O sucesso alcançado ao longo dos trinta anos de atividade, fez com que hoje em dia a ARTESANALPESCA, uma cooperativa de armadores de pesca, seja responsável pela captura de 90% do Peixe-Espada Preto, capturado em Portugal Continental. Com 70 funcionários diretos e meia centena de embarcações associadas, a sua atividade acaba por relacionar um total superior a 400 pessoas.
Entrevista com o administrador CARLOS MACEDO
Afinal ainda vai havendo pesca, apesar de se falar muito do fim da atividade em Portugal…
Vai havendo e não é tão pouco como nos querem fazer crer. A verdade é que se fala muitas vezes da influência do setor no PIB, mas esquece-se da influência noutras áreas a montante e a jusante, como a comercialização, os transportes e a própria venda no retalho.
Mas pode dizer-se que a pesca continua a ser importante no contexto local como foi outrora?
A pesca nunca deixou de ser importante em Sesimbra, é mesmo a sua matriz identitária. Claro que já não tem o mesmo peso económico de outros tempos, ainda assim a importância do setor sócio-económico continua a ser de extrema importância para a “concha” de Sesimbra. A ARTESANALPESCA continua a ser o maior empregador privado aqui na freguesia de S. Tiago e Castelo.
Quantos associados e embarcações têm neste momento?
Temos cerca de 40 associados, sendo que cada um representa uma embarcação. Umas maiores e outras mais pequenas, dentro da classe de pesca artesanal.
São cerca de 46 embarcações de diferentes dimensões mas de pesca artesanal. As maiores, em número de nove, são aquelas que nós chamamos de “traineiras”, que capturam sardinha, carapau e cavala. Outro tipo de embarcação são os “palangreiros” que se dedicam à pesca do peixe espada preto, e são nove. Os restantes são pequenas embarcações para a pesca do polvo.
O que fazem agora os associados das traineiras, estando impedidos de pescar sardinha?
Dedicam-se à captura de outras espécies como o carapau e a cavala. Há uns anos eram espécies de menor valia, comparativamente à sardinha, e por isso, não tinham mercado, mas hoje em dia é bastante diferente. Tudo o que os nossos associados pescam nós temos mercado, porque foi feito um trabalho prévio de desenvolvimento desses mercados, para colocação do peixe português que não é absorvido pelo mercado nacional. E isto acontece porque há muito peixe que nos entra (via televisão) pela casa dentro, e que promove produtos menos saudáveis, e com outros custos ambientais, mas que chegam a Portugal a baixo preço, embora seja muito inferior ao nosso pescado. Apesar das campanhas enaltecendo o peixe português continuamos a consumir salmão criado em cativeiro, perca originária de um dos rios mais poluídos do mundo, peixes que vêm do rio Mekong no Vietname, e esse peixe não é melhor do que o nosso carapau e a nossa cavala. Todas estas razões levam a que o nosso peixe acabe por não se consumir no mercado nacional.
Qual é a vossa faturação em termos de mercado nacional e internacional?
Neste momento a nossa faturação para a exportação é cerca de 30% do total. A faturação deverá andar este ano nos 16 milhões de euros. Os principais mercados externos são os mercados africanos, Espanha e França também um pouco, isto para os pequenos pelágicos e o polvo, já que o peixe espada preto é todo consumido no mercado nacional.
Os barcos quando regressam da pesca entregam aqui o pescado para ser preparado?
Não é bem assim por causa da legislação portuguesa. A DOCAPESCA como entidade responsável pela primeira venda do pescado, obriga a que a primeira venda do pescado (peixe fresco) seja vendido por essa empresa de capitais públicos, através de um leilão. As embarcações associadas da Organização de Produrtores (OP) podem estabelecer contratos a um preço pré-definido. No nosso caso, a entidade compradora somos nós, a própria OP. Os armadores têm de pagar uma taxa de 3% à Docapesca e a cooperativa também paga outros 3%, por isso costumamos dizer, com uma certa graça, que o sistema nos obriga a pagar a “balança mais cara do país”
Qual vai ser o futuro do setor da pesca?
O setor precisa de investimento renovado até por causa do envelhecimento da frota. Hoje em dia apoiam-se barcos de recreio e embarcações de turismo, mas os da pesca artesanal não são apoiados. Outro grande problema é que a partir do tratado de Lisboa, o nosso país perdeu a autonomia das pescas que passaram a ser coordenadas exclusivamente por Bruxelas. Temos vindo a sofrer com um conjunto de restrições, que muitas vezes nada têm de ver com a nossa forma de fazer as coisas, mas da forma como se faz noutros sítios e que condiciona a nossa atividade.
O caso da sardinha é uma dessas situações?
Estamos a pescar apenas ao longo de metade do ano apesar de diversos especialistas afirmarem que está a haver um crescimento da biomassa em cerca de 30% no peixe que existe no mar. No entanto vamos pescar menos do que pescávamos no ano passado e esta impossibilidade de gerir aquilo que é nosso está a gerar fortes constrangimentos, é uma preocupação muito grande e cria algumas reticências para o futuro.
É mesmo verdade que o peixe português é o melhor? Há razões que expliquem esta afirmação?
Daquilo que eu conheço, acho que é realmente o melhor e isso tem muito que ver com a temperatura das nossas águas, que determina o tipo de alimento para as nossas espécies.
Quem está a “alimentar o mundo” em peixe, são espécies de águas mais quentes, nomeadamente asiáticas e africanas. O que em termos de consistência as torna muitos diferentes das nossas, genericamente de muito boa qualidade. Temos é de valorizar mais as nossas espécies. Ainda me recordo do carapau ser uma espécie muito valorizada, até mais do que a sardinha, e hoje é muito pouco consumido pelos portugueses.