Antigo palácio e convento perfeitamente integrados, teve um destino muito distinto daquele para que foi inicialmente construído. Apesar dos desafios do tempo, neste símbolo da História de Portugal persiste a sobriedade e imponência próprias, reflexos da notável residência real de outrora. Atualmente é sede do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Diz-se que este palácio teve origem numa lenda. Em 1580, um casal de tecelões decidiu refugiar-se na Ericeira devido à peste que assolou Lisboa. Neste local, tinham uma enorme devoção pela imagem de Nossa Senhora da Saúde que havia numa pequena capela. Com o abrandar da peste, por volta de 1604, o casal regressou a Lisboa, trazendo consigo a imagem de quem protegera a sua saúde durante mais de 20 anos e a fim de cumprir as suas promessas de gratidão, decidiram construir uma ermida para a Santa. Sob a proteção e patrocínio de Ana de Gouvêa de Vasconcellos, abastada proprietária da época, a pequena capela começou a ser edificada no início do século XVII.
Pela sua proximidade ao Rio Tejo, nomeadamente ao Cais de Alcântara, passou a ser ponto de passagem para as gentes do mar que recorriam à Nossa Senhora da Saúde em busca de proteção para a saúde e outras necessidades. A sua imagem ganhou fama e passou a ser associada a outros milagres, passando a ser local de romaria para quem quisesse pedir pelas suas necessidades.
Em 1705, o rei D. Pedro II, muito doente, pediu que levassem até si a imagem da milagreira. Recuperado e grato, mandou que a imagem regressasse à sua ermida, prometendo-lhe proteção real. D. João V, prolongou a devoção do seu pai à agora Nossa Senhora das Necessidades, recorrendo à sua imagem sempre que adoecia. Também ele grato pela proteção que a santa lhe providenciara, apropriou-se da capela e das propriedades anexas, tornando-as «em nome de Sua Majestade, e para o real Serviço do dito Senhor (…), posse da dita Quinta e da Sua Ermida de Nossa Senhora das Necessidades e de todas as suas pertenças e adornos». O monarca decidiu ampliar a capela e construir um palácio para residir. Fez ainda questão de construir um convento, designado por hospício, para albergar eclesiásticos que se dedicassem ao ensino da Teologia, das Humanidades e das Ciências.
A arquitetura definida para o palácio é fiel à estrutura característica do século XVII. A fachada interior dá para um pátio de honra que servia para as espetaculares entradas das carruagens em dias de gala no Palácio. Procurando adaptar o Palácio aos moldes da realeza da época, D. Pedro IV mandou retirar todos os azulejos das paredes, colocar soalho com madeiras exóticas, envidraçar as janelas, tornando o palácio mais opulento e retirando os adereços mais conventuais.
D. Maria II é outro nome muito importante para o Palácio das Necessidades: nasceu no Rio de Janeiro, frequentou as cortes de Londres e Viena (era neta materna do Imperador Francisco II de Áustria), e concluiu os seus estudos em Paris. Chegou pela primeira vez a Lisboa em 1833, sendo aguardada no Palácio das Necessidades que viria a tornar-se uma das suas residências favoritas.
Depois de ficar viúva muito jovem, já em segundas núpcias, com o Princípe Fernando de Saxe-Cobug-Gotha, em 1844 decide empreender novas remodelações no Palácio das Necessidades. Neste sentido, Joaquim Narciso Possidónio da Silva, arquiteto da Casa Real, foi incumbido de traçar e executar os novos planos para o edifício. O arquiteto real pediu a colaboração do cenógrafo do Teatro de São Carlos, Cinatti, para a direcção artística dos trabalhos em estuque e talha da decoração de interiores. Em relação às pinturas, D.Maria II e D.Fernando II pediram a assistência do maior mestre português da época, António Manuel da Fonseca, que estudara em Roma. São da sua autoria, entre outras, a Sala Etrusca e a Sala das Damas, ao estilo de Pompeia, a primitiva Sala de Jantar, com adereços de caça e pesca, a Sala Vermelha e a Sala do Trono. O património artístico de maior relevo encontra-se na Sala da Renascença, obras executadas por Cinatti que, em medalhões fixados no teto e nas bandeiras das portas, mostra os diferentes tipos arquitetónicos das diferentes casas europeias. É de salientar que mesmo depois da morte prematura de D. Maria II, o seu marido continuou a habitar o palácio com os seus filhos, os futuros D. Pedro V (que viria a promover novas e dispendiosas remodelações no palácio) e D. Luís I, D. João e D. Maria Ana.
O jardim deste magnífico palácio é também assinalável. Bem ao estilo português, apresenta canteiros de configuração geométrica, rematados por vasos grandes de pedra branca e um pequeno lago central rente ao chão. Existe, também, uma cascata rematada por um frontão triangular ornamentado com as estátuas de dois meninos abraçados, um deles lançando água por um búzio. Foi neste jardim que D. Estefânia teve a sua estufa particular e D. Amélia passou muitas horas a pintar.
Ministério dos Negócios Estrangeiros
Após a proclamação da República, em 1910, o Palácio das Necessidades ficou vazio até ser ocupado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros que, vindo do Terreiro do Paço, ali se instalou por volta de 1950. Foi em Maio desse ano que terminaram as obras de adaptação do edifício a sede do referido Ministério sob orientação do arquiteto Raúl Lino. Uma vez que é um núcleo ativo de apoio governamental não é costume haver visitas ao palácio, sendo o Lisbon Open House uma das exceções. Para os nossos leitores interessados em visitar este palácio aconselhamos: esteja atento e seja rápido a marcar a visita neste caso porque as reservas são limitadas.