“Há cada vez mais interesse pela formação de professores para o ensino venezuelano”

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A formação de professores para o ensino do português é um objetivo importante para a Coordenação do EPE na Venezuela. E começará a concretizar-se com a abertura de um curso na Universidad Pedagógica Experimental Libertador. Num país onde é cada vez maior o interesse pela aprendizagem da Língua Portuguesa, a formação inicial ou contínua de professores tem levado o Camões, I.P. e a Coordenação a realizarem várias atividades voltadas para os docentes, como explica Rainer de Sousa.

Quantos estudantes aprendem Português na Venezuela?
Existem 4.500 a 5.000 estudantes, desde o ensino básico às universidades, em todo o território venezuelano, com maior incidência na região centro do país – que compreende a zona de Caracas, Valência, Maracay, Barquisimeto – onde se encontra também a maior parte da comunidade portuguesa.
Na Venezuela não há uma rede oficial de professores. Há docentes que trabalham em instituições da comunidade e que o Camões, I.P. e a coordenação do EPE apoiam de maneira direta, com a realização de encontros e de ações de formação. Portanto há na Venezuela uma rede apoiada pelo Camões, I.P., que tem trabalhado, através da coordenação, junto destes professores que estão espalhados pelo território venezuelano. A nível universitário, há uma leitora, Sofia Saraiva, que, ao abrigo do protocolo entre o Camões, I.P. e a Universidade Central da Venezuela, dirige ali o Centro de Língua Portuguesa.

Por falar em encontros, em 2014 e 2015, a Coordenação realizou o Encontro Anual de Professores de Português. Esta iniciativa vai repetir-se em 2016?
O Encontro está agendado para julho — em princípio, será realizado na primeira e na segunda semana desse mês. Queremos trazer um professor de Portugal para este encontro e também para realizar uma ação de formação aos professores que trabalham na Venezuela. Esta terceira edição será a primeira onde também estará presente, de maneira formal, a Associação Venezuelana para o Ensino da Língua Portuguesa (AVELP), constituída em 2015 e que tem já professores a ela associados. A Coordenação quer envolver mais esta organização e estas pessoas que têm trabalhado tanto pela Língua Portuguesa durante muitos anos.

A AVELP é um parceiro importante da Coordenação na dinamização do Português?
A AVELP é mais um interlocutor que temos na Venezuela para dialogar com as autoridades. O Camões, I.P., através da Coordenação, apoiou a criação desta associação e é muito positivo que ela já esteja a funcionar.
É uma organização que chega no momento certo, porque na Venezuela cada vez mais se ouve falar na necessidade de implementar programas de português nas escolas oficiais do país e, para tal, há necessidade de formação para venezuelanos que queiram ser professores de português. E, nesse sentido, existe um cada vez maior interesse, que já foi manifestado pelas autoridades universitárias ou pelas instituições encarregadas pela formação de professores.
E AVELP é um interlocutor que possa ‘falar’ com as autoridades venezuelanas, principalmente ao nível do Ministério da Educação, para que no futuro possamos ter o português implementado de forma oficial nas escolas públicas deste país. Considero que o único obstáculo para que esse projeto avance é a falta de professores para responder às exigências do futuro.
Há neste momento, na Venezuela, cerca de 95 professores de português em todo o território. Esse é um número reduzido para aquilo que o país demanda em relação ao ensino da Língua Portuguesa. Mas há muito interesse por parte dos venezuelanos que não têm raízes portuguesas: todos os dias há pessoas a perguntar onde podem aprender português. É preciso agora criar os instrumentos de maneira a formar mais professores.

Será igualmente importante a abertura do curso de formação de professores na Universidad Pedagógica Experimental Libertador (UPEL) no próximo ano letivo…
Sim. Estamos ainda em processo de negociação mas há o desejo de avançar com este curso na UPEL no próximo ano letivo. Esta universidade tem vários núcleos espalhados pela Venezuela e um dos mais importantes está localizado em Maracay, estado de Aragua. As autoridades desse núcleo entraram em contacto com a Embaixada de Portugal porque decidiram abrir um curso com 100 vagas para venezuelanos que queiram ser formados em português, para seguirem a carreira docente. E privilegiaram a relação com Portugal.
Serão 100 venezuelanos que vão aprender português, vertente europeia, para depois ensinarem a Língua Portuguesa a outros venezuelanos.

Será uma licenciatura?
O curso terá quatro anos de preparação académica e um quinto ano de estágio. Este é um projeto a médio prazo, mas como cinco anos passam ‘a correr’, poderemos ver os frutos deste projeto que é muito importante para o futuro da Língua Portuguesa na Venezuela. E 100 venezuelanos a frequentar um curso de português é um número significativo. Este é um passo importante para que o Governo venezuelano venha a decidir implementar o ensino do português nas escolas públicas do país.

Nota um maior interesse por parte dos alunos, em aprenderem o Português nesta vertente?
Há na Venezuela uma única instituição que ensina o Português variante brasileira, mas está muito concentrada em Caracas, o que faz com que o Português europeu tenha maior visibilidade também no interior do país, devido ao trabalho desenvolvido pela comunidade portuguesa, não só em Caracas como noutras regiões da Venezuela.
Noto que o que os venezuelanos querem é aprender Português, mas se os professores oferecerem cursos da variante europeia, os venezuelanos não pensam duas vezes e inscrevem-se nesses cursos.

“Há muito interesse por parte dos venezuelanos que não têm raízes portuguesas: todos os dias há pessoas a perguntar onde podem aprender Português. É preciso agora criar os instrumentos de maneira a formar mais professores”

Há algum outro projeto de formação de professores que a Coordenação esteja a planear ou a desenvolver?
Temos um outro projeto que ainda não foi formalizado e está a ser pensado com a Universidade de Carabobo, em Valência, para a formação ‘on-line’. Esta é uma universidade de prestígio, muito avançada no que se refere ao ensino a distância. Eles acolheram este nosso projeto de formação ‘online’ de professores, que na Venezuela é chamado ‘diplomado’.
Esperamos conseguir abrir o curso ainda este ano, até porque já está numa fase muito avançada, para que possamos fazer a convocatória a todos os professores que queiram receber formação ‘online’ para dar aulas de português.
Será uma formação relacionada com a didática do português, com uma componente cultural, e voltada para pessoas que ensinam o português na Venezuela, que têm feito um excelente trabalho, mas querem aprender algo novo. Há ainda uma outra questão: as línguas próximas, como o português e o espanhol, tendem às vezes, a interferir uma com a outra, criando por vezes uma interlíngua, ou o que nós chamamos aqui, o ‘portunhol’.
E os docentes de português em países de Língua Espanhola devem considerar essa interferência e lidar com ela de maneira pedagógica e didática para que ajude o aluno a ultrapassar essas fases de interlíngua. O curso on-line ‘diplomado’ vai muito nessa direção.

Por falar em cultura, quais são os projetos dinamizados pela Coordenação, que têm mais recetividade por parte dos alunos?
No início de dezembro de 2015, realizamos em Caracas o primeiro Encontro de Estudantes de Língua Portuguesa da Venezuela. Foi também a nossa festa de Natal e onde os nossos alunos puderam apresentar os seus talentos em Língua Portuguesa: tivemos uma peça de teatro e músicas de Natal em português. Este ano queremos repeti-lo em dezembro, mas levá-lo à Casa Portuguesa de Maracay, no estado de Aragua, de forma a que as pessoas sintam que não centralizamos tudo em Caracas.
Além disso fazemos o Concurso ‘Postal de Natal’, com os miúdos a produzirem os seus postais e a criarem mensagens natalícias. No ano passado, lançámos para os estudantes adultos, e de níveis mais avançados, o ‘Conto de Natal’. No próximo mês vamos lançar o concurso ’10 de Junho’ que terá como tema os símbolos de Portugal.
Com o apoio do Camões, I.P., entregamos prémios, que são sempre livros, para estimular a leitura em Língua Portuguesa por parte dos estudantes.

Na Venezuela, como são recebidas as bibliotecas enviadas pelo Camões, I.P.?
Tem havido muito interesse. Já distribuímos várias e as instituições ficam muito agradecidas. Até porque, na Venezuela, atualmente, há uma enorme dificuldade em adquirir livros no estrangeiro.
Há que lembrar ainda que o Camões, I.P. apoiou neste ano letivo de 2015/2016 os diferentes cursos de Língua Portuguesa, através da doação de inúmeros manuais escolares aos alunos de português, devido à dificuldade das importadoras de livros venezuelanas em comprar esses manuais às editoras portuguesas.

Referiu que há um grande interesse dos venezuelanos na Língua Portuguesa, e que ultrapassa o âmbito da comunidade lusa? Acredita que este interesse irá manter-se?
Eu acredito que sim. Com a entrada da Venezuela no Mercosul, o português vai, cada vez mais, impor-se como uma língua necessária. Mas há também uma parte afetiva: netos de emigrantes portugueses que querem resgatar a língua dos seus antepassados. Estas são as duas grandes motivações de venezuelanos e de lusovenezuelanos, em aprender o português.
Em relação aos venezuelanos sem ascendência portuguesa, há ainda a vontade em aprender a língua por terem amigos portugueses. Por exemplo, em San Antonio de los Altos e em Los Teques, no estado de Miranda, onde há uma grande comunidade portuguesa, todos os venezuelanos têm vizinhos e amigos portugueses. E dizem que querem “aprender a falar com eles, entendê-los e conversar na língua deles”.
Além disso há na Venezuela um grande culto religioso da Nossa Senhora de Fátima, muitos venezuelanos são devotos e ao sentir a necessidade de uma aproximação cultural, fazem-na também através da aprendizagem do português.

 Ana Grácio Pinto

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