante.
Também da Holanda chegava mais uma contribuição de 3250 florins através da “Casa dos Portugueses” e da Associação “Os Lusitanos”. Segundo Alberto Roxo Fernandes, trabalhados da KLM e que fez a entrega do donativo, “os emigrantes querem mostrar o seu apoio ao Governo e ao Movimento das Forças Armadas, confiando no novo Portugal, para o qual também desejam contribuir”.
Portugal estava nesta época à beira da realização das primeiras eleições livres desde que em 1926 a I República foi substituída pelo Estado Novo. Era pois natural que o povo português se sentisse um pouco confuso com a realização de um acto cívico por que muitos nunca tinham passado. Foi mais uma área onde o nosso jornal prestou um serviço muito importante, aconselhando, esclarecendo, motivando, em suma levando até aos emigrantes a possibilidade de participar activamente neste acto cívico no seu país, apesar da distância.
Recorde-se que nestas primeiras eleições, a lei conferia o direito de voto apenas ao emigrante que tivesse a mulher ou os filhos em Portugal, ou estando a família reunida, desde que não estivessem há mais de cinco anos no estrangeiro. O Emigrante/Mundo Português dava a conhecer em primeira mão os candidatos dos diversos partidos à Assembleia Constituinte pela emigração: João Tito de Morais (PS), José Teodoro Jesus da Silva (PPD), João Canossa (PPM), António Macedo Varela (MDP/CDE), Eduardo José Valente (FEC-ML) e Nelson da Silva (CDS/PDC) e aconselhava os seus leitores a escolher o partido que melhor defendesse os seus interesses e que lutasse pela liberdade e pela verdadeira democracia no Portugal renovado.
Apesar de tudo a situação dos emigrantes não conhecia grandes avanços. Em França por exemplo, o próprio cardeal François Marty escrevia na revista “Présence et Dialogue” um longo artigo sobre os direitos dos emigrantes afirmando que eram tratados como simples residentes de passagem, embora fossem fundamentais para o desenvolvimento da economia francesa, esta posição reflectia um pouco a nova doutrina social da Igreja sobre emigração perante a constatação das injustiças cometidas sobre os emigrantes e suas famílias em matéria de direitos sociais e que por tal viria a ter um imenso e importante papel junto destes trabalhadores.