O livro “Nem tudo acontece por acaso” surge após 48 anos de vida em França, mais do dobro daqueles que Manuel do Nascimento viveu em Portugal.
Dos emigrantes-soldado aos “emigrantes de sonho”, o historiador autodidata Manuel do Nascimento inspirou-se na história da emigração para França para publicar o primeiro romance.
O livro “Nem tudo acontece por acaso” surge após 48 anos de vida em França, mais do dobro daqueles que Manuel do Nascimento viveu em Portugal, e depois de ter editado, em França, nove obras sobre História de Portugal.
Em conversa com a Lusa, Manuel do Nascimento contou que o livro nasceu de uma viagem a Lisboa, quando conheceu um mendigo cujo pai, o alferes Raimundo Marques, participou na Primeira Guerra Mundial em França, entrou na Resistência francesa na Segunda Guerra, “esteve com o general Charles de Gaulle várias vezes e salvou o Hitler na Primeira Guerra sem saber que era ele”.
O livro, agora editado em Portugal pelas Edições Colibri e “em breve” apresentado em Paris, parte da vida deste soldado para percorrer a história contemporânea do país, nomeadamente a emigração para França nos anos 50, 60 e 70, a que Manuel do Nascimento chama “emigração de sonho”.
“A maioria dos nossos emigrantes que vieram naqueles anos tinha um sonho de encontrar uma vida melhor em França, mas encontraram outras surpresas porque foram morar para as barracas dos bairros de lata. Para muitos, esse sonho foi muito triste”, lembrou, exemplificando com os ‘bidonvilles’ de Champigny-sur-Marne, Saint-Denis e Aubervilliers.
Ainda que não tenha vivido nos bairros de lata, em janeiro de 1970, com 20 anos, Manuel do Nascimento também rumou a França “a salto”, numa viagem negociada clandestinamente e a “três contos de reis, três meses de ordenado”. O objetivo era evitar a guerra colonial.
Quando chegou a França, trabalhou para uma empresa onde fazia “microfilmagem de jornais, revistas e livros para a então Biblioteca Nacional de Paris” e foi ao longo desses 15 anos, em contacto com as páginas de obras “muito, muito antigas”, que cultivou a paixão pela História e se dedicou à escrita porque “nos manuais franceses nada existia sobre Portugal”.
“Antigamente, eu era obrigado a tirar dias de férias para ir para as bibliotecas fazer pesquisa. Ainda por cima, naquela altura a biblioteca da Fundação Calouste Gulbenkian em Paris estava fechada aos sábados e tinha de tirar dias durante a semana”, continuou Manuel do Nascimento.
Uma das “grandes paixões” do autor é a Grande Guerra, tendo publicado nomeadamente “A Batalha de La Lys” e “Primeira Guerra Mundial: Os soldados portugueses das trincheiras da Flandres e a mão-de-obra portuguesa a pedido do Estado francês”.
Em “Nem tudo acontece por acaso”, Manuel do Nascimento escreveu páginas que classifica como “uma narração simples”, nas quais deixou “palavras soltas das últimas férias ao país” e “principalmente saudade”.