OPINIÃO
Oito meses depois de ter perdido cerca de 80% da sua área florestal, nos incêndios de outubro no ano passado, o pinhal de Leiria continua à espera de um plano de reflorestação concluído e aprovado.
A Comissão Técnica criada pelo Governo já prometeu um relatório final das propostas de recuperação da área ardida para o próximo mês de setembro, vário grupos de voluntários, empresas e autarquias têm vindo a desenvolver ações pontuais de plantação de árvores, mas para o movimento cívico “O Pinha é Nosso”, o trabalho de revitalização da Mata Nacional de Leiria ainda “está muito atrasada”.
“Boa parte da madeira está por cortar, já estão a nascer novos pinheiros e, quando se forem fazer os cortes, a movimentação de máquinas e de trabalhadores vai estragar a reflorestação natural”, afirmou ao Mundo Português, Ricardo Vicente, na qualidade de porta-voz do movimento.
Os últimos dados apresentados pelo presidente do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), Rogério Rodrigues, revelam que, nos últimos meses, foi rearborizada uma área de 387,7 hectares, o que corresponde à plantação de mais de meio milhão de árvores, de diversas espécies florestais: pinheiros, sobreiros, choupos, castanheiros, carvalhos, faias e plátanos.
Sem pôr em causa a importância destas ações, quer do ponto de vista florestal quer do ponto de vista de sensibilização social, Ricardo Vicente, que é engenheiro agrónomo de profissão, mostra, no entanto, algumas reservas em relação aos efeitos futuros destas iniciativas.
“Há decisões que têm de ser tomadas (em relação ao futuro do pinhal de Leiria) e não são compatíveis com reflorestações pontuais”, sublinhou o especialista, especificando por exemplo, que se a ideia for apostar na produção florestal, será feito um tipo de reflorestação; se por outro lado se pretender dar mais multifuncionalidade à mata, a rearborização terá de obedecer a outros critérios.
Para Ricardo Vicente, o esforço que tem sido feito com as ações pontuais de reflorestação” teria sido melhor aplicado nos 1500 hectares que não arderam”. “Teria mais lógica do ponto de vista de gestão de recursos”, defendeu, chamando a atenção para os 14% da área não ardida, que na sua opinião “continua a ser muito maltratada” e sem a necessária “gestão de combustível” para prevenir futuros incêndios.
Com assento no Observatório Local (criado para acompanhar os trabalhos de florestação do pinhal de Leiria), o porta-voz do movimento “O Pinhal é Nosso” lamentou ainda não ter sido dado o “tratamento adequado” para evitar a erosão dos solos e a infiltração das cinzas nos lençóis freáticos nas áreas atingidas pelo incêndio de 15 de outubro de 2017.
“Junto à Lagoa de Ervideira (no concelho de Leiria) ardeu tudo, não foi feito nada para conter as cinzas, que foram parar à lagoa. E isto passa-se não só no pinhal de Leiria, mas em todo o pinhal interior” fustigado pelos fogos de verão passado, disse Ricardo Vicente.
Os incêndios de outubro causaram a morte a 50 pessoas na Região Centro e destruíram total ou parcialmente cerca de 1500 casas e mais de 500 empresas. Na Marinha Grande, entre outros danos, arderam 80% do Pinhal de Leiria, que é propriedade do Estado, tem 11 062 hectares e ocupa dois terços do concelho.
Orlando Fernandes
JORNALISTA