Até 2008, quando a lei da dupla nacionalidade foi aprovada, bastava falar apenas um dos três idiomas oficiais.
O Governo do Luxemburgo apresentou em março último um projeto-lei que reduz de sete para cinco anos a duração mínima obrigatória de residência para quem se queira candidatar à naturalização. Porém, o projeto-lei mantém os exames de luxemburguês, a única língua exigida para obter a nacionalidade, num país que tem três idiomas oficiais.
Por esse motivo, o documento está a ser criticado pela Associação de Apoio aos Trabalhadores Imigrantes (ASTI), que acusa o Executivo de ignorar o trilinguismo e a “realidade do país”. A ASTI recorda que até 2008, quando a lei da dupla nacionalidade foi aprovada, bastava falar um dos três idiomas. “Com a dupla nacionalidade, que para alguns foi uma pílula difícil de engolir, as exigências linguísticas foram agravadas”, explicou Sérgio Ferreira, porta-voz da ASTI, à agência Lusa.
Portugueses afetados
Para a ASTI, as alterações às regras dos exames de luxemburguês previstas no projeto-lei – a possibilidade de compensar os maus resultados na oral com o teste de compreensão – são apenas “de ordem simbólica”. A associação também teme que os exames afastem imigrantes com baixas qualificações, incluindo portugueses. “A abordagem baseada exclusivamente nos exames é difícil para estas pessoas, e pode afastar muitos”, sustentou Sérgio Ferreira à Lusa.
A Associação acusa o Governo de ter cedido “às exigências” dos partidos da oposição, com quem o Executivo chegou a acordo antes de apresentar o diploma, por estar “traumatizado com os resultados do referendo” sobre o direito de voto dos estrangeiros em eleições legislativas, em Junho de 2015.
O Executivo saiu derrotado da consulta popular, com 80% dos luxemburgueses a chumbarem a proposta – um resultado que fortaleceu o maior partido da oposição, os cristãos-sociais (CSV), que apoiaram o “não” ao direito de voto dos imigrantes. O Governo comprometeu-se a facilitar as condições de acesso à nacionalidade, para reduzir o défice democrático no país, mas a ASTI considera que “apesar de alguns avanços”, na generalidade, isso não aconteceu.
O projeto-lei prevê a dispensa do exame de luxemburguês para os candidatos que residem há mais de vinte anos no Luxemburgo – caso de muitos portugueses, que começaram a chegar ao país nos anos 1960 -, mas nestes casos exige que tenham frequentado 24 horas de aulas do idioma, uma condição que a ASTI considera aberrante. “Não sei para que é que serve, a não ser para calar a boca aos defensores da língua luxemburguesa. Vinte e quatro horas de qualquer língua não servem para nada, é apenas um alibi político”, acusa o porta-voz.
A exigência exclusiva do luxemburguês, que se tornou língua oficial do país em 1984, já tinha sido alvo de críticas no último Índice de Políticas de Integração (MIPEX), que analisa o acolhimento de imigrantes em 38 países. O estudo apresentado em 2015 aponta que a lei “não corresponde à realidade de um país multilingue, comparando o Grão-Ducado com a Suíça e a Bélgica, “países onde basta o conhecimento de uma das línguas oficiais” para obter a nacionalidade.
Desde 2009, ano em que a lei que permite a dupla cidadania entrou em vigor, sete mil portugueses adquiriram a nacionalidade luxemburguesa, representando mais de um quarto do total de naturalizações, segundo dados do Statec, o gabinete de estatísticas do Luxemburgo. Dos 7026 portugueses que se naturalizaram, a maioria (4057) já nasceram no Luxemburgo, um país que não concede a nacionalidade aos nascidos no território, o chamado direito do solo.
O projeto-lei apresentado pelo governo luxemburguês introduz um direito do solo “parcial”, prevendo que os filhos de estrangeiros nascidos no país possam solicitar a nacionalidade a partir dos 12 anos ou obtê-la automaticamente aos 18. No Luxemburgo vivem cerca de 100 mil portugueses, que representam 17% da população.