Desde a sua criação, em 1991, a J’Océane tornou-se uma referência na comercialização de peixes e mariscos em Paris, França. José Correia, 58 anos, natural de S. Pedro de Merelim, Braga, é o responsável pela criação desta empresa que processa por mês mais de 1000 toneladas do peixe servido nos melhores restaurantes de Paris, e fatura anualmente cerca de 80 milhões de euros.
Como é que veio para França?
Vim para França com os meus pais em 1969. Tinha 11 anos. Fiz a escolaridade primária aqui em França, começou por ser muito duro porque voltei ao início e comecei por ter aulas com alunos de 6 anos, mas fui começando a falar francês e com o passar do tempo fui subindo de ano em ano muito rápido. Acabei por fazer um curso de contabilidade e gestão.
No início foi difícil encontrar trabalho, mas acabei por encontrar na área da contabilidade numa empresa que trabalhava com chocolate artesanal. Trabalhei nesta empresa durante 6 anos. Ao fim de seis anos percebi que o chefe da contabilidade ia ter ainda muitos anos de atividade antes de se reformar impossibilitando-me de progredir na carreira até então. Não havia grande futuro ali.
Por essa altura, comprei o Fígaro e vi um anúncio de uma empresa aqui no mercado de Rungis que procurava um contabilista. Respondi a esse anúncio e o incrível é que isto acabou por ser uma coincidência porque estive para não ir à entrevista uma vez que tive que decidir se ia à entrevista ou para o trabalho. Mas deu-se um click e foi aí que tomei coragem e decidi vir. Se tivesse decidido não vir, provavelmente, não estaria aqui hoje. Foi aí que tudo começou.
Entretanto comecei a trabalhar, a empresa era pequena, estava a começar também, tinha um movimento muito baixo e quando eu saí, 6 anos mais tarde, essa empresa já tinha um movimento muito grande que eu ajudei a criar. Fiz na altura várias viagens com o meu patrão a Portugal e a vários países de África e foi aí, ainda em 1985 que comecei a trabalhar com Portugal, ainda Portugal tinha direitos de alfândega para o peixe, antes de entrar para a União Europeia. Mais tarde comecei a procurar fornecedores e clientes em Paris, comecei a fazer um pouco de tudo na empresa uma vez que gostava do contato humano para além da contabilidade e foi então que decidi lançar a J’Océane em abril de 1991.
Sozinho, sem ordenado durante um ano, depois um pequeno ordenado durante 5 anos. Foi muito difícil.
Ia todos os dias ao aeroporto buscar peixe num camião velhinho, ia entregar peixe para os clientes no mercado e depois recondicionava-o, calibrava-o e fazia a entrega nos restaurantes de Paris, e ainda tratava da contabilidade… Só dormia 3 horas por dia. Foi muito trabalho. Fazia tudo na empresa.
Onde é que começou a J’Océane?
Foi no mercado de Rungis, mas era um pequeno escritório, sem espaço nenhum. Não tínhamos meios, abri a empresa sem capital. Cada franco que ganhava ia para o banco para equilibrar a empresa financeiramente.
E hoje quais são os destinos dos produtos da empresa?
Hoje, 75% dos nossos produtos são entregues todos os dias, todas as noites e todas as manhãs a cerca de 1000 restaurantes em toda a região de Paris, destina-se aproximadamente 40% a restaurantes de cozinha francesa, 40% de cozinha japonesa, uma parte significativa do nosso negócio e 20% de venda direta no mercado a peixarias. Tudo é trabalhado nos nossos laboratórios. Tudo é trabalhado nos nossos laboratórios. Se o estudo de um determinado restaurante é para que um filete de robalo pese 200 gramas, isso tem que ser exatamente cumprido. A qualidade é muito importante para nós.
O pedido do cliente, normalmente chefs de cozinha, alguns de renome internacional, temos até chefs com 3 estrelas Michelin, é cumprido rigorosamente. O corte do peixe, o calibre, tudo vai exatamente como pretendido e entregamos tudo de madrugada diretamente no frigorífico do cliente em caixas de 3 ou 4 quilos.
O cliente quando chega de manhã ao seu restaurante ou à sua cozinha tem tudo preparado de antemão. Poupa imenso tempo, espaço e custos em mão de obra. Ter o peixe todo preparado e poder contar com a experiência dos nossos técnicos torna tudo muito mais simples. E é claro que isso paga-se.
Com tantas encomendas como é que não há atrasos na entrega dos produtos nos restaurantes?
O peixe aqui não se atrasa porque é processado logo na hora. Chega aqui à meia-noite. É calibrado, cortado, transformado, pesado e recondicionado em pequenas caixas e às 4, 5 da manhã está a ser entregue em alguns dos mais famosos restaurantes de Paris. Não perdemos tempo. Temos cerca de 120 empregados que o garantem. Temos colaboradores de várias nacionalidades, mas os portugueses estão em maioria.
Podemos então concluir que Paris tem bons restaurantes para comer peixe?
Paris e os arredores de Paris tem das maiores concentrações de restaurantes no mundo e de tudo o que tem a ver com a relevante e amplamente reconhecida cozinha francesa. O peixe da França também é dos mais famosos do mundo. Há muita variedade e isso reflete-se na cozinha francesa e na qualidade de restaurantes em Paris.
Depois de tanto crescimento ainda tem algum sonho que queira ver concretizado?
O meu sonho é continuar a construir uma empresa sã e com coração. Inspiro-me nas minhas raízes. Tenho aqui colaboradores que partilham as mesmas raízes que eu, são raízes profundas do nosso país. As recordações que temos de antes de emigrar, antes de haver internet, dos campos verdes, da água limpa a correr nos rios…as raízes foram importantes para mim, para ter coragem e dinamismo. Para saber sofrer desde início.
A dimensão não é importante, o importante é o equilíbrio e a estabilidade, ter uma empresa com uma dimensão de resultados que dê para pagar os encargos e para distribuir uma parte do benefício pelos 120 colaboradores e ainda tirar mais-valias para os seguros que são uma parte importante neste negócio. Nós trabalhamos com seguros de crédito com os fornecedores da Noruega, por exemplo, no valor de um milhão e 200 mil euros. É primordial haver estabilidade para poder pagar aos fornecedores.
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