Ivo Rodrigues foi o grande vencedor de um concurso promovido pelo SISAB PORTUGAL, que veio premiar a escultura ‘mais portuguesa’ e ligada ao setor alimentar. Feita com recurso a materiais recicláveis e com alguns vislumbres do tradicional Galo de Barcelos, a peça “Um sabor bem português” valeu ao artista a presença no SISAB PORTUGAL e um prémio monetário, entregue em mão por Carlos Morais, CEO do evento. O Jornal Mundo Português esteve presente na entrega deste prémio e esteve à conversa com Ivo Rodrigues que, em entrevista, nos falou um pouco da sua experiência, de como é viver da escultura em Portugal e da atualidade do mundo da arte.
A última edição do SISAB PORTUGAL contou com a presença de uma escultura que tanto tem de portuguesa como de original. “Um sabor bem português” dá nome a uma peça na qual se destaca um prato com uma perna de frango, ‘vestida a rigor’ com o típico padrão do Galo de Barcelos, sob um individual no qual estão impressas uma rosa-dos-ventos e uma frase.
Esta escultura, que despertou o interesse de vários curiosos que marcaram presença no SISAB PORTUGAL, é da autoria de Ivo Rodrigues que, para conseguir a distinta exposição, participou num concurso levado a cabo pela organização do evento.
As regras eram simples. Uma escultura com um tamanho máximo de 1,80×1,80m e que envolvesse elementos ligados à cultura portuguesa, assim como ao setor alimentar. O vencedor, para além de expor a sua obra aos milhares de visitantes do SISAB PORTUGAL, receberia ainda um prémio monetário, entregue em mão por Carlos Morais, CEO do evento.
No passado mês de março, o Mundo Português esteve presente na entrega deste prémio e falou com Ivo Rodrigues, de modo a dar a conhecer, aos nossos leitores, a pessoa por trás desta peça.
Nascido em Lisboa e com licenciatura e mestrado na Faculdade de Belas-Artes, Ivo Rodrigues conta um pouco do seu percurso, de como é viver da arte em Portugal e, como não podia faltar, a história deste “sabor bem português”.
“Sempre gostei muitas das artes”, começa por dizer Ivo Rodrigues, que confessa ter demorado algum tempo a encontrar o seu caminho. A arte pode ser uma paixão antiga mas, até perceber o quanto esta era importante para si, Ivo andou “perdido nos estudos”. Primeiro no secundário, com dois anos dedicados a economia, até que por fim decidiu trocar de curso, e depois no ensino superior. “Sempre gostei de matemática, de números e de tudo relacionado, mas não me preenchia. Não era aquilo que queria. Tudo aquilo de gestão e de economia… fica sempre algo a faltar. (…) [No ensino superior] segui para arquitectura, onde fiquei um semestre, mas o que eu realmente gostava era de trabalhar o espaço, a tridimensionalidade e, na arquitectura, há muitas limitações”, revelou, acrescentando que foi na escultura que encontrou a liberdade criativa que procurava.
Apesar de ter começado por trabalhar com materiais reciclados, a entrada como voluntário no FabLab Lisboa, um laboratório de protótipagem que lhe deu oportunidade de trabalhar com outros recursos e experimentar novas técnicas, pelo que, para já, é esta a área à qual se tem dedicado. Hoje em dia trabalha com máquinas, numa “onda mais digital”, e diz que, apesar de estas terem as suas limitações, gosta do desafio de ter de inovar para “ultrapassar esses limites”. “É isso, esse experimentalismo, que me atrai”, revela.
Com 28 anos, confessa que é complicado considerar-se enquanto profissional. Revela que não se consegue intitular de escultor, muito devido às mutações que a escultura tem sofrido. “A escultura, há quem diga que está a morrer e há quem diga que se está a expandir tanto que está a ganhar uma nova identidade – ou a perdê-la. Eu faço aquilo que gosto: experimentar”, conclui.
Ainda assim, isto não o impediu de participar no concurso promovido pelo SISAB PORTUGAL, concurso esse que viria a vencer com a obra ‘Um sabor bem português’. “O tema era bastante complicado”, começa por dizer Ivo Rodrigues. “Tive bastante dificuldade com este tema, muito devido às imposições e também porque tive algum tempo sem saber o que fazer, até que me surgiu a ideia do Galo de Barcelos – português e que, segundo a lenda, era para ser comida”, acrescenta, referindo ainda, entre risos, que “a ‘coisa’ surgiu melhor do que estava à espera”.
Sob a frase “aos pontos cardeais o galo canta e a comida portuguesa encanta”, esta peça apresenta-se como original, numa época em que a escultura, segundo Ivo Rodrigues, não dá sinais de avançar para novas vanguardas. Para o artista, em 2016, a arte parece manter “a continuidade, aquilo que já era”. O próprio acrescenta ainda que “não parece que a coisa esteja original”. No entanto, e apesar de “não seguir modas”, fruto do seu fascínio pelo experimentalismo, afirma que há uma tendência crescente em termos de arte tecnológica, ou seja, peças de arte que se apropriam dos meios tecnológicos, algo que vê com agrado.
Ivo Rodrigues lamenta o facto de não existirem grandes oportunidades para as artes em Portugal, principalmente para a escultura. “Não há uma grande cultura artística. Há muita coisa boa, artistas muito bons, mas é difícil conseguir visibilidade”, afirma.
Apesar de se admitir confiante numa mudança social, na qual a cultura e as artes vão ganhar maior preponderância, Ivo Rodrigues lamenta o papel da arte na sociedade de hoje, em Portugal. “A arte podia ser algo mais abrangente, mais para as pessoas”, defende, justificando esta ideologia social com a crise dos últimos anos. “A austeridade (…) foi má para tudo e, no caso da cultura, arrasou. A cultura é a primeira a ser sacrificada”, acrescenta.
Quanto ao seu futuro, e à semelhança dos anos de estudante, encontra-se hoje “um bocado perdido”. Sair de Portugal é uma hipótese que vê com bons olhos, até porque conhecer diferentes culturas seria uma vantagem, mas por enquanto diz não ter meios para tal. Já em termos de trabalho “custa muito fechar a porta” à escultura, mesmo revelando que tem estado mais focado no tipo que trabalho que desenvolve no FabLab.
Sem planos a longo-prazo, Ivo Rodrigues diz não desistir e admite “continuar a apostar no que aparece”, seja pelo experimentalismo ou através de concursos, como o promovido pelo SISAB PORTUGAL, verdadeiras iniciativas que ajudam a impulsionar tanto a arte como os artistas, e contribuem para a valorização do seu trabalho, mesmo em tempos mais difíceis.