O projeto que Carlos Medeiros e Elsa Gonçalves lançaram foi considerado um dos três mais relevantes pela autarquia de Montalegre no âmbito do programa (Co) Empreende, lançado em outubro de 2014 e destinado a capacitar e apoiar “projetos empresariais do concelho, com vista ao aproveitamento das oportunidades territoriais”, como explica a autarquia.
A escolha valeu-lhes um apoio de cinco mil euros entregue no início de 2015 e a posibilidade de dar ‘asas’ ao ‘Único no Momento’, uma pequena empresa têxtil, de confeção em burel, fundada em 2013. Hoje, a ‘Oficina do Burel’ tem um espaço aberto ao público no centro daquela vila transmontana e já deu a conhecer a sua arte da confeção em burel a vários países.
“No ano passado, passamos para uma loja física e este ano conseguimos dar o ‘salto’ para uma loja bem no centro da vila, onde toda a gente tem que passar obrigatoriamente. Os serviços principais estão aqui à volta. Os turistas conseguem identificar perfeitamente a loja. Foi uma boa aposta para nós mas, também, para a própria vila e para quem nos visita. Este local dá-nos mais visibilidade”, afirma Carlos Medeiros, assumindo claramente que a intenção do casal é evoluir e “continuar a crescer”. “Termos peças únicas, originais, que as pessoas gostem e vistam com orgulho. Os nossos clientes são o nosso maior cartão de visita”, defende.
Tradição e modernidade
Carlos e Elsa já têm levado a sua marca aos principais eventos do concelho e outros pelo país. Com o mercado nacional a começar a conhecer o conceito, os jovens resolveram apostar também nos mercados externos.
Em abril de 2015, fruto de uma parceria entre a ADERE-PG e a Câmara Municipal de Montalegre, a empresa viajou até à Grécia para mostrar “alguns projetos de artesanato português e comparar a situação do artesanato nos países participantes, entre eles, Portugal, Grécia, Bulgária, República Checa, Croácia, Grã-Bretanha e Itália”, como refere a autarquia numa nota à imprensa.
E na última Feira de Nanterre, a empresa mostrou o que melhor sabe fazer: artigos e peças de vestuário que unem a tradição à modernidade. Confessam que a criação é a grande paixão e enumeram as qualidades do tecido que utilizam. Todos os itens são confecionados em burel, tecido 100 por cento lã, de alta durabilidade e resistência e um produto com garantia e tradição portuguesa.
“As qualidades do burel provêm do seu particular processo de fabrico: a lã depois de lavada é cardada, fiada e torcida (com roca e fuso), etapas que convém serem executadas pela mesma pessoa para que o fio tenha sempre a mesma espessura e textura”, explica Carlos Medeiros, revelando ainda que depois a lã vai ao tear para ser urdida. “Após a tecelagem, é colocada no pisão, uma máquina que bate e escalda a lã de modo a tornar o pano mais compacto e resistente”, conclui.
Para a autarquia, a história deste projeto contraria a argumentação de que em terras pequenas, “não há homens grandes”. Carlos e Elsa defendem a sua Montalegre natal e afirmam ser “muito gratificante estarmos a trabalhar na nossa identidade com inovação”.
“Fazer isto na nossa terra, é fantástico. Queremos ser um ‘postal’ do concelho. Temos dado passos pequeninos. Quem nos conhece tem vindo a acompanhar a nossa história. Começamos em casa a fazer pequenas peças. Depois, indicados por amigos, fomos incentivados a fazer determinados artigos. A partir daí, sentimos necessidade de crescer, desenvolver novos produtos e sair de casa porque estava a tornar-se um lugar demasiado pequeno”, afirmam.
Encomendas do exterior
A abertura da loja no centro da vila de Montalegre é recente e fez o casal alterar o nome ‘Único no Momento’ para ‘Oficina do Burel’.
“Sentimos necessidade de ter um nome mais objetivo que nos identificasse de imediato. ‘Oficina do Burel’ refere-se à matéria-prima e pensamos que é apelativo, até pelos comentários positivos que temos recebido”, explica o proprietário.
À loja junta-se ao canal online e os dois canais de vendas oferecem desde almofadas a bolsas, passando pelas tradicionais capas.
E numa região de emigração, o mês de agosto prevê a chegada de muitos ‘filhos da terra’, o que para o casal apresenta-se como mais uma oportunidade de negócio. “Estamos a preparar stock para a chegada dos emigrantes. Acreditamos que neste novo espaço não iremos ter mãos a medir”, prevê Carlos Medeiros.
Por mês, o casal tem recebido 50 encomendas, tanto do território nacional como de países como Suíça, Luxemburgo, França e Finlândia. Os pedidos são variados, explica Elsa Gonçalves, responsável pela logística e pela promoção da marca. “Temos a secção de homem com casacos, coletes e sobretudos e alguns acessórios como botões de punho. A secção de criança, com capinhas bordadas com capuz para as meninas e canadianas para os meninos. A secção de senhora, bastante vasta, inclui capas, casacos, coletes, saias, calções, cintos, bijuterias e carteiras. Por fim, a secção casa, com abajures forrados a burel com diversas técnicas ou almofadas”, enumera. Os preços podem variar de 1€50 (ganchos) a 150€ as capas.
Um tecido português de origem medieval
O Burel é um tecido artesanal português, de origem medieval, feito 100 por cento de lã de ovelha. Está desde sempre associado à montanha e aos pastores, com as suas capas de burel.
A autenticidade do Burel resulta de uma sequência de operações específicas no processo de fabrico. A lã, após ter sido tosquiada, lavada, fiada, urdida no órgão e tecida no tear, é pisada numa máquina designada por pisão, que bate e escalda a lã transformando o tecido (enxerga) em burel, tornando-o mais apertado, resistente e impermeável.
Ana Grácio Pinto