Heranças, testamentos e sucessões na lei portuguesa

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Esta é das questões que mais dúvidas levanta aos nossos leitores. O que deixamos aqui é a disposição legal sobre a matéria sobre a matéria recolhida no código civil e que pode esclarecer num primeiro momento as dúvidas que a questão podem suscitar.

DIREITO DAS SUCESSÕES

ARTIGO 2024º
(Noção)
Diz-se sucessão o chamamento de uma ou mais pessoas à titularidade das relações jurídicas
patrimoniais de uma pessoa falecida e a consequente devolução dos bens que a esta pertenciam.

ARTIGO 2025º
(Objecto da sucessão)
1. Não constituem objecto de sucessão as relações jurídicas que devam extinguir-se por morte do
respectivo titular, em razão da sua natureza ou por força da lei.
2. Podem também extinguir-se à morte do titular, por vontade deste, os direitos renunciáveis.

ARTIGO 2026º
(Títulos de vocação sucessória)
A sucessão é deferida por lei, testamento ou contrato.

ARTIGO 2027º
(Espécies de sucessão legal)
A sucessão legal é legítima ou legitimária, conforme possa ou não ser afastada pela vontade do seu
autor.

ARTIGO 2028º
(Sucessão contratual)
1. Há sucessão contratual quando, por contrato, alguém renúncia à sucessão de pessoa viva, ou
dispõe da sua própria sucessão ou da sucessão de terceiro ainda não aberta.
2. Os contratos sucessórios apenas são admitidos nos casos previstos na lei, sendo nulos todos os
demais, sem prejuízo no disposto no nº 2 do artigo 946º.

ARTIGO 2029º
(Partilha em vida)
1. Não é havido por sucessório o contrato pelo qual alguém faz doação entre vivos, com ou sem
reserva de usufruto, de todos os seus bens ou parte deles a algum ou alguns dos presumidos
herdeiros legitimários, com o consentimento dos outros, e os donatários pagam ou se obrigam a
pagar a estes o valor das partes que proporcionalmente lhes tocariam nos bens doados.
2. Se sobrevier ou se tornar conhecido outro presumido herdeiro legitimário, pode este exigir que
lhe seja composta em dinheiro a parte correspondente.
3. As tornas em dinheiro, quando não sejam logo efectuados os pagamentos, estão sujeitas a
actualização nos termos gerais.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2030º
(Espécie de sucessores)
1. Os sucessores são herdeiros ou legatários.
2. Diz-se herdeiro o que sucede na totalidade ou numa quota do património do falecido e legatário o
que sucede em bens ou valores determinados.
3. É havido como herdeiro o que sucede no remanescente dos bens do falecido, não havendo
especificação destes.
4. O usufrutuário, ainda que o seu direito incida sobre a totalidade do património, é havido como
legatário.
5. A qualificação dada pelo testador aos seus sucessores não lhes confere o título de herdeiro ou
legatário em contravenção do disposto nos números anteriores.

CAPÍTULO II
Abertura da sucessão e chamamento
dos herdeiros e legatários
SECÇÃO I
Abertura da sucessão

ARTIGO 2031º
(Momento e lugar)
A sucessão abre-se no momento da morte do seu autor e no lugar do último domicílio dele.

ARTIGO 2032º
(Chamamento de herdeiros e legatários)
1. Aberta a sucessão, serão chamados à titularidade das relações jurídicas do falecido aqueles que
gozam de prioridade na hierarquia dos sucessíveis, desde que tenham a necessária capacidade.
2. Se os primeiros sucessíveis não quiserem ou não puderem aceitar, serão chamados os
subsequentes, e assim sucessivamente; a devolução a favor dos últimos retrotrai-se ao momento da
abertura da sucessão.

SECÇÃO II
Capacidade sucessória

ARTIGO 2033º
(Princípios gerais)
1. Têm capacidade sucessória, além do Estado, todas as pessoas nascidas ou concebidas ao tempo
da abertura da sucessão, não exceptuadas por lei.
2. Na sucessão testamentária ou contratual têm ainda capacidade:
a) Os nascituros não concebidos, que sejam filhos de pessoa determinada, viva ao tempo da abertura
da sucessão;
b) As pessoas colectivas e as sociedades.

ARTIGO 2034º
(Incapacidade por indignidade)
Carecem de capacidade sucessória, por motivo de indignidade:
a) O condenado como autor ou cúmplice de homicídio doloso, ainda que não consumado, contra o
autor da sucessão ou contra o seu cônjuge, descendente, ascendente, adoptante ou adoptado;
b) O condenado por denúncia caluniosa ou falso testemunho contra as mesmas pessoas,
relativamente a crime a que corresponda pena de prisão superior a dois anos, qualquer que seja a
sua natureza;
c) O que por meio de dolo ou coacção induziu o autor da sucessão a fazer, revogar ou modificar o
testamento, ou disso o impediu;
d) O que dolosamente subtraíu, ocultou, inutilizou, falsificou ou suprimiu o testamento, antes ou
depois da morte do autor da sucessão, ou se aproveitou de algum desses factos.

ARTIGO 2035º
(Momento da condenação e do crime)
1. A condenação a que se referem as alíneas a) e b) do artigo anterior pode ser posterior à abertura
da sucessão, mas só o crime anterior releva para o efeito.
2. Estando dependente de condição suspensiva a instituição de herdeiro ou a nomeação de legatário,
é relevante o crime cometido até à verificação da condição.

ARTIGO 2036º
(Declaração de indignidade)
A acção destinada a obter a declaração de indignidade pode ser intentada dentro do prazo de dois
anos a contar da abertura da sucessão, ou dentro de um ano a contar, quer da condenação pelos
crimes que a determinam, quer do conhecimento das causas de indignidade previstas nas alíneas c)
e d) do artigo 2034º.

ARTIGO 2037º
(Efeitos da indignidade)
1. Declarada a indignidade, a devolução da sucessão ao indigno é havida como inexistente, sendo
ele considerado, para todos os efeitos, possuidor de má fé dos respectivos bens.
2. Na sucessão legal, a capacidade do indigno não prejudica o direito de representação dos seus
descendentes.

ARTIGO 2038º
(Reabilitação do indigno)
1. O que tiver incorrido em indignidade, mesmo que esta já tenha sido judicialmente declarada,
readquire a capacidade sucessória, se o autor da sucessão expressamente o reabilitar em testamento
ou escritura pública.
2. Não havendo reabilitação expressa, mas sendo o indigno contemplado em testamento quando o
testador já conhecia a causa da indignidade, pode ele suceder dentro dos limites da disposição
testamentária

SECÇÃO III
Direito de representação

ARTIGO 2039º
(Noção)
Dá-se a representação sucessória, quando a lei chama os descendentes de um herdeiro ou legatário a
ocupar a posição daquele que não pôde ou não quis aceitar a herança ou o legado.
ARTIGO 2040º
(Âmbito da representação)
A representação tanto se dá na sucessão legal como na testamentária, mas com as restrições
constantes dos artigos seguintes.

ARTIGO 2041º
(Representação na sucessão testamentária)
1. Gozam do direito de representação na sucessão testamentária os descendentes do que faleceu
antes do testador ou do que repudiou a herança ou o legado, se não houver outra causa de
caducidade da vocação sucessória.
2. A representação não se verifica:
a) Se tiver sido designado substituto ao herdeiro ou legatário;
b) Em relação ao fideicomissário, nos termos do nº 2 do artigo 2293º;
c) No legado de usufruto ou de outro direito pessoal.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2042º
(Representação na sucessão legal)
Na sucessão legal, a representação tem sempre lugar, na linha recta, em benefício dos descendentes
de filho do autor da sucessão e, na linha colateral, em benefício dos descendentes de irmão do
falecido, qualquer que seja, num caso ou noutro, o grau de parentesco.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2043º
(Representação nos casos de repúdio e incapacidade)
Os descendentes representam o seu ascendente, mesmo que tenham repudiado a sucessão destes ou
sejam incapazes em relação a ele.

ARTIGO 2044º
(Partilha)
1. Havendo representação, cabe a cada estirpe aquilo em que sucederia o ascendente respectivo.
2. Do mesmo modo se procederá para o efeito da subdivisão, quando a estirpe compreenda vários
ramos.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2045º
(Extensão da representação)
A representação tem lugar, ainda que todos os membros das várias estirpes estejam, relativamente
ao autor da sucessão, no mesmo grau de parentesco, ou exista uma só estirpe.

CAPÍTULO III
Herança jacente

ARTIGO 2046º
Noção)
Diz-se jacente a herança aberta, mas ainda não aceita nem declarada vaga para o Estado.

ARTIGO 2047º
(Administração)
1. O sucessível chamado à herança, se ainda não tiver aceitado nem repudiado, não está inibido de
providenciar acerca da administração dos bens, se do retardamento das providências puderem
resultar prejuízos.
2. Sendo vários os herdeiros, é lícito a qualquer deles praticar os actos urgentes de administração;
mas, se houver oposição de algum, prevalece a vontade do maior número.
3. O disposto neste artigo não prejudica a possibilidade de nomeação de curador à herança.

ARTIGO 2048º
(Curador da herança jacente)
1. Quando se torne necessário, para evitar a perda ou deterioração dos bens, por não haver quem
legalmente os administre, o tribunal nomeará curador à herança jacente, a requerimento do
Ministério Público ou de qualquer interessado.
2. À curadoria da herança é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto sobre a curadoria
provisória dos bens do ausente.
3. A curadoria termina logo que cessem as razões que a determinaram.

ARTIGO 2049º
(Notificação dos herdeiros)
1. Se o sucessível chamado à herança, sendo conhecido, a não aceitar nem a repudiar dentro dos
quinze dias seguintes, pode o tribunal, a requerimento do Ministério Público ou de qualquer
interessado, mandá-lo notificar para, no prazo que lhe for fixado, declarar se a aceita ou repudia.
2. Na falta de declaração de aceitação, ou não sendo apresentado documento legal de repúdio dentro
do prazo fixado, a herança tem-se por aceite
3. Se o notificado repudiar a herança, serão notificados, sem prejuízo do disposto no artigo 2067º,
os herdeiros imediatos, e assim sucessivamente até não haver quem prefira a sucessão do Estado.

CAPÍTULO IV
Aceitação da herança

ARTIGO 2050º
(Efeitos)
1. O domínio e posse dos bens da herança adquirem-se pela aceitação, independentemente da sua
apreensão material.
2. Os efeitos da aceitação retrotraem-se ao momento da abertura da sucessão.

ARTIGO 2051º
(Pluralidade de sucessíveis)
Sendo vários os sucessíveis, pode a herança ser aceita por algum ou alguns deles e repudiada pelos
restantes.

ARTIGO 2052º
(Espécies de aceitação)
1. A herança pode ser aceita pura e simplesmente ou a benefício de inventário.
2. Têm-se como não escritas as cláusulas testamentárias que, directa ou indirectamente, imponham
uma ou outra espécie de aceitação.

ARTIGO 2053º
(Aceitação a benefício de inventário)
A aceitação a benefício de inventário faz-se requerendo inventário judicial, nos termos da lei de
processo, ou intervindo em inventário pendente.
(Redacção do Dec.-Lei 227/94, de 8-9)

ARTIGO 2054º
(Aceitação sob condição, a termo ou parcial)
1. A herança não pode ser aceita sob condição nem a termo.
2. A herança também não pode ser aceita só em parte, salvo o disposto no artigo seguinte.

ARTIGO 2055º
(Devolução testamentária e legal)
1. Se alguém é chamado à herança, simultânea ou sucessivamente, por testamento e por lei, e a
aceita ou repudia por um dos títulos, entende-se que a aceita ou repudia igualmente pelo outro; mas
pode aceitá-la ou repudiá-la pelo primeiro, não obstante a ter repudiado ou aceitado pelo segundo,
se ao tempo ignorava a existência do testamento.
2. O sucessível legitimário que também é chamado à herança por testamento pode repudiá-la quanto
à quota disponível e aceitá-la quanto à legítima.

ARTIGO 2056º
(Formas de aceitação)
1. A aceitação pode ser expressa ou tácita.
2. A aceitação é havida como expressa quando nalgum documento escrito o sucessível chamado à
herança declara aceitá-la ou assume o título de herdeiro com a intenção de a adquirir.
3. Os actos de administração praticados pelo sucessível não implicam aceitação tácita da herança.

ARTIGO 2057º
(Caso de aceitação tácita)
1. Não importa aceitação a alienação da herança, quando feita gratuitamente em benefício de todos
aqueles a quem ela caberia se o alienante a repudiasse.
2. Entende-se, porém, que aceita a herança e a aliena aquele que declara renunciar a ela, se o faz a
favor apenas de algum ou alguns dos sucessíveis que seriam chamados na sua falta.

ARTIGO 2058º
(Transmissão)
1. Se o sucessível chamado à herança falecer sem a haver aceitado ou repudiado, transmite-se aos
seus herdeiros o direito de a aceitar ou repudiar.
2. A transmissão só se verifica se os herdeiros aceitarem a herança do falecido, o que os não impede
de repudiar, querendo, a herança a que este fora chamado.

ARTIGO 2059º
(Caducidade)
1. O direito de aceitar a herança caduca ao fim de dez anos, contados desde que o sucessível tem
conhecimento de haver sido a ela chamado.
2. No caso de instituição sob condição suspensiva, o prazo conta-se a partir do conhecimento da
verificação da condição; no caso de substituição fideicomissária, a partir do conhecimento da morte
do fiduciário ou da extinção da pessoa colectiva.

ARTIGO 2060º
(Anulação por dolo ou coacção)
A aceitação da herança é anulável por dolo ou coacção, mas não com fundamento em simples erro.

ARTIGO 2061º
(Irrevogabilidade)
A aceitação é irrevogável.

CAPÍTULO V
Repúdio da herança

ARTIGO 2062º
(Efeitos do repúdio)
Os efeitos do repúdio da herança retrotraem-se ao momento da abertura da sucessão, considerandose
como não chamado o sucessível que a repudia, salvo para efeitos de representação.

ARTIGO 2063º
(Forma)
O repúdio está sujeito à forma exigida para a alienação da herança.

ARTIGO 2064º
(Repúdio sob condição, a termo ou parcial)
1. A herança não pode ser repudiada sob condição nem a termo.
2. A herança também não pode ser repudiada só em parte salvo o disposto no artigo 2055º.

ARTIGO 2065º
(Anulação por dolo ou coacção)
O repúdio da herança é anulável por dolo ou coacção, mas não com fundamento em simples erro.

ARTIGO 2066º
(Irrevogabilidade)
O repúdio é irrevogável.

ARTIGO 2067º
(Sub-rogação dos credores)
1. Os credores do repudiante podem aceitar a herança em nome dele, nos termos dos artigos 606º e
seguintes.
2. A aceitação deve efectuar-se no prazo de seis meses, a contar do conhecimento do repúdio.
3. Pagos os credores do repudiante, o remanescente da herança não aproveita a este, mas aos
herdeiros imediatos.

CAPÍTULO VI
Encargos da herança

ARTIGO 2068º
(Responsabilidade da herança)
A herança responde pelas despesas com o funeral e sufrágios do seu autor, pelos encargos com a
testamentaria, administração e liquidação do património hereditário, pelo pagamento das dívidas do
falecido e pelo cumprimento dos legados.

ARTIGO 2069º
(Âmbito da herança)
Fazem parte da herança:
a) Os bens sub-rogados no lugar de bens da herança por meio de troca directa;
b) O preço dos alienados;
c) Os bens adquiridos com dinheiro ou valores da herança, desde que a proveniência do dinheiro ou
valores seja devidamente mencionada no documento de aquisição;
d) Os frutos percebidos até à partilha.

ARTIGO 2070º
(Preferências)
1. Os credores da herança e os legatários gozam de preferência sobre os credores pessoais do
herdeiro, e os primeiros sobre os segundos.
2. Os encargos da herança são satisfeitos segundo a ordem por que vêm indicados no artigo 2068º.
3. As preferências mantêm-se nos cinco anos subsequentes à abertura da sucessão ou à constituição
da dívida, se esta é posterior, ainda que a herança tenha sido partilhada; e prevalecem mesmo
quando algum credor preterido tenha adquirido garantia real sobre os bens hereditários.

ARTIGO 2071º
(Responsabilidade do herdeiro)
1. Sendo a herança aceita a benefício de inventário, só respondem pelos encargos respectivos os
bens inventariados, salvo se os credores ou legatários provarem a existência de outros bens.
2. Sendo a herança aceita pura e simplesmente, a responsabilidade pelos encargos também não
excede o valor dos bens herdados, mas incumbe, neste caso, ao herdeiro provar que na herança não
existem valores suficientes para cumprimento dos encargos.

ARTIGO 2072º
(Responsabilidade do usufrutuário)
1. O usufrutuário da totalidade ou de uma quota do património do falecido pode adiantar as somas
necessárias, conforme os bens que usufruir, para cumprimento dos encargos da herança, ficando
com o direito de exigir dos herdeiros, findo o usufruto, a restituição sem juros das quantias que
despendeu.
2. Se o usufrutuário não fizer o adiantamento das somas necessárias, podem os herdeiros exigir que
dos bens usufruídos se vendam os necessários para cumprimento dos encargos, ou pagá-los com
dinheiro seu, ficando neste último caso, com o direito de haver do usufrutuário os juros
correspondentes.

ARTIGO 2073º
(Legado de alimentos ou pensão vitalícia)
1. O usufrutuário da totalidade do património do falecido é obrigado a cumprir por inteiro o legado
de alimentos ou pensão vitalícia.
2. Incidindo o usufruto sobre uma quota-parte do património, o usufrutuário só em proporção dessa
quota é obrigado a contribuir para o cumprimento do legado de alimentos ou pensão vitalícia.
3. O usufrutuário de coisas determinadas não é obrigado a contribuir para os sobreditos alimentos
ou pensão, se o encargo lhe não tiver sido imposto expressamente.

ARTIGO 2074º
(Direitos e obrigações do herdeiro em relação à herança)
1. O herdeiro conserva, em relação à herança, até à sua integral liquidação e partilha, todos os
direitos e obrigações que tinha para com o falecido, à excepção dos que se extinguem por efeito da
morte deste.
2. São imputadas na quota do herdeiro as quantias em dinheiro de que ele é devedor à herança.
3. Se houver necessidade de fazer valer em juízo os direitos e obrigações do herdeiro, e este for o
cabeça-de-casal, será nomeado à herança, para esse fim, um curador especial.

CAPÍTULO VII
Petição da herança

ARTIGO 2075º
(Acção de petição)
1. O herdeiro pode pedir judicialmente o reconhecimento da sua qualidade sucessória, e a
consequente restituição de todos os bens da herança ou de parte deles, contra quem os possua como
herdeiro, ou por outro título, ou mesmo sem título.
2. A acção pode ser intentada a todo o tempo, sem prejuízo da aplicação das regras da usucapião
relativamente a cada uma das coisas possuídas, e do disposto no artigo 2059º.

ARTIGO 2076º
(Alienação a favor de terceiro)
1. Se o possuidor de bens da herança tiver disposto deles, no todo ou em parte, a favor de terceiro, a
acção de petição pode ser também proposta contra o adquirente, sem prejuízo da responsabilidade
do disponente pelo valor dos bens alienados.
2. A acção não procede, porém, contra terceiro que haja adquirido do herdeiro aparente, por título
oneroso e de boa fé, bens determinados ou quaisquer direitos sobre eles; neste caso, estando
também de boa fé, o alienante é apenas responsável segundo as regras do enriquecimento sem
causa.
3. Diz-se herdeiro aparente aquele que é reputado herdeiro por força de erro comum ou geral.

ARTIGO 2077º
(Cumprimento de legados)
1. Se o testamento for declarado nulo ou anulado depois do cumprimento de legados feito em boa
fé, fica o suposto herdeiro quite para com o verdadeiro herdeiro entregando-lhe o remanescente da
herança, sem prejuízo do direito deste último contra o legatário.
2. A precedente disposição é extensiva aos legados com encargos.

ARTIGO 2078º
(Exercício da acção por um só herdeiro)
1. Sendo vários os herdeiros, qualquer deles tem legitimidade para pedir separadamente a totalidade
dos bens em poder do demandado, sem que este possa opor-lhe que tais bens lhe não pertencem por
inteiro.
2. O disposto no número anterior não prejudica o direito que assiste ao cabeça-de-casal de pedir a
entrega dos bens que deva administrar, nos termos do capítulo seguinte.

CAPÍTULO VIII
Administração da herança

ARTIGO 2079º
(Cabeça-de-casal)
A administração da herança, até à sua liquidação e partilha, pertence ao cabeça-de-casal.

ARTIGO 2080º
(A quem incumbe o cargo)
1. O cargo de cabeça-de-casal defere-se pela ordem seguinte:
a) Ao cônjuge sobrevivo, não separado judicialmente de pessoas e bens, se for herdeiro ou tiver
meação nos bens do casal;
b) Ao testamenteiro, salvo declaração do testador em contrário;
c) Aos parentes que sejam herdeiros legais;
d) Aos herdeiros testamentários.
2. De entre os parentes que sejam herdeiros legais, preferem os mais próximos em grau.
3. De entre os herdeiros legais do mesmo grau de parentesco, ou de entre os herdeiros
testamentários, preferem os que viviam com o falecido há pelo menos um ano à data da morte.
4. Em igualdade de circunstâncias, prefere o herdeiro mais velho.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2081º
(Herança distribuída em legados)
Tendo sido distribuído em legados todo o património hereditário, servirá de cabeça-de-casal, em
substituição dos herdeiros, o legatário mais beneficiado; em igualdade de circunstâncias, preferirá o
mais velho.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2082º
(Incapacidade da pessoa designada)
1. Se o cônjuge, o herdeiro ou legatário que tiver preferência for incapaz, exercerá as funções de
cabeça-de-casal o seu representante legal.
2. O curador é tido como representante do inabilitado para o efeito do número anterior.

ARTIGO 2083º
(Designação pelo tribunal)
Se todas as pessoas referidas nos artigos anteriores se escusarem ou forem removidas, é o cabeçade-casal
designado pelo tribunal, oficiosamente, a requerimento de qualquer
interessado, ou a pedido do Ministério Público nos inventários em que tenha intervenção principal.
(Redacção do Dec.-Lei 227/94, de 8-9)

ARTIGO 2084º
(Designação por acordo)
As regras dos artigos precedentes não são imperativas; por acordo de todos os interessados, e do
Ministério Público, nos casos em que tenha intervenção principal, podem entregar-se a
administração da herança e o exercício das demais funções de cabeça-de-casal a qualquer outra
pessoa.
(Redacção do Dec.-Lei 227/94, de 8-9)

ARTIGO 2085º
(Escusa)
1. O cabeça-de-casal pode a todo o tempo escusar-se do cargo:
a) Se tiver mais de setenta anos de idade;
b) Se estiver impossibilitado, por doença, de exercer convenientemente as funções;
c) Se residir fora da comarca cujo tribunal é competente para o inventário;
d) Se o exercício das funções de cabeça-de-casal for incompatível com o desempenho de cargo
público que exerça.
2. O disposto neste artigo não prejudica a liberdade de aceitação da testamentaria e consequente
exercício das funções de cabeça-de-casal.

ARTIGO 2086º
(Remoção do cabeça-de-casal)
1. O cabeça-de-casal pode ser removido, sem prejuízo das demais sanções que no caso couberem:
a) se dolosamente ocultou a existência de bens pertencentes à herança ou de doações feitas pelo
falecido, ou se, também dolosamente, denunciou doações ou encargos inexistentes;
b) Se não administrar o património hereditário com prudência e zelo;
c) Se não cumpriu no inventário os deveres que a lei de processo lhe impuser;
d) Se revelar incompetência para o exercício do cargo.
2. Tem legitimidade para pedir a remoção qualquer interessado, ou o Ministério Público, quando
tenha intervenção principal.
(Redacção do Dec.-Lei 227/94, de 8-9)

ARTIGO 2087º
(Bens sujeitos à administração do cabeça-de-casal)
1. O cabeça-de-casal administra os bens próprios do falecido e, tendo este sido casado em regime de
comunhão, os bens comuns do casal.
2. Os bens doados em vida pelo autor da sucessão não se consideram hereditários e continuam a ser
administrados pelo donatário.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2088º
(Entrega de bens)
1. O cabeça-de-casal pode pedir aos herdeiros ou a terceiro a entrega dos bens que deva administrar
e que estes tenham em seu poder, e usar contra eles de acções possessórias a fim de ser mantido na
posse das coisas sujeitas à sua gestão ou a ela restituído.
2. O exercício das acções possessórias cabe igualmente aos herdeiros ou a terceiro contra o cabeçade-casal.

ARTIGO 2089º
(Cobrança de dívidas)
O cabeça-de-casal pode cobrar as dívidas activas da herança, quando a cobrança possa perigar com
a demora ou o pagamento seja feito espontaneamente.

ARTIGO 2090º
(Venda de bens e satisfação de encargos)
1. O cabeça-de-casal deve vender os frutos ou outros bens deterioráveis, podendo aplicar o produto
na satisfação das despesas do funeral e sufrágios, bem como no cumprimento dos encargos da
administração.
2. Para satisfazer as despesas do funeral e sufrágios, bem como os encargos da administração, pode
o cabeça-de-casal vender os frutos não deterioráveis, na medida do que for necessário.

ARTIGO 2091º
(Exercício de outros direitos)
1. Fora dos casos declarados nos artigos anteriores, e sem prejuízo do disposto no artigo 2078º, os
direitos relativos à herança só podem ser exercidos conjuntamente por todos os herdeiros ou contra
todos os herdeiros.
2. O disposto no número anterior não prejudica os direitos que tenham sido atribuídos pelo testador
ao testamenteiro nos termos dos artigos 2327º e 2328º, sendo o testamenteiro cabeça-de-casal.

ARTIGO 2092º
(Entrega de rendimentos)
Qualquer dos herdeiros ou o cônjuge meeiro tem o direito de exigir que o cabeça-de-casal distribua
por todos até metade dos rendimentos que lhes caibam, salvo se forem necessários, mesmo nessa
parte, para satisfação de encargos da administração.

ARTIGO 2093º
(Prestação de contas)
1. O cabeça-de-casal deve prestar contas anualmente.
2. Nas contas entram como despesas ou rendimentos, entregues pelo cabeça-de-casal aos herdeiros
ou ao cônjuge meeiro nos termos do artigo anterior, e bem assim o juro do que haja gasto à sua
custa na satisfação de encargos da administração.
3. Havendo saldo positivo, é distribuído pelos interessados, segundo o seu direito, depois de
deduzida a quantia necessária para os encargos do novo ano.

ARTIGO 2094º
(Gratuidade do cargo)
O cargo de cabeça-de-casal é gratuito, sem prejuízo do disposto no artigo 2333º, se for exercido
pelo testamenteiro.

ARTIGO 2095º
(Intransmissibilidade)
O cargo de cabeça-de-casal não é transmissível em vida nem por morte.

ARTIGO 2096º
(Sonegação de bens)
1. O herdeiro que sonegar bens da herança, ocultando dolosamente a sua existência, seja ou não
cabeça-de-casal, perde em benefício dos co-herdeiros o direito que possa ter a qualquer parte dos
bens sonegados, além de incorrer nas mais sanções que forem aplicáveis.
2. O que sonegar bens da herança é considerado mero detentor desses bens.

CAPÍTULO IX
Liquidação da herança

ARTIGO 2097º
(Responsabilidade da herança indivisa)
Os bens da herança indivisa respondem colectivamente pela satisfação dos respectivos encargos.

ARTIGO 2098º
(Pagamento dos encargos após a partilha)

1. Efectuada a partilha, cada herdeiro só responde pelos encargos em proporção da quota que lhe
tenha cabido na herança.
2. Podem, todavia, os herdeiros deliberar que o pagamento se faça à custa de dinheiro ou outros
bens separados para esse efeito, ou que fique a cargo de algum ou alguns deles.
3. A deliberação obriga os credores e os legatários; mas, se uns ou outros não puderem ser pagos
integralmente nos sobreditos termos, têm recurso contra os outros bens ou contra os outros
herdeiros, nos termos gerais.

ARTIGO 2099º
(Remição de direitos de terceiro)
Se existirem direitos de terceiro, de natureza remível, sobre determinados bens da herança, e houver
nesta dinheiro suficiente, pode qualquer dos co-herdeiros ou o cônjuge meeiro exigir que esses
direitos sejam remidos antes de efectuada a partilha.

ARTIGO 2100º
(Pagamento dos direitos de terceiro)
1. Entrando os bens na partilha com os direitos referidos no artigo anterior, descontar-se-á neles o
valor desses direitos, que serão suportados exclusivamente pelo interessado a quem os bens
couberem.
2. Se não se fizer tal desconto, o interessado que pagar a remição tem regresso contra os outros pela
parte que a cada um tocar, em proporção do seu quinhão; mas, em caso de insolvência de algum
deles, é a sua parte repartida entre todos proporcionalmente.

CAPÍTULO X
Partilha da herança

SECÇÃO I
Disposições gerais

ARTIGO 2101º
(Direito de exigir partilha)
1. Qualquer co-herdeiro ou o cônjuge meeiro tem o direito de exigir partilha quando lhe aprouver.
2. Não pode renunciar-se ao direito de partilhar, mas pode convencionar-se que o património se
conserve indiviso por certo prazo, que não exceda cinco anos; é lícito renovar este prazo, uma ou
mais vezes, por nova convenção.

ARTIGO 2102º
(Forma)
1. A partilha pode fazer-se extrajudicialmente, quando houver acordo de todos os interessados, ou
por inventário judicial nos termos prescritos na lei de processo.
2. Procede-se ainda a inventário judicial quando o Ministério Público o requeira, por entender que o
interesse do incapaz a quem a herança é deferida implica aceitação beneficiária, e ainda nos casos
em que algum dos herdeiros não possa, por motivo de ausência em parte incerta ou de incapacidade
de facto permanente, outorgar em partilha extrajudicial.
(Redacção do Dec.-Lei 227/94, de 8-9)

ARTIGO 2103º
(Interessado único)
Havendo um único interessado, o inventário a que haja de proceder-se nos termos do nº 2 do artigo
anterior tem apenas por fim relacionar os bens e, eventualmente, servir de base à liquidação da
herança.

SECÇÃO II
Atribuições preferenciais
(Aditada pelo Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2103º-A
(Direito de habitação da casa de morada da família
e direito de uso do recheio)
1. O cônjuge sobrevivo tem direito a ser encabeçado, no momento da partilha, no direito de
habitação da casa de morada da família e no direito de uso do respectivo recheio, devendo tornas
aos co-herdeiros se o valor recebido exceder o da sua parte sucessória e meação, se a houver.
2. Salvo nos casos previstos no nº 2 do artigo 1093º, caducam os direitos atribuídos no número
anterior se o cônjuge não habitar a casa por prazo superior a um ano.
3. A pedido dos proprietários, pode o tribunal, quando o considere justificado, impor ao cônjuge a
obrigação de prestar caução.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2103º-B
(Direitos sobre o recheio)
Se a casa de morada da família não fizer parte da herança, observar-se-á, com as necessárias
adaptações, o disposto no artigo anterior relativamente ao recheio.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2103º-C
(Noção de recheio)
Para os efeitos do disposto nos artigos anteriores, considera-se recheio o mobiliário e demais
objectos ou utensílios destinados ao cómodo, serviço e ornamentação da casa.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

SECÇÃO III
Colação

ARTIGO 2104º
(Noção)
1. Os descendentes que pretendem entrar na sucessão do ascendente devem restituir à massa da
herança, para igualação da partilha, os bens ou valores que lhes foram doados por este: esta
restituição tem o nome de colação.
2. São havidas como doação, para efeitos de colação, as despesas referidas no artigo 2110º.

ARTIGO 2105º
(Descendentes sujeitos à colação)
Só estão sujeitos à colação os descendentes que eram à data da doação presuntivos herdeiros
legitimários do doador.

ARTIGO 2106º
(Sobre quem recai a obrigação)
A obrigação de conferir recai sobre o donatário, se vier a suceder ao doador, ou sobre os seus
representantes, ainda que estes não hajam tirado benefício da liberalidade.

ARTIGO 2107º
(Doações feitas a cônjuges)
1. Não estão sujeitos a colação os bens ou valores doados ao cônjuge do presuntivo herdeiro
legitimário.
2. Se a doação tiver sido feita a ambos os cônjuges, fica sujeita a colação apenas a parte do que for
presuntivo herdeiro.
3. A doação não se considera feita a ambos os cônjuges só porque entre eles vigora o regime da
comunhão geral.

ARTIGO 2108º
(Como se efectua a conferência)
1. A colação faz-se pela imputação do valor da doação ou da importância das despesas na quota
hereditária, ou pela restituição dos próprios bens doados, se houver acordo de todos os herdeiros.
2. Se não houver na herança bens suficientes para igualar todos os herdeiros, nem por isso são
reduzidas as doações, salvo se houver inoficiosidade.

ARTIGO 2109º
(Valor dos bens doados)
1. O valor dos bens doados é o que eles tiveram à data da abertura da sucessão.
2. Se tiverem sido doados bens que o donatário consumiu, alienou ou onerou, ou que pereceram por
sua culpa, atende-se ao valor que esses bens teriam na data da abertura da sucessão, se não fossem
consumidos, alienados ou onerados, ou não tivessem perecido.
3. A doação em dinheiro, bem como os encargos em dinheiro que a oneraram e foram cumpridos
pelo donatário, são actualizados nos termos do artigo 551º.

ARTIGO 2110º
(Despesas sujeitas e não sujeitas a colação)
1. Está sujeito a colação tudo quanto o falecido tiver despendido gratuitamente em proveito dos
descendentes.
2. Exceptuam-se as despesas com o casamento, alimentos, estabelecimento e colocação dos
descendentes, na medida em que se harmonizem com os usos e com a condição social e económica
do falecido.

ARTIGO 2111º
(Frutos)
Os frutos da coisa doada sujeita a colação, percebidos desde a abertura da sucessão, devem ser
conferidos.

ARTIGO 2112º
(Perda da coisa doada)
Não é objecto de colação a coisa doada que tiver perecido em vida do autor da sucessão por facto
não imputável ao donatário.

ARTIGO 2113º
(Dispensa da colação)
1. A colação pode ser dispensada pelo doador no acto da doação ou posteriormente.
2. Se a doação tiver sido acompanhada de alguma formalidade externa, só pela mesma forma, ou
por testamento, pode ser dispensada a colação.
3. A colação presume-se sempre dispensada nas doações manuais e nas doações remuneratórias.

ARTIGO 2114º
(Imputação na quota disponível)
1. Não havendo lugar à colação, a doação é imputada na quota disponível.
2. Se, porém, não houver lugar à colação pelo facto de o donatário repudiar a herança sem ter
descendentes que o representem, a doação é imputada na quota indisponível.

ARTIGO 2115º
(Benfeitorias nos bens doados)
O donatário é equiparado, quanto a benfeitorias, ao possuidor de boa fé, sendo-lhe aplicável, com as
necessárias adaptações, o disposto nos artigos 1273º e seguintes.

ARTIGO 2116º
(Deteriorações)
O donatário responde pelas deteriorações que culposamente tenha causado nos bens doados.

ARTIGO 2117º
(Doação de bens comuns)
1. Sendo a doação de bens comuns feita por ambos os cônjuges, conferir-se-á metade por morte de
cada um deles.
2. O valor de cada uma das metades é o que ela tiver ao tempo da abertura da sucessão respectiva.

ARTIGO 2118º
(Ónus real)
1. A eventual redução das doações sujeitas a colação constitui um ónus real.
2. Não pode fazer-se o registo de doação de bens imóveis sujeita a colação sem se efectuar,
simultaneamente, o registo do ónus.

SECÇÃO IV
Efeitos da partilha

ARTIGO 2119º
(Retroactividade da partilha)
Feita a partilha, cada um dos herdeiros é considerado, desde a abertura da herança, sucessor único
dos bens que lhe foram atribuídos, sem prejuízo do disposto quanto a frutos.

ARTIGO 2120º
(Entrega de documentos)
1. Finda a partilha, são entregues a cada um dos co-herdeiros os documentos relativos aos bens que
lhe couberem.
2. Os documentos relativos aos bens atribuídos a dois ou mais herdeiros são entregues ao que neles
tiver maior parte, com obrigação de os apresentar aos outros interessados, nos termos gerais.
3. Os documentos relativos a toda a herança ficam em poder do co-herdeiro que os interessados
escolherem, ou que o tribunal nomear na falta de acordo, com igual obrigação de os apresentar aos
outros interessados.

SECÇÃO V
Impugnação da partilha

ARTIGO 2121º
(Fundamento da impugnação)
A partilha extrajudicial só é impugnável nos casos em que o sejam os contratos.

ARTIGO 2122º
(Partilha adicional)
A omissão de bens da herança não determina a nulidade da partilha, mas apenas a partilha adicional
dos bens omitidos.

ARTIGO 2123º
(Partilha de bens não pertencentes à herança)
1. Se tiver recaído sobre bens não pertencentes à herança, a partilha é nula nessa parte, sendo-lhe
aplicável, com as necessárias adaptações e sem prejuízo do disposto no número seguinte, o
preceituado acerca da venda de bens alheios.
2. Aquele a quem sejam atribuídos os bens alheios é indemnizado pelos co-herdeiros na proporção
dos respectivos quinhões hereditários; se, porém, algum dos co-herdeiros estiver insolvente,
respondem os demais pela sua parte, na mesma proporção.

CAPÍTULO XI
Alienação de herança

ARTIGO 2124º
(Disposições aplicáveis)
A alienação de herança ou de quinhão hereditário está sujeita às disposições reguladoras do negócio
jurídico que lhe der causa, salvo o preceituado nos artigos seguintes.

ARTIGO 2125º
(Objecto)
1. Todo o benefício resultante da caducidade de um legado, encargo ou fideicomisso se presume
transmitido com a herança ou quota hereditária.
2. A parte hereditária devolvida ao alienante, depois da alienação, em consequência de fideicomisso
ou do direito de acrescer, presume-se excluída da disposição.
3. Presume-se igualmente excluídos da alienação os diplomas e a correspondência do falecido, bem
como as recordações de família de diminuto valor económico.

ARTIGO 2126º
(Forma)
1. A alienação de herança ou de quinhão hereditário será feita por escritura pública, se existirem
bens cuja alienação deva ser feita por essa forma.
2. Fora do caso previsto no número anterior, a alienação deve constar de documento particular.

ARTIGO 2127º
(Alienação de coisa alheia)
O que aliena uma herança ou quinhão hereditário sem especificação de bens só responde pela
alienação de coisa alheia se não vier a ser reconhecido como herdeiro.

ARTIGO 2128º
(Sucessão nos encargos)
O adquirente de herança ou de quinhão hereditário sucede nos encargos respectivos; mas o alienante
responde solidariamente por esses encargos, salvo o direito de haver do adquirente o reembolso
total do que assim houver despendido.

ARTIGO 2129º
(Indemnizações)
1. O alienante por título oneroso que tiver disposto de bens da herança é obrigado a entregar o
respectivo valor ao adquirente.
2. O adquirente a título oneroso ou gratuito é obrigado a reembolsar o alienante do que este tiver
despendido na satisfação dos encargos da herança e a pagar-lhe o que a herança lhe dever.
3. As disposições dos números anteriores são supletivas.

ARTIGO 2130º
(Direito de preferência)
1. Quando seja vendido ou dado em cumprimento a estranhos um quinhão hereditário, os coherdeiros
gozam do direito de preferência nos termos em que este direito assiste aos
comproprietários.
2. O prazo, porém, para o exercício do direito, havendo comunicação para a preferência, é de dois
meses.

TÍTULO II
DA SUCESSÃO LEGÍTIMA
CAPÍTULO I
Disposições gerais

ARTIGO 2131º
(Abertura da sucessão legítima)
Se o falecido não tiver disposto válida e eficazmente, no todo ou em parte, dos bens de que podia
dispor para depois da morte, são chamados à sucessão desses bens os seus herdeiros legítimos.

ARTIGO 2132º
(Categoria de herdeiros legítimos)
São herdeiros legítimos o cônjuge, os parentes e o Estado, pela ordem e segundo as regras
constantes do presente título.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2133º
(Classes de sucessíveis)
1. A ordem por que são chamados os herdeiros, sem prejuízo do disposto no título da adopção, é a
seguinte:
a) Cônjuge e descendentes;
b) Cônjuge e ascendentes;
c) Irmãos e seus descendentes;
d) Outros colaterais até ao quarto grau;
e) Estado.
2. O cônjuge sobrevivo integra a primeira classe de sucessíveis, salvo se o autor da sucessão falecer
sem descendentes e deixar ascendentes, caso em que integra a segunda classe.
3. O cônjuge não é chamado à herança se à data da morte do autor da sucessão se encontrar
divorciado ou separado judicialmente de pessoas e bens, por sentença que já tenha transitado ou
venha a transitar em julgado, ou ainda se a sentença de divórcio ou separação vier a ser proferida
posteriormente àquela data, nos termos do nº 3 do artigo 1785º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2134º
(Preferência de classes)
Os herdeiros de cada uma das classes de sucessíveis preferem aos das classes imediatas.

ARTIGO 2135º
(Preferência de graus de parentesco)
Dentro de cada classe os parentes de grau mais próximo preferem aos de grau mais afastado.

ARTIGO 2136º
(Sucessão por cabeça
Os parentes de cada classe sucedem por cabeça ou em partes iguais, salvas as excepções previstas
neste código.

ARTIGO 2137º
(Ineficácia do chamamento)
1. Se os sucessíveis da mesma classe chamados simultaneamente à herança não puderem ou não
quiserem aceitar, são chamados os imediatos sucessores.
2. Se, porém, apenas algum ou alguns dos sucessíveis não puderem ou não quiserem aceitar, a sua
parte acrescerá à dos outros sucessíveis da mesma classe que com eles concorram à herança, sem
prejuízo do disposto no artigo 2143º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2138º
(Direito de representação)
O disposto nos três artigos anteriores não prejudica o direito de representação, nos casos em que
este tem lugar.

CAPÍTULO II
Sucessão do cônjuge e dos descendentes
(Epígrafe introduzida pelo Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2139º
(Regras gerais)
1. A partilha entre o cônjuge e os filhos faz-se por cabeça, dividindo-se a herança em tantas partes
quantos forem os herdeiros; a quota do cônjuge, porém, não pode ser inferior a uma quarta parte da
herança.
2. Se o autor da sucessão não deixar cônjuge sobrevivo, a herança divide-se pelos filhos em partes
iguais.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2140º
(Descendentes do segundo grau e seguintes)
Os descendentes dos filhos que não puderem ou não quiserem aceitar a herança são chamados à
sucessão nos termos do artigo 2042º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2141º
(Sucessão do cônjuge, na falta de descendentes)
Na falta de descendentes sucede o cônjuge, sem prejuízo do disposto no capítulo seguinte.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

CAPÍTULO III
Sucessão do cônjuge e dos ascendentes

ARTIGO 2142º
(Regras gerais)
1. Se não houver descendentes e o autor da sucessão deixar cônjuge e ascendentes, ao cônjuge
pertencerão duas terças partes e aos ascendentes uma terça parte da herança.
2. Na falta de cônjuge, os ascendentes são chamados à totalidade da herança.
3. A partilha entre os ascendentes, nos casos previstos nos números anteriores, faz-se segundo as
regras dos artigos 2135º e 2136º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2143º
(Acrescer)

Se algum ou alguns dos ascendentes não puderem ou não quiserem aceitar, no caso previsto no nº 1
do artigo anterior, a sua parte acresce à dos outros ascendentes que concorram à sucessão; se estes
não existirem, acrescerá à do cônjuge sobrevivo.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2144º
(Sucessão do cônjuge, na falta de
descendentes e ascendentes)
Na falta de descendentes e ascendentes, o cônjuge é chamado à totalidade da herança.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

CAPÍTULO IV
Sucessão dos irmãos e seus descendentes

ARTIGO 2145º
(Regra geral)
Na falta de cônjuge, descendentes e ascendentes, são chamados à sucessão os irmãos e,
representativamente, os descendentes destes.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2146º
(Irmãos germanos e unilaterais)
Concorrendo à sucessão irmãos germanos e irmãos consanguíneos ou uterinos, o quinhão de cada
um dos irmãos germanos, ou dos descendentes que os representem, é igual ao dobro do quinhão de
cada um dos outros.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

CAPÍTULO V
Sucessão dos outros colaterais

ARTIGO 2147º
(Outros colaterais até ao quarto grau)
Na falta de herdeiros das classes anteriores, são chamados à sucessão os restantes colaterais até ao
quarto grau, preferindo sempre os mais próximos.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2148º
(Duplo parentesco)
A partilha faz-se por cabeça, mesmo que algum dos chamados à sucessão seja duplamente parente
do falecido.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGOS 2149º A 2151º
(Revogados pelos Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

CAPÍTULO VI
Sucessão do Estado

ARTIGO 2152º
(Chamamento do Estado)
Na falta de cônjuge e de todos os parentes sucessíveis, é chamado à herança o Estado.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2153º
(Direitos e obrigações do Estado)
O Estado tem, relativamente à herança, os mesmos direitos e obrigações de qualquer outro herdeiro.

ARTIGO 2154º
(Desnecessidade de aceitação e
impossibilidade de repúdio)
A aquisição da herança pelo Estado, como sucessor legítimo, opera-se de direito, sem necessidade
de aceitação, não podendo o Estado repudiá-la.

ARTIGO 2155º
(Declaração de herança vaga)
Reconhecida judicialmente a inexistência de outros sucessíveis legítimos, a herança é declarada
vaga para o Estado nos termos das leis de processo.

TÍTULO III
DA SUCESSÃO LEGITIMÁRIA
CAPÍTULO I
Disposições gerais

ARTIGO 2156º
(Legítima)
Entende-se por legítima a porção de bens de que o testador não pode dispor, por ser legalmente
destinada aos herdeiros legitimários.

ARTIGO 2157º
(Herdeiros legitimários)
São herdeiros legitimários o cônjuge, os descendentes e os ascendentes, pela ordem e segundo as
regras estabelecidas para a sucessão legítima.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2158º
(Legítima do cônjuge)
A legítima do cônjuge, se não concorrer com descendentes nem ascendentes, é de metade da
herança.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2159º
(Legítima do cônjuge e dos filhos)
1. A legítima do cônjuge e dos filhos, em caso de concurso, é de dois terços da herança.
2. Não havendo cônjuge sobrevivo, a legítima dos filhos é de metade ou dois terços da herança,
conforme exista um só filho ou existam dois ou mais.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2160º
(Legítima dos descendentes do segundo grau e seguintes)
Os descendentes do segundo grau e seguintes têm direito à legítima que caberia ao seu ascendente,
sendo a parte de cada um fixada nos termos prescritos para a sucessão legítima.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2161º
(Legítima do cônjuge e dos ascendentes)
1. A legítima do cônjuge e dos ascendentes, em caso de concurso, é de dois terços da herança.
2. Se o autor da sucessão não deixar descendentes nem cônjuge sobrevivo, a legítima dos
ascendentes é de metade ou de um terço da herança, conforme forem chamados os pais ou os
ascendentes do segundo grau e seguintes.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2162º
(Cálculo da legítima)
1. Para o cálculo da legítima, deve atender-se ao valor dos bens existentes no património do autor
da sucessão à data da sua morte, ao valor dos bens doados, às despesas sujeitas a colação e às
dívidas da herança.
2. Não é atendido para o cálculo da legítima o valor dos bens que, nos termos do artigo 2112º, não
são objecto de colação.

ARTIGO 2163º
(Proibição de encargos)
O testador não pode impor encargos sobre a legítima, nem designar os bens que a devem preencher,
contra a vontade do herdeiro.

ARTIGO 2164º
(Cautela sociniana)
Se, porém, o testador deixar usufruto ou constituir pensão vitalícia que atinja a legítima, podem os
herdeiros legitimários cumprir o legado ou entregar ao legatário tão-somente a quota disponível.

ARTIGO 2165º
(Legado em substituição da legítima)
1. Pode o autor da sucessão deixar um legado ao herdeiro legitimário em substituição da legítima.
2. A aceitação do legado implica a perda do dinheiro à legítima, assim como a aceitação da legítima
envolve a perda do dinheiro ao legado.
3. Se o herdeiro, notificado nos termos do nº 1 do artigo 2049º, nada declarar, ter-se-á por aceito o
legado.
4. O legado deixado em substituição da legítima é imputado na quota indisponível do autor da
sucessão; mas, se exceder o valor da legítima do herdeiro, é imputado pelo excesso, na quota
disponível.

ARTIGO 2166º
(Deserdação)
1. O autor da sucessão pode em testamento, com expressa declaração da causa, deserdar o herdeiro
legitimário, privando-o da legítima, quando se verifique alguma das seguintes ocorrências:
a) Ter sido o sucessível condenado por algum crime doloso cometido contra a pessoa, bens ou
honra do autor da sucessão, ou do seu cônjuge, ou algum descendente, ascendente, adoptante ou
adoptado, desde que ao crime corresponda pena superior a seis meses de prisão;
b) Ter sido o sucessível condenado por denúncia caluniosa ou falso testemunho contra as mesmas
pessoas;
c) Ter o sucessível, sem justa causa, recusado ao autor da sucessão ou ao seu cônjuge os devidos
alimentos.
2. O deserdado é equiparado ao indigno para todos os efeitos legais.

ARTIGO 2167º
(Impugnação da deserdação)
A acção de impugnação da deserdação, com fundamento na inexistência da causa invocada, caduca
ao fim de dois anos a contar da abertura do testamento.
CAPÍTULO II
Redução de liberalidades

ARTIGO 2168º
(Liberalidades inoficiosas)
Dizem-se inoficiosas as liberalidades, entre vivos ou por morte, que ofendam a legítima dos
herdeiros legitimários.

ARTIGO 2169º
(Redução)
As liberalidades inoficiosas são redutíveis, a requerimento dos herdeiros legitimários ou dos seus
sucessores, em tanto quanto for necessário para que a legítima seja preenchida.

ARTIGO 2170º
(Proibição da renúncia)
Não é permitida em vida do autor da sucessão a renúncia ao direito de reduzir as liberalidades.

ARTIGO 2171º
(Ordem da redução)
A redução abrange em primeiro lugar as disposições testamentárias a título de herança, em segundo
lugar os legados, e por último as liberalidades que hajam sido feitas em vida do autor da sucessão.

ARTIGO 2172º
(Redução das disposições testamentárias)
1. Se bastar a redução das disposições testamentárias, será feita proporcionalmente, tanto no caso de
deixas a título de herança como a título de legado.
2. No caso, porém, de o testador ter declarado que determinadas disposições devem produzir efeito
de preferência a outras, as primeiras só serão reduzidas se o valor integral das restantes não for
suficiente para o preenchimento da legítima.
3. Gozam de igual preferência as deixas remuneratórias.

ARTIGO 2173º
(Redução de liberalidades feitas em vida)
1. Se for necessário recorrer às liberalidades feitas em vida, começar-se-á pela última, no todo ou
em parte; se isso não bastar, passar-se-á à imediata; e assim sucessivamente.
2. Havendo diversas liberalidades feitas no mesmo acto ou na mesma data, a redução será feita entre
elas rateadamente, salvo se alguma delas for remuneratória, porque a essa é aplicável o disposto no
nº 3 do artigo anterior.

ARTIGO 2174º
(Termos em que se efectua a redução)
1. Quando os bens legados ou doados são divisíveis, a redução faz-se separando deles a parte
necessária para preencher a legítima.
2. Sendo os bens indivisíveis, se a importância da redução exceder metade do valor dos bens, estes
pertencem integralmente ao herdeiro legitimário, e o legatário ou donatário haverá o resto em
dinheiro; no caso contrário, os bens pertencem integralmente ao legatário ou donatário, tendo este
de pagar em dinheiro ao herdeiro legitimário a importância da redução.
3. A reposição de aquilo que se despendeu gratuitamente a favor dos herdeiros legitimários, em
consequência da redução, é feita igualmente em dinheiro.

ARTIGO 2175º
(Perecimento ou alienação dos bens doados)
Se os bens doados tiverem perecido por qualquer causa ou tiverem sido alienados ou onerados, o
donatário ou os seus sucessores são responsáveis pelo preenchimento da legítima em dinheiro, até
ao valor desses bens.

ARTIGO 2176º
(Insolvência do responsável)
Nos casos previstos no artigo anterior e no nº 3 do artigo 2174º, a insolvência daqueles que,
segundo a ordem estabelecida, devem suportar o encargo da redução não determina a
responsabilidade dos outros.

ARTIGO 2177º
(Frutos e benfeitorias)
O donatário é considerado, quanto a frutos e benfeitorias, possuidor de boa fé até à data do pedido
de redução.

ARTIGO 2178º
(Prazo para a redução)
A acção de redução de liberalidades inoficiosas caduca dentro de dois anos, a contar da aceitação da
herança pelo herdeiro legitimário.

TÍTULO IV
DA SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA
CAPÍTULO I
Disposições gerais

ARTIGO 2179º
(Noção de testamento)
1. Diz-se testamento o acto unilateral e revogável pelo qual uma pessoa dispõe, para depois da
morte, de todos os seus bens ou de parte deles.
2. As disposições de carácter não patrimonial que a lei permite inserir no testamento são válidas se
fizerem parte de um acto revestido de forma testamentária, ainda que nele não figurem disposições
de carácter patrimonial.

ARTIGO 2180º
(Expressão da vontade do testador)
É nulo o testamento em que o testador não tenha exprimido cumprida e claramente a sua vontade,
mas apenas por sinais ou monossílabos, em resposta a perguntas que lhe fossem feitas.

ARTIGO 2181º
(Testamento de mão comum)
Não podem testar no mesmo acto duas ou mais pessoas, quer em proveito recíproco, quer em favor
de terceiro.

ARTIGO 2182º
(Carácter pessoal do testamento)
1. O testamento é acto pessoal, insusceptível de ser feito por meio de representante ou de ficar
dependente do arbítrio de outrem, quer pelo que toca à instituição de herdeiros ou nomeação de
legatários, quer pelo que respeita ao objecto da herança ou do legado, quer pelo que pertence ao
cumprimento ou não cumprimento das suas disposições.
2. O testador pode, todavia, cometer a terceiro:
a) A repartição da herança ou do legado, quando institua ou nomeie uma generalidade de pessoas;
b) A nomeação do legatário de entre pessoas por aquele determinadas.
3. Nos casos previstos no número antecedente, qualquer interessado tem a faculdade de requerer ao
tribunal a fixação de um prazo para a repartição da herança ou do legado ou nomeação do legatário,
sob a cominação, no primeiro caso, de a repartição pertencer à pessoa designada para o efeito pelo
tribunal e, no segundo, de a distribuição do legado ser feita por igual pelas pessoas que o testador
tenha determinado.

ARTIGO 2183º
(Escolha do legado pelo onerado,
pelo legatário ou por terceiro)
1. O testador pode deixar a escolha da coisa legada à justa apreciação do onerado, do legatário ou de
terceiro, desde que indique o fim do legado e o género ou espécie em que ele se contém.
2. É aplicável a este caso, com as necessárias adaptações, o disposto no nº 3 do artigo anterior.

ARTIGO 2184º
(Testamento «per relationem»)
É nula a disposição que dependa de instruções ou recomendações feitas a outrem secretamente, ou
se reporte a documentos não autênticos, ou não escritos e assinados pelo testador com data anterior
à data do testamento ou contemporânea desta.

ARTIGO 2185º
(Disposições a favor de pessoas incertas)
É igualmente nula a disposição feita a favor de pessoa incerta que por algum modo se não possa
tornar certa.

ARTIGO 2186º
(Fim contrário à lei ou à ordem pública,
ou ofensivo dos bons costumes)
É nula a disposição testamentária, quando da interpretação do testamento resulte que foi
essencialmente determinada por um fim contrário à lei ou à ordem pública, ou ofensivo dos bons
costumes.

ARTIGO 2187º
(Interpretação dos testamentos)
1. Na interpretação das disposições testamentárias observar-se-á o que parecer mais ajustado com a
vontade do testador, conforme o contexto do testamento.
2. É admitida prova complementar, mas não surtirá qualquer efeito a vontade do testador que não
tenha no contexto um mínimo de correspondência, ainda que imperfeitamente expressa.

CAPÍTULO II
Capacidade testamentária

ARTIGO 2188º
(Princípio geral)
Podem testar todos os indivíduos que a lei não declare incapazes de o fazer.

ARTIGO 2189º
(Incapacidade)
São incapazes de testar:
a) Os menores não emancipados;
b) Os interditos por anomalia psíquica.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2190º
(Sanção)
O testamento feito por incapazes é nulo.

ARTIGO 2191º
(Momento da determinação da capacidade)
A capacidade do testador determina-se pela data do testamento.
CAPÍTULO III
Casos de indisponibilidade relativa
ARTIGO 2192º
(Tutor, curador, administrador legal de bens e protutor)
1. É nula a disposição feita por interdito ou inabilitado a favor do seu tutor, curador ou
administrador legal de bens, ainda que estejam aprovadas as respectivas contas.
2. É igualmente nula a disposição a favor do protutor, se este, na data em que o testamento foi feito,
substituía qualquer das pessoas designadas no número anterior.
3. É, porém, válida a disposição a favor das mesmas pessoas, quando se trate de descendentes,
ascendentes, colaterais até ao terceiro grau ou cônjuge do testador.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2193º
(Revogado pelo Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2194º
(Médicos, enfermeiros e sacerdotes)
É nula a disposição a favor do médico ou enfermeiro que tratar do testador, ou do sacerdote que lhe
prestar assistência espiritual, se o testamento for feito durante a doença e o seu autor vier a falecer
dela

ARTIGO 2195º
(Excepções)
A nulidade estabelecida no artigo anterior não abrange:
a) Os legados remuneratórios de serviços recebidos pelo doente;
b) As disposições a favor das pessoas designadas no nº 3 do artigo 2192º.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2196º
(Cúmplice do testador adúltero)
1. É nula a disposição a favor da pessoa com quem o testador casado cometeu adultério.
2. Não se aplica o preceito do número anterior:
a) Se o casamento já estava dissolvido, ou os cônjuges estavam separados judicialmente de pessoas
e bens ou separados de facto há mais de seis anos, à data da abertura da sucessão;
b) Se a disposição se limitar a assegurar alimentos ao beneficiário.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2197º
(Intervenientes no testamento)
É nula a disposição a favor do notário ou entidade com funções notariais que lavrou o testamento
público ou aprovou o testamento cerrado, ou a favor da pessoa que escreveu este, ou das
testemunhas, abonadores ou intérpretes que intervierem no testamento ou na sua aprovação.

ARTIGO 2198º
(Interpostas pessoas)
1. São nulas as disposições referidas nos artigos anteriores, quando feitas por meio de interposta
pessoa.
2. Consideram-se interpostas pessoas as designadas no nº 2 do artigo 579º.

CAPÍTULO IV
Falta e vícios da vontade

ARTIGO 2199º
(Incapacidade acidental)
É anulável o testamento feito por quem se encontrava incapacitado de entender o sentido da sua
declaração ou não tinha o livre exercício da sua vontade por qualquer causa, ainda que transitória.

ARTIGO 2200º
(Simulação)
É anulável a disposição feita aparentemente a favor de pessoa designada no testamento, mas que, na
realidade, e por acordo com essa pessoa, vise a beneficiar outra.

ARTIGO 2201º
(Erro, dolo e coacção)
É também anulável a disposição testamentária determinada por erro, dolo ou coacção.

ARTIGO 2202º
(Erro sobre os motivos)

O erro, de facto ou de direito, que recaia sobre o motivo da disposição testamentária só é causa de
anulação quando resultar do próprio testamento que o testador não teria feito a disposição se
conhecesse a falsidade do motivo.

ARTIGO 2203º
(Erro na indicação da pessoa ou dos bens)
Se o testador tiver indicado erroneamente a pessoa do herdeiro ou do legatário, ou dos bens que são
objecto da disposição, mas da interpretação do testamento for possível concluir a que pessoa ou
bens ele pretendia referir-se, a disposição vale relativamente a esta pessoa ou a estes bens.

CAPÍTULO V
Forma do testamento
SECÇÃO I
Formas comuns

ARTIGO 2204º
(Indicação)
As formas comuns do testamento são o testamento público e o testamento cerrado.

ARTIGO 2205º
(Testamento público)
É público o testamento escrito por notário no seu livro de notas.

ARTIGO 2206º
(Testamento cerrado)
1. O testamento diz-se cerrado, quando é escrito e assinado pelo testador ou por outra pessoa a seu
rogo, ou escrito por outra pessoa a rogo do testador e por este assinado.
2. O testador só pode deixar de assinar o testamento cerrado quando não saiba ou não possa fazê-lo,
ficando consignada no instrumento de aprovação a razão por que o não assina.
3. A pessoa que assina o testamento deve rubricar as folhas que não contenham a sua assinatura.
4. O testamento cerrado deve ser aprovado por notário, nos termos da lei do notariado.
5. A violação do disposto nos números anteriores importa nulidade do testamento.

ARTIGO 2207º
(Data do testamento cerrado)
A data da aprovação do testamento cerrado é havida como data do testamento para todos os efeitos
legais.

ARTIGO 2208º
(Inabilidade para fazer testamento cerrado)
Os que não sabem ou não podem ler são inábeis para dispor em testamento cerrado.

ARTIGO 2209º
(Conservação e apresentação do testamento cerrado)
1. O testador pode conservar o testamento cerrado em seu poder, cometê-lo à guarda de terceiro ou
depositá-lo em qualquer repartição notarial.
2. A pessoa que tiver em seu poder o testamento é obrigada a apresentá-lo ao notário em cuja área o
documento se encontre, dentro de três dias contados desde o conhecimento do falecimento do
testador; se o não fizer, incorre em responsabilidade pelos danos a que der causa, sem prejuízo da
sanção especial da alínea d) do artigo 2034º.

SECÇÃO II
Formas especiais

ARTIGO 2210º
(Testamento de militares e pessoas equiparadas)
Os militares, bem como os civis ao serviço das forças armadas, podem testar pela forma declarada
nos artigos seguintes, quando se encontrem em campanha ou aquartelados fora do País, ou ainda
dentro do País mas em lugares com os quais estejam interrompidas as comunicações e onde não
exista notário, e também quando se encontrem prisioneiros do inimigo.

ARTIGO 2211º
(Testamento militar público)
1. O militar, ou o civil a ele equiparado, declarará a sua vontade na presença do comandante da
respectiva unidade independente ou força isolada e de duas testemunhas.
2. Se o comandante quiser fazer testamento, tomará o seu lugar quem deva substituí-lo.
3. O testamento, depois de escrito, datado e lido em voz alta pelo comandante, será assinado pelo
testador, pelas testemunhas, e pelo mesmo comandante; se o testador ou as testemunhas não
puderem assinar, declarar-se-á o motivo porque o não fazem.

ARTIGO 2212º
(Testamento militar cerrado)
1. Se o militar, ou o civil a ele equiparado, souber e puder escrever, pode fazer o testamento por seu
próprio punho.
2. Escrito e assinado o testamento pelo testador, este apresentá-lo-á ao comandante, na presença de
duas testemunhas, declarando que exprime a sua última vontade; o comandante, sem o ler,
escreverá no testamento a declaração datada de que ele lhe foi apresentado, sendo essa declaração
assinada tanto pelas testemunhas como pelo comandante.
3. Se o testador o solicitar, o comandante, ainda na presença das testemunhas, coserá e lacrará o
testamento, exarando na face exterior da folha que servir de invólucro uma nota com a designação
da pessoa a quem pertencer o testamento ali contido.
4. É aplicável a esta espécie de testamento o que fica disposto no nº 2 do artigo antecedente.

ARTIGO 2213º
(Formalidades complementares)
1. O testamento feito na conformidade dos artigos anteriores será depositado pelas autoridades
militares na repartição ou em alguma das repartições notariais do lugar do domicílio ou da última
residência do testador.
2. Falecendo o testador antes de findar a causa que o impedia de testar nas formas comuns, será a
sua morte anunciada no jornal oficial, com designação da repartição notarial onde o testamento se
encontra depositado.

ARTIGO 2214º
(Testamento feito a bordo de navio)
Qualquer pessoa pode fazer testamento a bordo de navio de guerra ou de navio mercante, em
viagem por mar, nos termos declarados nos artigos seguintes.

ARTIGO 2215º
(Formalidades do testamento marítimo)
O testamento feito a bordo de navio deve obedecer ao preceituado nos artigos 2211º ou 2212º,
competindo ao comandante do navio a função que neles é atribuída ao comandante da unidade
independente ou força isolada.

ARTIGO 2216º
(Duplicado, registo e guarda do testamento)
O testamento marítimo é feito em duplicado, registado no diário de navegação e guardado entre os
documentos de bordo.

ARTIGO 2217º
(Entrega do testamento)
1. Se o navio entrar em algum porto estrangeiro onde exista autoridade consular portuguesa, deve o
comandante entregar a essa autoridade um dos exemplares do testamento e cópia do registo feito no
diário de navegação.
2. Aportando o navio a território português, entregará o comandante à autoridade marítima do lugar
o outro exemplar do testamento, ou fará entrega de ambos, se nenhum foi depositado nos termos do
número anterior, além de cópia do registo.
3. Em qualquer dos casos declarados no presente artigo, o comandante cobrará recibo da entrega e
averbá-lo-á no diário de navegação, à margem do registo do testamento.

ARTIGO 2218º
(Termo de entrega e depósito do testamento)
1. A autoridade consular ou militar lavrará termo de entrega do testamento, logo que esta lhe seja
feita, e fá-lo-á depositar na repartição ou em alguma das repartições notariais do lugar do domicílio
ou da última residência do testador.
2. É aplicável a este caso o disposto no nº 2 do artigo 2213º.

ARTIGO 2219º
(Testamento feito a bordo de aeronave)
O disposto nos artigos 2214º a 2218º é aplicável, com as necessárias adaptações, ao testamento feito
em viagem a bordo de aeronave.

ARTIGO 2220º
(Testamento feito em caso de calamidade pública)
1. Se qualquer pessoa estiver inibida de socorrer-se das formas comuns de testamento, por se
encontrar em lugar onde grasse epidemia ou por outro motivo de calamidade pública, pode testar

perante algum notário, ,juíz ou sacerdote, com observância das formalidades prescritas nos artigos
2211º ou 2212º.
2. O testamento será depositado, logo que seja possível, na repartição notarial ou em alguma das
repartições notariais do lugar onde foi feito.

ARTIGO 2221º
(Idoneidade das testemunhas, abonadores
ou intérpretes; incapacidades)
1. Não pode ser testemunha, abonador ou intérprete em qualquer dos testamentos regulados na
presente secção quem está impedido de o ser nos documentos autênticos extra-oficiais.
2. É extensivo aos mesmos testamentos, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 2197º.

ARTIGO 2222º
(Prazo de eficácia)
1. O testamento celebrado por alguma das formas especiais previstas na presente secção fica sem
efeito decorridos dois meses sobre a cessação da causa que impedia o testador de testar segundo as
formas comuns.
2. Se no decurso deste prazo o testador for colocado de novo em circunstâncias impeditivas, o prazo
é interrompido devendo começar a contar-se por inteiro a partir da cessação das novas
circunstâncias.
3. A entidade perante quem for feito o testamento deve esclarecer o testador acerca do disposto no
nº 1, fazendo menção do facto no próprio testamento; a falta de cumprimento deste preceito não
determina a nulidade do acto.
ARTIGO 2223º
(Testamento feito por português em país estrangeiro)
O testamento feito por cidadão português em país estrangeiro com observância da lei estrangeira
competente só produz efeitos em Portugal se tiver sido observada uma forma solene na sua feitura
ou aprovação.

CAPÍTULO VI
Conteúdo do testamento
SECÇÃO I
Disposições gerais

ARTIGO 2224º
(Disposições a favor da alma)
1. É válida a disposição a favor da alma, quando o testador designe os bens que devem ser
utilizados para esse fim ou quando seja possível determinar a quantia necessária para tal efeito.
2. A disposição a favor da alma constitui encargo que recai sobre o herdeiro ou legatário.

ARTIGO 2225º
(Disposição a favor de uma generalidade de pessoas)
A disposição a favor de uma generalidade de pessoas, sem qualquer outra indicação, considera-se
feita a favor das existentes no lugar em que o testador tinha o seu domicílio à data da morte.

ARTIGO 2226º
(Disposições a favor de parentes ou herdeiros legítimos)
1. A disposição a favor dos parentes do testador ou de terceiro, sem designação de quais sejam,
considera-se feita a favor dos que seriam chamados por lei à sucessão, na data da morte do testador,
sendo a herança ou legado distribuído segundo as regras da sucessão legítima.
2. De igual forma se procederá, se forem designados como sucessores os herdeiros legítimos do
testador ou de terceiro, ou certa categoria de parentes.

ARTIGO 2227º
(Designação individual e colectiva dos sucessores)
Se o testador designar certos sucessores individualmente e outros colectivamente, são estes havidos
por individualmente designados.

ARTIGO 2228º
(Designação de certa pessoa e seus filhos)
Se o testador chamar à sucessão certa pessoa e seus filhos, entende-se que são todos designados
simultaneamente, nos termos do artigo anterior, e não sucessivamente.

SECÇÃO II
Disposições condicionais, a termo e modais

ARTIGO 2229º
(Diposições condicionais)
O testador pode sujeitar a instituição de herdeiro ou a nomeação de legatário a condição suspensiva
ou resolutiva, com as limitações dos artigos seguintes.

ARTIGO 2230º
(Condições impossíveis, contrárias à lei
ou à ordem pública ou ofensivas dos bons costumes)
1. A condição física ou legalmente impossível considera-se não escrita e não prejudica o herdeiro
ou legatário, salvo declaração do testador em contrário.
2. A condição contrária à lei ou à ordem pública, ou ofensiva dos bons costumes, tem-se igualmente
por não escrita, ainda que o testador haja declarado o contrário, salvo o disposto no artigo 2186º.

ARTIGO 2231º
(Condição captatória)
É nula a disposição feita sob condição de que o herdeiro ou legatário faça igualmente em seu
testamento alguma disposição a favor do testador ou de outrem.

ARTIGO 2232º
(Condições contrárias à lei)
Consideram-se contrárias à lei a condição de residir ou não residir em certo prédio ou local, de
conviver ou não conviver com certa pessoa, de não fazer testamento, de não transmitir a
determinada pessoa os bens deixados ou de os não partilhar ou dividir, de não requerer inventário,
de tomar ou deixar de tomar o estado eclesiástico ou determinada profissão e as cláusulas
semelhantes.

ARTIGO 2233º
(Condição de casar ou não casar)
1. É também contrária à lei a condição de que o herdeiro ou legatário celebre ou deixe de celebrar
casamento.
2. É, todavia, válida a deixa de usufruto, uso, habitação, pensão ou outra prestação contínua ou
periódica para produzir efeito enquanto durar o estado de solteiro ou viúvo do legatário.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)
ARTIGO 2234º
(Condição de não dar ou não fazer)
Se a herança ou legado for deixado sob condição de o herdeiro ou legatário não dar certa coisa ou
não praticar certo acto por tempo indeterminado, a disposição considera-se feita sob condição
resolutiva, a não ser que o contrário resulte do testamento.

ARTIGO 2235º
(Obrigação de preferência)
O testador pode impor ao legatário a obrigação de dar preferência a certa pessoa na venda da coisa
legada ou na realização de outro contrato, nos termos prescritos para os pactos de preferência.

ARTIGO 2236º
(Prestação de caução)
1. Em caso de disposição testamentária sujeita a condição resolutiva, o tribunal pode impor ao
herdeiro ou legatário a obrigação de prestar caução no interesse daqueles a favor de quem a herança
ou legado será deferido no caso de a condição se verificar.
2. Do mesmo modo, em caso de legado dependente de condição suspensiva ou termo inicial, o
tribunal pode impor àquele que deva satisfazer o legado a obrigação de prestar caução no interesse
do legatário.
3. O testador pode dispensar a prestação de caução em qualquer dos casos previstos nos números
anteriores.

ARTIGO 2237º
(Administração da herança ou legado)
1. Se o herdeiro for instituído sob condição suspensiva, é posta a herança em administração, até que
a condição se cumpra ou haja a certeza de que não pode cumprir-se.
2. Também é posta em administração a herança ou legado durante a pendência da condição ou do
termo, se não prestar caução aquele a quem for exigida nos termos do artigo anterior.

ARTIGO 2238º
(A quem pertence a administração)
1. No caso de herança sob condição suspensiva, a administração pertence ao próprio herdeiro
condicional e, se ele a não aceitar, ao seu substituto; se não existir substituto ou este também a não
aceitar, a administração pertence ao co-herdeiro ou co-herdeiros incondicionais, quando entre eles e
o co-herdeiro condicional houver direito de acrescer, e, na sua falta, ao herdeiro legítimo
presumido.
2. Não sendo prestada a caução prevista no artigo 2236º, a administração da herança ou legado
compete àquele em cujo interesse a caução devia ser prestada.
3. Contudo, em qualquer dos casos previstos no presente artigo, o tribunal pode providenciar de
outro modo, se ocorrer justo motivo.

ARTIGO 2239º
(Regime da administração)
Sem prejuízo do disposto nos artigos anteriores, os administradores da herança ou legado estão
sujeitos às regras aplicáveis ao curador provisório dos bens do ausente, com as necessárias
adaptações.

ARTIGO 2240º
(Administração da herança ou legado a favor de nascituro)
1. O disposto nos artigos 2237º a 2239º é aplicável à herança deixada a nascituro não concebido,
filho de pessoa viva; mas a esta pessoa ou, se ela for incapaz, ao seu representante legal pertence a
representação do nascituro em tudo o que não seja inerente à administração da herança ou do
legado.
2. Se o herdeiro ou legatário estiver concebido, a administração da herança ou do legado compete a
quem administraria os seus bens se ele já tivesse nascido.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2241º
(Administração do cabeça-de-casal)
As disposições dos artigos antecedentes não prejudicam os poderes de administração do cabeça-decasal.

ARTIGO 2242º
(Retroactividade da condição)
1. Os efeitos do preenchimento da condição retrotraem-se à data da morte do testador,
considerando-se não escritas as declarações testamentárias em contrário.
2. É aplicável quanto ao regime da retroactividade o disposto nos nºs 2 e 3 do artigo 277º.

ARTIGO 2243º
(Termo inicial ou final)
1. O testador pode sujeitar a nomeação do legatário a termo inicial; mas este apenas suspende a
execução da disposição, não impedindo que o nomeado adquira direito ao legado.
2. A declaração de termo inicial na instituição de herdeiro, e bem assim a declaração de termo final
tanto na instituição de herdeiro como na nomeação de legatário, têm-se por não escritas, excepto,
quanto a esta nomeação, se a disposição versar sobre direito temporário.

ARTIGO 2244º
(Encargos)
Tanto a instituição de herdeiro como a nomeação de legatário podem ser sujeitas a encargos.

ARTIGO 2245º
(Encargos impossíveis, contrários à lei
ou à ordem pública, ou ofensivos dos bons costumes)
É aplicável aos encargos impossíveis, contrários à lei ou à ordem pública, ou ofensivos dos bons
costumes, o disposto no artigo 2230º.

ARTIGO 2246º
(Prestação de caução)
O tribunal, quando o considere justificado e o testador não tenha disposto coisa diversa, pode impor
ao herdeiro ou legatário onerado pelos encargos a obrigação de prestar caução.

ARTIGO 2247º
(Cumprimento dos encargos)
No caso de o herdeiro ou legatário não satisfazer os encargos, a qualquer interessado é lícito exigir
o seu cumprimento.

ARTIGO 2248º
(Resolução da disposição testamentária)
1. Qualquer interessado pode também pedir a resolução da disposição testamentária pelo não
cumprimento do encargo, se o testador assim houver determinado, ou se for lícito concluir do
testamento que a disposição não teria sido mantida sem o cumprimento do encargo.
2. Sendo resolvida a disposição, o encargo deve ser cumprido, nas mesmas condições, pelo
beneficiário da resolução, salvo se outra coisa resultar do testamento ou da natureza da disposição.
3. O direito de resolução caduca passados cinco anos sobre a mora no cumprimento do encargo e,
em qualquer caso, decorridos vinte anos sobre a abertura da sucessão.

SECÇÃO III
Legados

ARTIGO 2249º
(Aceitação e repúdio do legado)
É extensivo aos legados, no que lhes for aplicável, e com as necessárias adaptações, o disposto
sobre a aceitação e repúdio da herança.

ARTIGO 2250º
(Indivisibilidade da vocação)
1. O legatário não pode aceitar um legado em parte e repudiá-lo noutra parte; mas pode aceitar um
legado e repudiar outro, contanto que este último não seja onerado por encargos impostos pelo
testador.
2. O herdeiro que seja ao mesmo tempo legatário tem a faculdade de aceitar a herança e repudiar o
legado ou de aceitar o legado e repudiar a herança, mas também só no caso de a deixa repudiada
não estar sujeita a encargos.

ARTIGO 2251º
(Legado de coisa pertencente ao onerado ou a terceiro)
1. É nulo o legado de coisa pertencente ao sucessor onerado com o encargo ou a terceiro, salvo se
do testamento se depreender que o testador sabia que não lhe pertencia a coisa legada.
2. Neste último caso, o sucessor que tenha aceitado a disposição feita em seu benefício é obrigado a
adquirir a coisa e a transmiti-la ao legatário ou a proporcionar-lhe por outro modo a sua aquisição,
ou, não sendo isso possível, a pagar-lhe o valor dela; e é igualmente obrigado a transmitir-lhe a
coisa, se ela lhe pertencer.
3. Se a coisa legada, que não pertencia ao testador no momento da feitura do testamento, se tiver
depois tornado sua por qualquer título, tem efeito a disposição relativa a ela, como se ao tempo do
testamento pertencesse ao testador.
4. Se o legado recair sobre coisa de algum dos co-herdeiros, são os outros obrigados a satisfazerlhe,
em dinheiro ou em bens da herança, a parte que lhes toca no valor dela, proporcionalmente aos
seus quinhões hereditários, salvo diversa declaração do testador.

ARTIGO 2252º
(Legado de coisa pertencente só em parte ao testador)
1. Se o testador legar uma coisa que não lhe pertença por inteiro, o legado vale apenas em relação à
parte que lhe pertencer, salvo se do testamento resultar que o testador sabia não lhe pertencer a
totalidade da coisa, pois, nesse caso, observar-se-á, quanto ao restante, o preceituado no artigo
anterior.
2. As regras do número anterior não prejudicam o disposto no artigo 1685º quanto à deixa de coisa
certa e determinada do património comum dos cônjuges.

ARTIGO 2253º
(Legado de coisa genérica)
É válido o legado de coisa indeterminada de certo género, ainda que nenhuma coisa deste género se
encontrasse no património do testador à data do testamento e nenhuma aí se encontre à data da sua
morte, salvo se o testador fizer a declaração prevista no artigo seguinte.

ARTIGO 2254º
(Legado de coisa não existente no espólio do testador)
1. Se o testador legar coisa determinada, ou coisa indeterminada de certo género, com a declaração
de que aquela coisa ou este género existe no seu património, mas se assim não suceder ao tempo da
sua morte, é nulo o legado.
2. Se a coisa ou género mencionado na disposição se encontrar no património do testador ao tempo
da sua morte, mas não na quantidade legada, haverá o legatário o que existir.

ARTIGO 2255º
(Legado de coisa existente em lugar determinado)
O legado de coisa existente em lugar determinado só pode ter efeito até onde chegue a quantidade
que aí se achar à data da abertura da sucessão, excepto se a coisa, habitualmente guardada nesse
lugar, tiver sido de lá removida, no todo ou em parte, a título transitório.
ARTIGO 2256º
(Legado de coisa pertencente ao próprio legatário)
1. É nulo o legado de coisa que à data do testamento pertencia ao próprio legatário, se também lhe
pertencer à data da abertura da sucessão.
2. O legado, é porém, válido se à data da abertura da sucessão a coisa pertencia ao testador; e
também o é, se a esse tempo pertencia ao sucessor onerado com o legado ou a terceiro e do
testamento resultar que a deixa foi feita na previsão deste facto.
3. É aplicável, neste último caso, o disposto nos nº 2 e 4 do artigo 2251º.

ARTIGO 2257º
(Legado de coisa adquirida pelo legatário)
1. Se depois da feitura do testamento o legatário adquirir do testador, por título oneroso ou gratuito,
a coisa que tiver sido objecto do legado, este não produz efeito.
2. O legado também não produz efeito se, após o testamento, o legatário adquirir a coisa, por título
gratuito, do sucessor onerado ou de terceiro; se a adquirir por título oneroso, pode pedir o que
houver desembolsado, quando do testamento resulte que o testador sabia não lhe pertencer a coisa
legada.

ARTIGO 2258º
(Legado de usufruto)
A deixa de usufruto, na falta de indicação em contrário, considera-se feita vitaliciamente; se o
beneficiário for uma pessoa colectiva, terá a duração de trinta anos.

ARTIGO 2259º
(Legado para pagamento de dívida)
1. Se o testador legar certa coisa ou certa soma como por ele devida ao legatário, é válido o legado,
ainda que a soma ou coisa não fosse realmente devida, salvo sendo o legatário incapaz de a haver
por sucessão.
2. O legado fica, todavia, sem efeito, se o testador, sendo devedor ao tempo da feitura do
testamento, cumprir a obrigação posteriormente.

ARTIGO 2260º
(Legado a favor do credor)
O legado feito a favor de um credor, mas sem que o testador refira a sua dívida, não se considera
destinado a satisfazer essa dívida.

ARTIGO 2261º
(Legado de crédito)
1. O legado de um crédito só produz efeito em relação à parte que subsista ao tempo da morte do
testador.
2. O herdeiro satisfará a disposição entregando ao legatário os títulos respeitantes ao crédito.

ARTIGO 2262º
(Legado da totalidade dos créditos)
Se o testador legar a totalidade dos seus créditos, deve entender-se, em caso de dúvida, que o legado
só compreende os créditos em dinheiro, excluídos os depósitos bancários e os títulos ao portador ou
nominativos.

ARTIGO 2263º
(Legado do recheio de uma casa)
Sendo legado o recheio de uma casa ou o dinheiro nela existente, não se entende, no silêncio do
testador, que são também legados os créditos, ainda que na casa se encontrem os documentos
respectivos.

ARTIGO 2264º
(Pré-legado)
O legado a favor de um dos co-herdeiros, e a cargo de toda a herança, vale por inteiro.

ARTIGO 2265º
(Obrigação de prestação do legado)
1. Na falta de disposição em contrário, o cumprimento do legado incumbe aos herdeiros.
2. O testador pode, todavia, impor o cumprimento só a algum ou alguns dos herdeiros, ou a algum
ou alguns dos legatários.
3. Os herdeiros ou legatários sobre quem recaia o encargo ficam a ele sujeitos em proporção dos
respectivos quinhões hereditários ou dos respectivos legados, se o testador não tiver estabelecido
proporção diversa.

ARTIGO 2266º
(Cumprimento do legado de coisa genérica)
1. Quando o legado for de coisa indeterminada pertencente a certo género, cabe a escolha dela a
quem deva prestá-la, excepto se o testador tiver atribuído a escolha ao próprio legatário ou a
terceiro.
2. No silêncio do testador, a escolha recairá sobre coisas existentes na herança, salvo se não se
encontrar nenhuma do género considerado e o legado for válido nos termos do artigo 2253º; o
legatário pode escolher a coisa melhor, a não ser que a escolha verse sobre coisas não existentes na
heraça.
3. As regras dos artigos 400º e 542º são aplicáveis, com as necessárias adaptações, ao legado de
coisa genérica, quando não estejam em oposição com o disposto nos números antecedentes.

ARTIGO 2267º
(Cumprimento dos legados alternativos)
Os legados alternativos estão sujeitos ao regime, devidamente adaptado, das obrigações alternativas.

ARTIGO 2268º
(Transmissão do direito de escolha)
Tanto no legado de coisa genérica como no legado alternativo, se a escolha pertencer ao sucessor
onerado ou ao legatário, e um ou outro falecer sem a ter efectuado, transmite-se esse direito aos
seus herdeiros.

ARTIGO 2269º
(Extensão do legado)
1. Na falta de declaração do testador sobre a extensão do legado, entende-se que ele abrange as
benfeitorias e partes integrantes.
2. O legado de prédio rústico ou urbano, ou do conjunto de prédios rústicos ou urbanos que
constituam uma unidade económica, abrange, no silêncio do testador, as construções nele feitas,
anteriores ou posteriores ao testamento, e bem assim as aquisições posteriores que se tenham
integrado na mesma unidade, sem prejuízo do disposto no nº 2 do artigo 2316º.

ARTIGO 2270º
(Entrega do legado)
Na falta de declaração do testador sobre a entrega do legado, esta deve ser feita no lugar em que a
coisa legada se encontrava ao tempo da morte do testador e no prazo de um ano a contar dessa data,
salvo se por facto não imputável ao onerado se tornar impossível o cumprimento dentro desse
prazo; se, porém, o legado consistir em dinheiro ou em coisa genérica que não exista na herança, a
entrega deve ser feita no lugar onde se abrir a sucessão, dentro do mesmo prazo.

ARTIGO 2271º
(Frutos)
Não havendo declaração do testador sobre os frutos da coisa legada, o legatário tem direito aos
frutos desde a morte do testador, com exepção dos percebidos adiantamente pelo autor da sucessão;
se, todavia, o legado consistir em dinheiro ou em coisa não pertencente à herança, os frutos só são
devidos a partir da mora de quem deva satisfazê-lo.

ARTIGO 2272º
(Legado de coisa onerada)
1. Se a coisa legada estiver onerada com alguma servidão ou outro encargo que lhe seja inerente,
passa com o mesmo encargo ao legatário.
2. Havendo foros ou outras prestações atrasadas, serão pagas por conta da herança; e por conta dela
serão pagas ainda as dívidas asseguradas por hipotecas ou outra garantia real constituída sobre coisa
legada.

ARTIGO 2273º
(Legado de prestação periódica)
1. Se o testador legar qualquer prestação periódica, o primeiro período corre desde a sua morte,
tendo o legatário o direito a toda a prestação respeitante a cada período, ainda que faleça no seu
decurso.
2. O disposto no número anterior é aplicável ao legado de alimentos, mesmo que estes só venham a
ser fixados depois da morte do testador.
3. O legado só é exigível no termo do período correspondente, salvo se for a título de alimentos,
pois, nesse caso, é devido a partir do início de cada período.

ARTIGO 2274º
(Legado deixado a um menor)
O legado deixado a um menor para quando atingir a maioridade não pode ser por ele exigido antes
desse tempo, ainda que seja emancipado.

ARTIGO 2275º
(Despesas com o cumprimento do legado)
As despesas feitas com o cumprimento do legado ficam a cargo de quem deva satisfazê-lo.

ARTIGO 2276º
(Encargos impostos ao legatário)
1. O legatário responde pelo cumprimento dos legados e dos outros encargos que lhe sejam
impostos, mas só dentro dos limites do valor da coisa legada.
2. Se o legatário com encargo não receber todo o legado, é o encargo reduzido proporcionalmente e,
se a coisa legada for reivindicada por terceiro, pode o legatário reaver o que houver pago.

ARTIGO 2277º
(Pagamento dos encargos da herança pelos legatários)
Se a herança for toda distribuída em legado, são os encargos dela suportados por todos os legatários
em proporção dos seus legados, excepto se o testador houver disposto outra coisa.

ARTIGO 2278º
(Herança insuficiente para pagamento dos legados)
Se os bens da herança não chegarem para cobrir os legados, são estes pagos rateadamente;
exceptuam-se os legados remuneratórios, os quais são considerados como dívida da herança.

ARTIGO 2279º
(Reivindicação da coisa legada)
O legatário pode reivindicar de terceiro a coisa legada, contanto que esta seja certa e determinada.

ARTIGO 2280º
(Legados pios)
Os legados pios são regulados por legislação especial.

SECÇÃO IV
Substituições
SUBSECÇÃO I
Substituição directa

ARTIGO 2281º
(Noção)
1. O testador pode substituir outra pessoa ao herdeiro instituído para o caso de este não poder ou
não querer aceitar a herança: é o que se chama substituição directa.
2. Se o testador previr só um destes casos, entende-se ter querido abranger o outro, salvo declaração
em contrário.

ARTIGO 2282º
(Substituição plural)
Podem substituir-se várias pessoas a uma só, ou uma só a várias.

ARTIGO 2283º
(Substituição recíproca)
1. O testador pode determinar que os co-herdeiros se substituam reciprocamente.
2. Em tais casos se os co-herdeiros tiverem sido instituídos em partes desiguais, respeitar-se-á, no
silêncio do testador, a mesma proporção na substituição.
3. Mas, se à substituição não forem chamados todos os restantes instituídos, ou o for outra pessoa
além deles, e nada se declarar sobre a proporção respectiva, o quinhão vago será repartido em partes
iguais pelos substitutos.

ARTIGO 2284º
(Direitos e obrigações dos substitutos)
Os substitutos sucedem nos direitos e obrigações em que sucederiam os substituídos, excepto se
outra for a vontade do testador.

ARTIGO 2285º
(Substituição directa nos legados)
1. O disposto na presente subsecção é aplicável aos legados.
2. Quanto aos legatários nomeados em relação ao mesmo objecto, seja ou não conjunta a nomeação,
a substituição recíproca considera-se feita, no silêncio do testador, na mesma proporção em que foi
feita a nomeação.

SUBSECÇÃO II
Substituição fideicomissária

ARTIGO 2286º
(Noção)
Diz-se substituição fideicomissária, ou fideicomisso, a disposição pela qual o testador impõe ao
herdeiro instituído o encargo de conservar a herança, para que ela reverta, por sua morte, a favor de
outrem; o herdeiro gravado com o encargo chama-se fiduciário, e fideicomissário o beneficiário da
substituição.

ARTIGO 2287º
(Substituição plural)
Pode haver um só ou vários fiduciários, assim como um ou vários fideicomissários.

ARTIGO 2288º
(Limite de validade)
São nulas as substituições fideicomissárias em mais de um grau, ainda que a reversão da herança
para o fideicomissário esteja subordinada a um acontecimento futuro e incerto.

ARTIGO 2289º
(Nulidade da substituição)
A nulidade da substituição fideicomissária não envolve a nulidade da instituição ou da substituição
anterior; apenas se tem por não escrita a cláusula fideicomissária, salvo se o contrário resultar do
testamento.

ARTIGO 2290º
(Direitos e obrigações do fiduciário)
1. O fiduciário tem o gozo e a administração dos bens sujeitos ao fideicomisso.
2. São extensivas ao fiduciário, no que não for incompatível com a natureza do fideicomisso, as
disposições legais relativas ao usufruto.
3. O caso julgado constituído em acção relativa aos bens sujeitos ao fideicomisso não é oponível ao
fideicomissário se ele não interveio nela.

ARTIGO 2291º
(Alienação ou oneração de bens)
1. Em caso de evidente necessidade ou utilidade para os bens da substituição, pode o tribunal
autorizar, com as devidas cautelas, a alienação ou oneração dos bens sujeitos ao fideicomisso.
2. Nas mesmas condições, pode o tribunal autorizar a alienação ou oneração em caso de evidente
necessidade ou utilidade para o fiduciário, contanto que os interesses do fideicomissário não sejam
afectados.

ARTIGO 2292º
(Direitos dos credores pessoais do fiduciário)
Os credores pessoais do fiduciário não têm o direito de se pagar pelos bens sujeitos ao fideicomisso,
mas tão-somente pelos seus frutos.

ARTIGO 2293º
(Devolução da herança ao fideicomissário)
1. A herança devolve-se ao fideicomissário no momento da morte do fiduciário.
2. Se o fideicomissário não puder ou não quiser aceitar a herança, fica sem efeito a substituição,e a
titularidade dos bens hereditários considera-se adquirida definitivamente pelo fiduciário desde a
morte do testador.
3. Não podendo ou não querendo o fiduciário aceitar a herança, a substituição, no silêncio do
testamento, converte-se de fideicomissária em directa, dando-se a devolução da herança a favor do
fideicomissário, com efeito desde o óbito do testador.

ARTIGO 2294º
(Actos de disposição do fideicomissário)
O fideicomissário não pode aceitar ou repudiar a herança nem dispor dos bens respectivos, mesmo
por título oneroso, antes de ela lhe ser devolvida.

ARTIGO 2295º
(Fideicomissos irregulares)
1. São havidas como fideicomissárias:
a) As disposições pelas quais o testador proíba o herdeiro de dispor dos bens hereditários, seja por
acto entre vivos, seja por acto de última vontade;
b) As disposições pelas quais o testador chame alguém ao que restar da herança por morte do
herdeiro;
c) As disposições pelas quais o testador chame alguém aos bens deixados a uma pessoa colectiva,
para o caso de esta se extinguir.
2. No caso previsto na alínea a) do número anterior, são havidos como fideicomissários os herdeiros
legítimos do fiduciário.
3. Aos fideicomissos previstos neste artigo são aplicáveis as disposições dos artigos antecedentes;
mas, nos casos das alíneas b) e c) do nº 1, o fiduciário pode dispor dos bens por acto entre vivos,
independentemente de autorização judicial, se obtiver o consentimento do fideicomissário.

ARTIGO 2296º
(Substituição fideicomissária nos legados)
O disposto na presente subsecção é aplicável aos legados.

SUBSECÇÃO III
Substituições pupilar e quase-pupilar

ARTIGO 2297º
(Substituição pupilar)
1. O progenitor que não estiver inibido total ou parcialmente do poder paternal tem a faculdade de
substituir aos filhos os herdeiros ou legatários que bem lhe aprouver, para o caso de os mesmos
filhos falecerem antes de perfazer os dezoito anos de idade: é o que se chama substituição pupilar.
2. A substituição fica sem efeito logo que o substituído perfaça os dezoito anos, ou se falecer
deixando descendentes ou ascendentes.

ARTIGO 2298º
(Substituição quase-pupilar)
1. A disposição do artigo anterior é aplicável, sem destinção de idade, ao caso de o filho ser incapaz
de testar em consequência de interdição por anomalia psíquica: é o que se chama substituição
quase-pupilar.
2. A substituição quase-pupilar fica sem efeito logo que seja levantada a interdição, ou se o
substituto falecer deixando descendentes ou ascendentes.

ARTIGO 2299º
(Transformação da substituição pupilar em quase-pupilar)
A substituição pupilar é havida para todos os efeitos como quase-pupilar, se o menor for declarado
interdito por anomalia psíquica.

ARTIGO 2300º
(Bens que podem ser abrangidos)
As substituições pupilar e quase pupilar só podem abranger os bens que o substituído haja adquirido
por via do testador, embora a título de legítima.

SECÇÃO V
Direito de acrescer

ARTIGO 2301º
(Direito de acrescer entre herdeiros)
1. Se dois ou mais herdeiros forem instituídos em partes iguais na totalidade ou numa quota dos
bens, seja ou não conjunta a instituição, e algum deles não puder ou não quiser aceitar a herança,
acrescerá a sua parte à dos outros herdeiros instituídos na totalidade ou na quota.
2. Se forem desiguais as quotas dos herdeiros, a parte do que não pôde ou não quis aceitar é
dividida pelos outros, respeitando- se a proporção entre eles.

ARTIGO 2302º
(Direito de acrescer entre legatários)
1. Há direito de acrescer entre os legatários que tenham sido nomeados em relação ao mesmo
objecto, seja ou não conjunta a nomeação.
2. É aplicável, neste caso, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo anterior.

ARTIGO 2303º
(Desoneração do encargo do cumprimento do legado)
Não havendo direito de acrescer entre os legatários, o objecto do legado é atribuído ao herdeiro ou
legatário onerado com o encargo do seu cumprimento, salvo se esse objecto estiver genericamente
compreendido noutro legado.

ARTIGO 2304º
(Casos em que o direito de acrescer não tem lugar)
Não há lugar ao direito de acrescer, se o testador tiver disposto outra coisa, se o legado tiver
natureza puramente pessoal ou se houver direito de representação.

ARTIGO 2305º
(Direito de acrescer entre usufrutuários)
É aplicável ao direito de acrescer entre usufrutuários o disposto nos artigos 1442º e 2302º.

ARTIGO 2306º
(Aquisição da parte acrescida)
A aquisição da parte acrescida dá-se por força da lei, sem necessidade de aceitação do beneficiário,
que não pode repudiar separadamente essa parte, excepto quando sobre ela recaiam encargos
especiais impostos pelo testador; neste caso, sendo objecto de repúdio, a porção acrescida reverte
para a pessoa ou pessoas a favor de quem os encargos hajam sido constituídos.

ARTIGO 2307º
(Efeitos do direito de acrescer)
Os herdeiros ou legatários que houverem o acrescido sucedem nos mesmos direitos e obrigações, de
natureza não puramente pessoal, que caberiam àquele que não pôde ou não quis receber a deixa.

CAPÍTULO VII
Nulidade, anulabilidade, revogação
e caducidade dos testamentos
e disposições testamentárias

SECÇÃO I
Nulidade e anulabilidade

ARTIGO 2308º
(Caducidade da acção)
1. A acção de nulidade do testamento ou de disposição testamentária caduca ao fim de dez anos, a
contar da data em que o interessado teve conhecimento do testamento e da causa da nulidade.
2. Sendo anulável o testamento ou a disposição, a acção caduca ao fim de dois anos a contar da data
em que o interessado teve conhecimento do testamento e da causa da anulabilidade.
3. São aplicáveis, nestes casos, as regras da suspensão e interrupção da prescrição.

ARTIGO 2309º
(Confirmação do testamento)
Não pode prevalecer-se da nulidade ou anulabilidade do testamento ou da disposição testamentária
aquele que a tiver confirmado.

ARTIGO 2310º
(Inadmissibilidade da proibição de impugnar o testamento)
O testador não pode proibir que seja impugnado o seu testamento nos casos em que haja nulidade
ou anulabilidade.

SECÇÃO II
Revogação e caducidade
(Epígrafe dada pelo Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGO 2311º
(Faculdade de revogação)
1. O testador não pode renunciar à faculdade de revogar, no todo ou em parte, o seu testamento.
2. Tem-se por não escrita qualquer cláusula que contrarie a faculdade de revogação.

ARTIGO 2312º
(Revogação expressa)
A revogação expressa do testamento só pode fazer-se declarando o testador, noutro testamento ou
em escritura pública, que revoga no todo ou em parte o testamento anterior.

ARTIGO 2313º
(Revogação tácita)
1. O testamento posterior que não revogue expressamente o anterior revogá-lo-á apenas na parte em
que for com ele incompatível.
2. Se aparecerem dois testamentos da mesma data, sem que seja possível determinar qual foi o
posterior, e implicarem contradição, haver-se-ão por não escritas em ambos as disposições
contraditórias.

ARTIGO 2314º
(Revogação do testamento revogatório)
1. A revogação expressa ou tácita produz o seu efeito, ainda que o testamento revogatório seja por
sua vez revogado.
2. O testamento anterior recobra, todavia, a sua força, se o testador, revogando o posterior, declarar
ser sua vontade que revivam as disposições do primeiro.

ARTIGO 2315º
(Inutilização do testamento cerrado)
1. Se o testamento cerrado aparecer dilacerado ou feito em pedaços, considerar-se-á revogado,
excepto quando se prove que o facto foi practicado por pessoa diversa do testador ou que este não
teve intenção de o revogar ou se encontrava privado do uso da razão.
2. Presume-se que o facto foi praticado por pessoa diversa do testador, se o testamento não se
encontrava no espólio deste à data da sua morte.
3. A simples obliteração ou cancelamento do testamento, no todo ou em parte, ainda que com
ressalva e assinatura, não é havida como revogação, desde que possa ler-se a primitiva disposição.

ARTIGO 2316º
(Alienação ou transformação da coisa legada)
1. A alienação total ou parcial da coisa legada implica revogação correlativa do legado; a revogação
surte o seu efeito, ainda que a alienação seja anulada por fundamento diverso da falta ou vícios da
vontade do alheador, ou ainda que este readquira por outro modo a propriedade da coisa.
2. Implica, outrossim, revogação do legado a tranformação da coisa em outra, com diferente forma
e denominação ou diversa natureza, quando a transformação seja feita pelo testador.
3. É, porém, admissível a prova de que o testador, ao alienar ou transformar a coisa, não quis
revogar o legado.

ARTIGO 2317º
(Casos de caducidade)
As disposições testamentárias, quer se trate da instituição de herdeiro, quer da nomeação de
legatário, caducam, além de outros casos:
a) Se o instituído ou nomeado falecer antes do testador, salvo havendo representação sucessória;
b) Se a instituição ou nomeação estiver dependente de condição suspensiva e o sucessor falecer
antes de a condição se verificar;
c) Se o instituído ou nomeado se tornar incapaz de adquirir a herança ou o legado;
d) Se o chamado à sucessão era cônjuge do testador e à data da morte deste se encontravam
divorciados ou separados judicialmente de pessoas e bens ou o casamento tenha sido declarado nulo
ou anulado, por sentença já transitada ou que venha a transitar em julgado, ou se vier a ser
proferida, posteriormente àquela data, sentença de divórcio, separação judicial de pessoas e bens,
declaração de nulidade ou anulação do casamento;
e) Se o chamado à sucessão repúdiar a herança ou o legado, salvo havendo representação
sucessória.
(Redacção do Dec.-Lei 496/77, de 25-11)

ARTIGOS 2318º e 2319º
(Revogados pelo Dec.-Lei 497/77, de 25-11)

CAPÍTULO VIII
Testamentaria

ARTIGO 2320º
(Noção)
O testador pode nomear uma ou mais pessoas que fiquem encarregadas de vigiar o cumprimento do
seu testamento ou de o executar, no todo ou em parte: é o que se chama testamentaria.

ARTIGO 2321º
(Quem pode ser nomeado testamenteiro)
1. Só pode ser nomeado testamenteiro o que tiver plena capacidade jurídica.
2. A nomeação pode recair sobre um herdeiro ou legatário.

ARTIGO 2322º
(Aceitação ou recusa)
O nomeado pode aceitar ou recusar a testamentaria.
ARTIGO 2323º
(Aceitação)
1. A aceitação da testamentaria pode ser expressa ou tácita.
2. A testamentaria não pode ser aceita sob condição, nem a termo, nem só em parte.

ARTIGO 2324º
(Recusa)
A recusa da testamentaria faz-se por meio de declaração perante notário.

ARTIGO 2325º
(Atribuições do testamenteiro)
O testamenteiro tem as atribuições que o testador lhe conferir, dentro dos limites da lei.

ARTIGO 2326º
(Disposição supletiva)
Se o testador não especificar as atribuições do testamenteiro, competirá a este:
a) Cuidar do funeral do testador e pagar as despesas e sufrágios respectivos, conforme o que for
estabelecido no testamento ou, se nada se estabelecer, consoante os usos da terra;
b) Vigiar a execução das disposições testamentárias e sustentar, se for necessário, a sua validade em
juízo;
c) Exercer as funções de cabeça-de-casal, nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 2080º.

ARTIGO 2327º
(Cumprimento de legados e outros encargos)
O testador pode encarregar o testamenteiro do cumprimento dos legados e dos demais encargos da
herança, quando este seja cabeça-de-casal e não haja lugar a inventário obrigatório.

ARTIGO 2328º
(Venda de bens)
Para efeitos do disposto no artigo anterior, pode o testamenteiro ser autorizado pelo testador a
vender quaisquer bens da herança, móveis ou imóveis, ou os que forem designados no testamento.

ARTIGO 2329º
(Pluralidade de testamenteiros)
1. Sendo vários os testamenteiros, consideram-se todos nomeados conjuntamente, salvo se outra
coisa tiver sido disposta pelo testador.
2. Caducando por qualquer causa a testamentaria em relação a algum dos nomeados, continuam os
restantes no exercício das respectivas funções.
3. Sendo os testamenteiros nomeados sucessivamente, cada um deles só é chamado a aceitar ou
recusar o cargo na falta do anterior.

ARTIGO 2330º
(Escusa do testamenteiro)
O nomeado que aceitou a testamentaria só pode ser dela escusado nos casos previstos no nº 1 do
artigo 2085º.

ARTIGO 2331º
(Remoção do testamenteiro e caducidade
da testamentaria plural)
1. O testamenteiro pode ser judicialmente removido, a requerimento de qualquer interessado, se não
cumprir com prudência e zelo os deveres do seu cargo ou mostrar incompetência no seu
desempenho.
2. Se forem vários os testamenteiros nomeados conjuntamente e não houver acordo entre eles sobre
o exercício da testamentaria, podem ser removidos todos, ou apenas algum ou alguns deles.

ARTIGO 2332º
(Prestação de contas)
1. O testamenteiro é obrigado a prestar contas anualmente.
2. Em caso de culpa, responde o testamenteiro perante os herdeiros e legatários pelos danos a que
der causa.

ARTIGO 2333º
(Remuneração)
1. O cargo de testamenteiro é gratuito, excepto se lhe for assinada pelo testador alguma retribuição.
2. O testamenteiro não tem direito à retribuição assinada, ainda que atribuída sob a forma de legado,
se não aceitar a testamentaria ou for dela removido; se a testamentaria caducar por qualquer outra
causa, cabe-lhe apenas uma parte da retribuição proporcional ao tempo em que exerceu as funções.

ARTIGO 2334º
(Intransmissibilidade)
A testamentaria não é transmissível, em vida ou por morte, nem é delegável, bem que possa o
testamenteiro servir-se de auxiliares na execução do cargo, nos mesmos termos em que o procurador o pode fazer.

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