A Abrunhoeste iniciou em 1997 a atividade de produção e comercialização de frutas. Implantada na região Oeste de Portugal, zona de produção frutícola por excelência, foi reconhecida em 2008 como cooperativa, reunindo atualmente 32 produtores, e tendo uma área de produção de cerca de 600 hectares. A empresa já ultrapassou os limites do Oeste e alargou a produção ao Alentejo e ao Algarve. Tendo como produto principal, a Pera Rocha, produz e comercializa igualmente maçã Royal Gala, ameixa, nectarina, laranja, comercializando ainda alguns legumes. Produtos que têm como destino, maioritariamente os mercados externos: a Abrunhoeste exporta mais de 90 por cento da sua produção e continua a abrir mercados, como afirmou o administrador José Paulo Duarte…
O que leva um empresário do ramo dos transportes, com uma empresa de referência nesse sector, a apostar no agro-alimentar, neste caso no sector das frutas?
Em 1974 o meu pai fez-me essa pergunta: “porque vais estudar para agronomia e não vais para gestão de empresas?”. E eu respondi: “vou para agronomia porque gosto de agricultura”. Portanto, a agronomia é uma paixão.
A Abrunhoeste surge no final dos anos 90. Por quê decidiu apostar nessa empresa?
Foi a maior casualidade do mundo. Uma pessoa que eu conhecia tinha a insolvência da empresa. Falei com dois amigos e comprámos a empresa ligada ao sector das frutas, era um sector que nesta região começava a ter alguma expressão, e portanto decidimos apostar. A partir daí, apareceu a oportunidade de começar a fazer produção própria com umas terras que tinha comprado. Achei que estava na altura, já tinha a parte comercial, de apostar na produção que é claramente a minha paixão. Esta região, como sabe, é muito forte em vinho, em fruta e hortícolas. Claramente é o que se conhece mais e o que se sabe mais. É uma área de que gosto.
Quando a adquiriu, a Abrunhoeste era já uma cooperativa?
Não, a Abrunhoeste é fundada por mim e por outros dois empresários, e depois trona-se uma cooperativa. Hoje temos 32 produtores connosco. No total, incluindo as áreas de produção dos nossos sócios, são cerca de 600 hectares. Nossos, temos à volta de 200 hectares distribuídos pelo Alentejo e pelo Oeste – 100 hectares em cada região.
Quantas toneladas de frutas produzem?
Não estamos ainda no máximo da produção, porque temos pomares novos. Mas, estes nossos 200 hectares, num ano agrícola que corre ‘normalmente’ produzem sempre entre 6 a 8 mil toneladas de fruta.
Também comercializam legumes?
Foram algumas vendas que fizemos para clientes que nos pediram. Não temos (produção), mas fizemos uma parceria com uma ou duas empresas, e portanto também já comercializámos couve e também cebola. São clientes que temos na área da fruta e que nos pedem também outros produtos. Como conhecemos o mercado, fazemos parcerias com empresas da região que conhecemos.
A Pera Rocha é o principal produto que comercializam?
Sim, mas somos também um dos grandes produtores de frutas de caroço. Aqui no Oeste temos bastante ameixa e no Alentejo temos ameixa, pêssego, nectarina, alperces, ou seja, praticamente toda a panóplia de frutas de caroço.
A produção da Abrunhoeste destina grande percentagem para o mercado externo?
Sim , mais de 90% da produção. Portanto, o nosso mercado é claramente a exportação. Foi uma opção nossa desde o princípio, porque o mercado interno está mais reduzido, são muito poucos os compradores em termos de quantidades. E nós não produzimos poucos quilos. Por exemplo, em Portugal não se come ameixa, o grande mercado de ameixa é a Inglaterra, para onde nós vendemos. Portanto, não estamos claramente, nem nunca faria um investimento, a pensar no mercado português, porque cada vez são menos compradores.
Tento em conta a produção nacional, há pouco consumo de fruta em Portugal?
Nós ainda temos muito para crescer em termos de consumo. Somos dos países da Europa que consome menos fruta/per capita, portanto, temos uma grande capacidade de progressão. Agora ninguém estaria ‘bom da cabeça’ em investir em Portugal a pensar vender apenas para Portugal. Por exemplo, Portugal se calhar consome 30% da pera que produz. Portanto, o resto é por exportação. É uma excelente pera que resiste a viagens e ao tempo.
A Pera Rocha é um produto com denominação de origem protegida (DOP)…
Sim. É isso que nós queremos valorizar na ANP (Associação nacional de Produtores de Pera Rocha), onde sou diretor. Queremos valorizar a Pera Rocha do Oeste como um DOP e porque já se produz peras em outros lados, esta nós queremos claramente distinguir.
Que apoios são necessários?
Para isso é preciso haver dinheiro e nós não estamos em anos fáceis. Por causa de preços, de quantidades, pela proibição na Europa da utilização de um produto de conservação que é aceite no mundo inteiro – e não sei se não estamos a receber esse produto de outras ‘latitudes’. O produto chama-se DPA, é utilizado para a conservação da pêra no mundo inteiro menos na Europa. É um problema gravíssimo para nós, para a exportação, porque fomos proibidos de o aplicar. Fui já à Comissão da Agricultura e o que pedimos foi que nos deixem aplicar na pera exportada para os países que aceitam a utilização desse produto.
Estamos a dar tiros nos pés, porque desde a proibição há um problema gravíssimo no Brasil: as peras são enviadas e uma, duas, três ou meia dúzia chegam com defeito ou podres, e eles querem logo devolver o contentor todo. Todos os exportadores para o Brasil têm tido este ano problemas dramáticos. A Europa proibiu a aplicação desse produto, mas para os países que não têm essa proibição nós podíamos aplica-lo. Mas até isso foi-nos proibido, e o que é que está a acontecer? Está a cortar completamente a exportação da pera, este ano foram estragadas milhares de toneladas de fruta. E os produtores também não conseguem receber o dinheiro que deveriam receber porque foi uma percentagem enorme de pera para o lixo.
A decisão passa por Bruxelas, mas acho que o Ministério da Agricultura tem poder para nos permitir aplicar (o produto) para exportação, é isso que nós pedimos, sabendo que não podemos vender para a Europa. Querem a nossa ajuda na exportação, mas damos ‘tiros nos pés’ e qualquer dia estamos ‘mortos’ completamente. Este é o drama da produção de pera rocha neste momento – a conservação, que durava 12 meses e neste momento quem pensar para além de 6 a 7meses dificilmente terá peras.
Para onde exportam?
Os nossos principais mercados na europa são Inglaterra e Irlanda, mas vendemos ainda para França. Fora da Europa, exportamos para Brasil e Marrocos basicamente.
Os objetivos passam por consolidar a presença nesses mercados ou exportar para outros países?
Estamos a abrir mercados, mas não é muito fácil abri-los. Tem feito um bom trabalho, o atual secretário de Estado da Agricultura. Tem aberto muitos mercados a produtos alimentares, entre eles a fruta e é isto que nós precisamos: que em termos governamentais se dê o passo para que possamos ter autorização para exportarmos para outros países. Porque há normas a cumprir, há acordos entre países para assinar e enquanto não tiverem esses acordos concluídos não conseguimos exportar. Este ano entrámos pela primeira vez no Dubai e na Argélia, e já estamos a vender para esses países, que abrem portas a outros mercados.
Há mais procura por frutas de origem portuguesa?
Há, claramente. Mas digo sempre que em casa não se faz negócio, é preciso ir oferecer. Se alguém pensa que vêm-nos cá bater à porta, ninguém aparece, temos é que ir aos potenciais clientes. Isso custa dinheiro e tempo, mas tem de se investir. E esse é o caso do sucesso do SISAB Portugal, porque tem a ver com a captação que o SISAB consegue de potenciais clientes. E porque tem sido bom para os expositores, com certeza que lá estão e continuarão. Porque é preciso fazer esse trabalho de dar a conhecer os nossos produtos.
Foi eleito, em 2012, Empresário Agrícola do Ano. Que importância teve esse reconhecimento?
Toda a gente gosta de ser reconhecido, um investidor mais ainda. Teve a ver com o investimento que nos fizemos na agricultura, uma área que nem é o nosso principal negócio. Já investi bastante, continuo a investir em coisas diferentes, em modos diferentes e fizemos alguma diferença no sector da fruta, com novas variedades. Estamos a produzir no Algarve já em termos experimentais. Nós queremos produzir fruta desde o Algarve e Alentejo até ao Oeste. No Algarve, onde a produção é mais precoce, produzimos fruta de caroço, no Alentejo produzimos fruta de caroço e peras.
É neste tipo de frutas que queremos investir e que nos dá também os nossos clientes ingleses e irlandeses, que vêm cá e veem-nos a produzir o que eles querem. Estamos com novas variedades, temos praticamente cinco meses de apanha de fruta de caroço, todos os dias. Isso faz com que o cliente prefira uma pessoa que tenha cinco meses de apanha, do que um que tenha 15 dias de uma variedade só. Nós temos dezenas de variedades, que vamos apanhando todas as semanas.
Fale-nos dessas variedades…
Por cada nectarina temos muitas variedades, quantos aos pêssegos e às ameixas, é a mesma coisa. Dentro de cada categoria temos mais de 10 variedades. E as variedades têm a ver com o tempo de apanha. A campanha vai de maio até Setembro. Na apanha, no forte, por dia, temos entre 130 a 160 pessoas e na central estamos com 100 pessoas.
Por que investimentos passa o futuro da Abrunhoeste?
O futuro próximo passa, dentro da nossa gama de produtos, por haver outros produtos que vão aparecendo sempre dentro destas variedades que foram desenvolvidas. Em relação ao investimento, vamos manter uma aposta no investimento na produção.
A área da agricultura é para si, uma paixão, não deixando de parte o sector dos transportes…
A área dos transportes é a minha vida. Foi o meu pai que iniciou essa atividade em 1946 e a Transportes Paulo Duarte foi criada em 1967. Portanto já vamos fazer quase 70 anos de existência. Os meus filhos já cá estão a trabalhar, e tenho assim mais tempo para me dedicar à agricultura e à produção de fruta.
O que diferencia as frutas portuguesas?
Nós temos uma produção crescente de Pera Rocha. Porque é um produto de longa duração e para um supermercado, ter uma pera que aguente o dobro ou triplo do tempo na prateleira, evidentemente é muito melhor, porque não tem o desperdício. Depois temos outros factores: a nossa maçã é excelente, temos um ótimo clima. A nossa ameixa também tem uma qualidade muito maior que a espanhola, por uma razão simples: estamos a produzir ameixa há poucos anos, os terrenos ainda estão praticamente virgens. Eles já produzem industrialmente há 50 anos, por isso os terrenos estão completamente esgotados e a ameixa já não sabe a nada. Temos claramente uma melhor qualidade, o nosso clima não difere muito do espanhol portanto não será por aí. Para mim, será claramente a diferença da utilização dos solos que eles têm há tantos anos e nós não. Portanto, temos claramente uma qualidade muito superior em fruta de caroço.
E a nossa laranja?
A nossa laranja, para mim, é claramente a melhor laranja do mundo, nunca comi laranja melhor do que esta. Já tive clientes franceses que pediam-nos se podíamos levar a laranja do Algarve para ele verem. Experimentaram e a partir daí nunca quiseram mais nenhuma laranja sem ser a do Algarve. E aí é que se nota bem a diferença da qualidade dos terrenos. Já comeu uma laranja espanhola que amarga, só sabe a adubo, porque as terras estão tão juntadas. Só são alimentadas artificialmente por água em nutrientes que vão na irrigação e portanto ficam aquele sabor.
Com produtos tão bons, o que falta?
Há falta de produção, nós não oferecemos grandes quantidades, porque Portugal não tem. Não nos podemos comparar com os maiores produtores de fruta da Europa que produzem quantidades industriais e não agrícolas. E falta claramente divulgar, divulgar, divulgar (os produtos) e o caminho que está a ser percorrido não é fácil, porque é preciso gastar muito dinheiro, e os tempos não estão fáceis.
E já há mutos jovens agricultores. A agricultura sempre foi vista como um trabalho de terceiro mundo, e claramente não é. Para toda a gente que está na agricultura, este é um trabalho de paixão. É preciso gostar claramente mas é um trabalho muito apetecível e na agricultura o que é preciso particularmente é ser-se empresário, não apenas agricultor. A agricultura é um negócio claramente de dimensão empresarial, e tem que se ver isto com todos os custos de A a Z: como é que se pode vender, a que preço se pode vender, tem de se ter bem a noção dos mercados.
É um negócio de risco?
É um negócio de algum risco, como é evidente. Para fazer qualquer pomar, para começar a produzir em pleno são necessários quatro a cinco anos e investir muito dinheiro. Agora imagine que, nesse tempo, alguém diz que esta fruta faz bem ou faz mal. Imagine um cenário destes. É diferente de uma campanha anual de vegetais ou de legumes porque são investimentos muito mais pequenos e limitados no tempo. Portanto este é um investimento para 20, 30 anos, é duro.
Mas é por outro lado, um negócio de futuro…
Sabendo que há cada vez mais a tendência do ‘coma bem e saudável’, isto entra nos ouvidos de qualquer pessoa. Há programas escolares nesse sentido que são feitos recentemente em Portugal mas que noutros países da Europa existem há mais tempo.
Em Inglaterra, por exemplo, criaram há mais de 20 anos o ‘Eat five a day’ (Coma 5 peças de fruta por dia). É uma tendência que começa logo com os miúdos de 4 a 6 anos e isto faz toda a diferença. Habituam-se a comer todos os dias fruta e isto vem de acordo com o investimento do país em termos de saúde.
Como há ainda bastante capacidade de investimento, tanto em Portugal como no resto da Europa, achamos que o sector da fruta vai crescer em termos de futuro.
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