Um estudo internacional liderado pelo investigador Jorge Almeida, da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra (UC), que tem como base a capacidade de modificação do cérebro dos surdos congénitos, pode ser determinante para novas terapêuticas de lesões cerebrais e doenças neurodegenerativas e para o desenvolvimento de implantes cocleares mais eficazes.
Os cérebros dos surdos congénitos têm uma grande capacidade de se modificarem, no seu cortex auditivo, alojando propriedades típicas do cortex visual, revela um estudo internacional liderado pelo investigador Jorge Almeida, da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra (UC).
O estudo terá os seus resultados publicados na ‘Psychological Science’, “revista internacional de referência na área da psicologia”, já que poderão ser determinantes “para explorar novas abordagens terapêuticas para tratar lesões cerebrais e doenças neurodegenerativas baseadas na neuroplasticidade (capacidade do cérebro se modificar), e serão centrais para o desenvolvimento de novas gerações de implantes cocleares mais eficazes”, revela a UC, numa nota divulgada no dia 7 deste mês.
Jorge Almeida explica que os atuais dispositivos “estão pensados para explorar a organização típica do córtex auditivo, mas o estudo provou alterações na estrutura, passando o córtex auditivo a deter informação relativa à visão”. “Será assim necessário repensar a conceção dos implantes cocleares de modo a que estes explorem também a nova organização cerebral”, acrescenta.
Quatro anos de investigação
O estudo foi realizado ao longo dos últimos quatro anos e envolveu um grupo de surdos congénitos e um grupo de pessoas sem surdez, originários da China.
Para perceber os mecanismos de receção e reação do córtex auditivo, os dois grupos receberam diferentes estímulos visuais durante a realização de uma ressonância magnética. Os investigadores perceberam que no caso dos surdos, “o córtex auditivo herda o tipo de processos e potencialmente organização que vemos no córtex visual dos normo-ouvintes”.
Estas modificações “deverão ser responsáveis pela perceção visual periférica superior normalmente apresentada por surdos congénitos”, explica Jorge Almeida, sublinhando que o entendimento dos “mecanismos que o sistema nervoso central dispõe para se ‘reprogramar’, modificando o funcionamento do cérebro, é essencial para o desenvolvimento de modelos que expliquem o fenómeno de neuroplasticidade a longo-prazo”.
Ou seja, para a compreensão do modo como o cérebro se transforma e adapta a longo prazo, e para a aplicação de terapias baseadas nestes modelos, conclui o líder do estudo, que contou ainda com a participação de investigadores da Universidade do Minho, de duas universidades chinesas e uma dos Estados Unidos da América e foi financiado pela Fundação BIAL e por uma bolsa Marie-Curie (na primeira fase). A equipa pretende agora avançar com novos estudos em Portugal para explorar mais aprofundadamente a neuroplasticiadade na surdez.