Foi apresentado pela Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) e baseia-se no conceito de colheita de água da chuva em linhas de água para aproveitamento em fins agroflorestais e de criação de reservas de água
no combate aos fogos florestais.
A Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) tem vindo a realizar uma importante investigação na interação entre os ecossistemas florestais e os ecossistemas aquáticos. É o caso deste projeto-piloto, que nasceu de um trabalho integrado desenvolvido pelos Departamentos de Ciências Florestal, Geologia e de Engenharia Civil.
O objetivo é de tirar partido da colheita de água da chuva em linhas de água, permitindo “o seu aproveitamento para fins agroflorestais e para a criação de reservas de água no combate aos fogos florestais”, enquanto diminui a pressão na utilização dos recursos hídricos de superfície, informa a UTAD numa nota enviada à comunicação social. O projeto foi já submetido a patente e publicado no ‘Journal of Hydrology’ e na revista ‘Science of the Total Environment’. Segundo a UTAD, os resultados já obtidos “comprovam as profundas alterações hidrológicas, perda de solo e eutrofização resultantes dos fogos florestais”.
“A UTAD tem dirigido diversos alertas aos decisores políticos e à sociedade em geral, quanto ao delapidar constante dos recursos naturais com repercussões gravíssimas, não só na floresta e no ecossistema, mas também ao nível do clima e de bens essenciais como a água e o solo, assim como quanto à necessidade de formar mais engenheiros e de apostar em investigação nesta área”, destaca a mesma nota, que faz ainda referência ao Plano de Prevenção, Monitorização e Acompanhamento dos Efeitos da Seca, divulgado há cerca de um mês pelo Governo e que contempla um conjunto de medidas preventivas deste fenómeno. Refira-se que em 2017, Portugal já registou os piores níveis de seca dos últimos 20 anos.
Porém, segundo o professor Rui Cortes, do Departamento Florestal da UTAD, “a possibilidade de mitigar a seca é muito limitada e as medidas principais agora preconizadas – como a contratação de camiões-cisterna para abastecimento público e a retirada de biomassa piscícola de algumas albufeiras do Sul, para evitar o apodrecimento dos peixes e inerentes problemas de saúde pública – são parte de uma atuação de contingência muito restrita e destinada a suprir deficiências pontuais no abastecimento às populações”. O mesmo responsável alerta para o “efeito da eutrofização”: quando menor o caudal, pior a qualidade da água,” que tenderá a ter uma concentração muito superior de nutrientes”.
Alerta para o efeito das cheias
Rui Cortes levanta ainda outra questão: a das cheias que poderão afetar Portugal já no próximo inverno, fruto da redução da floresta em consequência dos incêndios que atingiram este ano o país. “Quanto menos floresta, menor é a capacidade de infiltração de água no solo, por dois motivos: o efeito da erosão que conduz a perdas de solo consideráveis, e a frequente formação de camadas superficiais de solo hidrófobas (repelentes à água) que criam a compactação das camadas superiores, especialmente em eucaliptais. Esta situação leva a outra consequência dramática, da qual se tem falado pouco e que poderá ter lugar já no próximo inverno: o efeito de cheias”, alerta o professor e investigador. “As cheias são resultantes da menor evapotranspiração do coberto florestal e do maior escoamento superficial, devido à impermeabilização de extensas áreas. Logo, menos floresta maiores picos de caudal, mais inundações, mais erosão fluvial”, explica a nota da UTAD.
Rui Cortes refere ainda que os fogos florestais podem ter um efeito direto na qualidade da água originada pela intensa exportação de nutrientes (especialmente compostos azotados e fosfatados), afetando a sua utilização para fins múltiplos. “Até que ponto se poderá limitar o efeito devastador das alterações climáticas que tenderão a agudizar-se? Antes de mais, deve-se atender a que o consumo de água por parte da agricultura ascende a 81% do total, pelo que a eficiência da rega e a utilização de culturas adequadas representam aspetos fulcrais”, lembra a UTAD. A pensar nessa realidade, a universidade apresentou o projeto-piloto que procura tirar partido da colheita de água da chuva em linhas de água selecionadas para o efeito, “permitindo o seu aproveitamento para fins agroflorestais e até para criação de reservas de água para combate aos fogos florestais, ao mesmo tempo que permite diminuir a pressão na utilização dos recursos hídricos de superfície”.
Ana Grácio Pinto