Luso eleitos são uma realidade “que tem que ser conhecida e valorizada”

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A 29 e 30 de janeiro, a Assembleia da República e o concelho de Cascais acolheram a terceira edição do Encontro Mundial de Luso-Eleitos, que reuniu portugueses e luso-descendentes, que ocupam as mais variadas responsabilidades políticas, num evento organizado em parceria pelo jornal «Mundo Português» e pela Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, com o apoio da Câmara Municipal de Cascais. E foram vários os temas apresentados, desde a participação cívica e política dos portugueses residentes no estrangeiro, a uma maior e mais efetiva ligação a Portugal, passando pela necessidade destes políticos e ascendência portuguesa, criarem uma plataforma comum de comunicação.

No âmbito das comemorações dos seus 45 anos, o jornal «Mundo Português« organizou a terceira edição do Encontro Mundial de Luso-Eleitos que decorreu entre Lisboa e Cascais e reuniu alguns dos “nossos” políticos eleitos no mundo, cuja importância na afirmação de cidadania aumenta cada vez mais nos respetivos países de acolhimento.
O encontro visou reunir políticos que partilham a mesma ascendência e uma língua materna comum, para que trocassem experiências governativas e dessem a conhecer o seu trabalho político. Trabalho que nuns casos conta já com o apoio e a participação cívica e política da comunidade portuguesa que os rodeia, mas que noutros advém muito mais do voto dos nacionais dos países onde residem, do que dos seus conterrâneos portugueses.
Essa foi uma das questões referidas ao «Mundo Português» por vários dos luso-eleitos presentes. Outra, unânime, foi a necessidade de criarem uma plataforma que os reúna a nível mundial que entre outros aspectos, lhes dê maior visibilidade junto dos meios políticos em Portugal, como defendeu durante os trabalhos, o secretário de Estado Adjunto do ministro adjunto e do Desenvolvimento regional. Para Pedro Lomba, o universo dos portugueses e luso-descendentes eleitos para cargos políticos nos países onde residem, assim como os empresários, quadros lusos e estudantes universitários na diáspora, “são uma realidade que tem que ser conhecida e valorizada”.

Luso-eleitos já são uma força em França
Com uma carreira política iniciada em 1989, e reeleito em Aulnay Sous Bois, o luso-francês Paulo Marques foi o fundador, em 2000, da Civica, associação que reúne autarcas de origem portuguesa em França e que já tem representantes em outros países, como os Estados Unidos, Brasil e Macau (China).
A eleição de março de 2001 foi a primeira em que os portugueses residentes em França e sem nacionalidade francesa, puderam tanto candidatar-se às autárquicas, como votar. Nessa altura, a Civica, realizou uma campanha de informação e incentivo à participação cívica e política no país. “Foi um objetivo que atingimos, através de várias campanhas de informação, da integração de membros da comunidade portuguesa em listas de candidatos eleitorais para várias autarquias. Este trabalho que continuou ao longo dos últimos 15 anos, permitiu-nos contribuir para o resultado positivo obtido nas eleições municipais de março de 2014: mais de dez mil candidatos de origem portuguesa em toda a França, com um impressionante número de participação de mulheres, num país com 36.679 câmaras municipais”, destaca Paulo Marques.
Uma participação que o luso-eleito traduz em números. “Em 2008 eram quase 3.000 os portugueses e luso-franceses eleitos, mas pensamos que agora serão perto de 4.000 os eleitos de origem portuguesa”, avança o conselheiro municipal e responsável pelas Relações Internacionais na câmara de Aulnay-sous-Bois, e um dos quatro luso-descendentes eleitos em 2014 para aquela autarquia – a sétima da grande Paris, com 83 mil habitantes, dos quais mais de 10 mil são portugueses e luso-franceses.
O autarca conta que no final dos anos 80, a comunidade portuguesa e o movimento associativo luso em Aulnay sous Bois, fizeram saber junto do presidente da câmara que apesar de os portugueses não poderem votar, havia já uma segunda geração, constituída por um grande número de luso-franceses que atingiram a maioridade e já votavam. Começou ali o envolvimento cívico e político de uma comunidade que em 2013 viu “o número de eleitores e de inscritos (recenseados para votar) portugueses aumentar brutalmente”.
“Foi natural o envolvimento local desde 1989 e com o sucesso que se viu: a atual câmara, constituída nas eleições de março de 2014, tem duas vice-presidentes e dois vereadores saídos da comunidade portuguesa, que é o melhor resultado de sempre numa câmara com uma forte população ativa e mobilizadora”, revela o vereador assegurando que os quatro luso-eleitos naquela cidade ganharam as eleições “graças à participação da comunidade portuguesa”.
Por tudo isso, diz ser “fulcral” a existência de um encontro que reúne luso-eleitos de todo o mundo, por permitir conhecerem-se e partilharem experiências. “É importante para conhecermos os locais que cada um representa, para Portugal nos conhecer e para permitir alguma cooperação transversal entre luso-eleitos. E ainda a criação de alguma dinâmica em prol das câmaras onde estamos e de Portugal”, defende Paulo Marques, que foi eleito pela UMP.

Luso-eleitos querem rede mundial
Opinião similar tem Carlos Manuel Dias da Rocha, eleito na África do Sul. “Este encontro é importante porque nos dá a oportunidade de conhecer colegas noutras partes do mundo. Iniciativas destas deviam ter um caráter regular, sobretudo para podermos aprender com os outros e trocar experiências. É um evento de sucesso e importante”, diz o político eleito em 2011.
Carlos da Rocha defende ainda que cabe a Portugal “aproveitar mais” esta rede de portugueses que exercem cargos nos governos, autarquias e outras instituições no estrangeiro. “Portugal devia aproveitar estes homens e mulheres também para chegar mais perto não só dos países onde são exercidos estes cargos, como também dos portugueses dessa comunidade”, afirma o vereador da Câmara Municipal de Joanesburgo, um cargo que o mantém constantemente próximo dos seus eleitores. “Nós somos a voz da população”, assegura.
Uma rede que Daniel da Ponte afirma ter que surgir da vontade e do trabalho a desenvolver pelos próprios luso-eleitos, sem estarem à espera “que o governo português tenha a responsabilidade de criar esta rede.”
Nascido nos Estados Unidos, filho de açorianos das ilhas de São Miguel e Santa Maria, e eleito pela primeira vez em 1998, o político americano diz ter “esperança” que esta rede seja criada e aponta vários motivos. “Para começar, no mundo em que vivemos, com a globalização, podemos beneficiar de meios que não existiam até há alguns anos atrás. Segundo, como as economias vão cada vez mais à procura de novos tipos de investimentos e de investidores, numa forma de pensar ‘outside the box’, existem grandes oportunidades. Mas também é certo que não podemos ter conversas num encontro destes e ficar à espera que as coisas aconteçam”, alerta o senador no estado norte-americano de Rhode Island e presidente da Comissão de Finanças daquele senado estadual. O político luso-americano afirma por isso que cabe a esses políticos de ascendência lusa e ativistas nas comunidades portuguesas, começarem a se “organizar e a fazer algum trabalho”. “Estes encontros são ótimos para nos podermos juntar, para facilitar o diálogo, mas o trabalho de campo depende de nós”, assegura Daniel da Ponte que defende a criação, inicialmente, “de um grupo de trabalho com representantes de cada país, para dar início a alguma ideia concreta”.

O peso da comunidade
A exercer o segundo mandato como vereadora em Saint Etienne, onde há cerca de seis mil famílias portuguesas, para uma população de 500 mil habitantes na área metropolitana, Alexandra Custódio revela que serão “mais de 20 mil portugueses” os que residem no seu círculo eleitoral. Portugueses que em França têm “uma imagem de lutadores”, por serem uma referência “na maneira de lutar por uma melhor vida e na forma como nos integramos”, sublinhou a vereadora.
Uma imagem que existe também na cidade onde reside, mas apesar desse nível de integração, Alexandra Custódio lamenta que a comunidade que integra em Saint Etienne, ainda não tenha, por outro lado, o nível da participação política que pode alcançar. “Digo sempre que fui eleita com os votos dos franceses, porque quanto aos portugueses inscritos nos cadernos eleitorais, lamento serem muito poucos. Enquanto não houver uma mobilização da comunidade portuguesa para podermos agir em favor da comunidade, o nosso papel só tem a legitimidade que os franceses nos deram. E isso lamento eu”, afirmou a vereadora que é também, desde 2009, presidente do Portugal Business Club de Saint-Etienne, um organismo que reúne os empresários portugueses e luso-franceses daquela região.
A fraca participação política de grande parte das comunidades portuguesas foi um dos temas discutidos pelos luso-eleitos que, por essas e outras questões, defendem a criação da plataforma que os agregue a nível mundial e que poderá sair desta terceira edição do Encontro, que, para Alexandra Custódio criou uma grande mobilização dos políticos presentes. “Criamos uma dinâmica, estou a ver muita mobilização, mais energia do que no primeiro encontro. Acredito que projetos concretos vão sair deste Encontro, que têm que passar à ação. Sinto que vão existir mais trabalhos em conjunto a partir desta edição”, assegura a vereadora em França, que quer passar “das palavras aos atos”. “Já temos o projeto para criarmos concretamente uma plataforma de luso-eleitos para podermos partilhar experiências e projetos que cada um tem realizado, e podermos ajudar-nos uns aos outros a implementar a ação portuguesa nos nossos locais. Queremos passar das palavras aos atos”, afirma.

Carlos Carreiras
“Continuem a acreditar em Portugal”
Presidente da câmara do município que acolheu o segundo dia do Encontro, Carlos Carreiras elogiou a iniciativa do «Mundo Português», lembrando que Cascais a apoiou “de forma entusiástica” desde a primeira edição por reconhecerem “a vantagem que há em manter estas relações”. E desafiou os luso-eleitos presentes a regressarem aos seus países também como ‘embaixadores’ de Cascais, o quinto maior concelho do país, onde residem cerca de 208 mil pessoas, e o quarto destino turístico nacional, que está a celebrar os 650 anos do foral atribuído à vila sede do concelho.
“Por isso queremos deixar uma marca positiva. Sabemos que não mudamos o mundo a partir da nossa vila, mas também sabemos que o somatório das nossas pequenas ações individuais pode ter um impacto global extremamente positivo. Temos por isso a ambição de Cascais ser o melhor lugar do mundo para viver um dia, uma semana ou a vida inteira”, reforçou o autarca social-democrata, que considerou os luso-eleitos “notáveis herdeiros desta tradição portuguesa de genuína boa vontade os assuntos do mundo”. “São fiéis depositários da mais importante de todas as confianças, a confiança política que existe na relação entre o eleito e o eleitor. Reafirmo o apelo para que nunca percam esta capacidade que é vossa e tão nossa enquanto portugueses. Onde quer que estejam, continuem a servir os valores da liberdade e do diálogo entre os povos, continuem ao serviço da ideia de uma só comunidade que também foi cunhada por nós portugueses”, sublinhou Carlos Carreiras, que apelou ainda à continuidade da relação que estes políticos têm com Portugal. “Continuem a acreditar em Portugal, na nossa história, na nossa identidade. Porque se todos vocês acreditaram serão uma força mobilizadora de fazer com que muitos outros também continuem a acreditar”, afirmou.

Ricardo Baptista Leite
“Portugal é mais do que o continente e as ilhas, é o seu posicionamento neste mundo global”
Ricardo Baptista Leite fez um percurso inverso ao dos participantes no III Encontro Mundial de Luso-Eleitos. Filho de portugueses, nasceu em Toronto, Canadá, veio para Portugal com 11 anos e aqui passou a viver. Médico de profissão, é desde 2011 deputado à Assembleia da República pelo Partido Social Democrata (PSD), eleito pelo círculo eleitoral de Lisboa e presidente do Grupo Parlamentar de Amizade Portugal-Canadá. Integra ainda as Comissões Parlamentares de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas e de Saúde, além de coordenar o Grupo de Trabalho – Acompanhamento da Problemática do VIH-Sida.
À semelhança das edições anteriores, marcou presença no III Encontro por achar que “Portugal é mais do que o continente e as ilhas, Portugal é o seu posicionamento neste mundo hoje global”. “Temos aqui uma massa crítica gigantesca que temos que aproveitar: os nossos recursos humanos que estão dispersos por todo o mundo e que partilham este amor pela lusofonia”, afirmou o parlamentar,  defendendo que se Portugal for capaz de o fazer, “será melhor para todos na defesa da nossa cultura, dos nossos valores, e podermos garantir que aquilo que nos faz portugueses pode passar de geração em geração, mesmo além-fronteiras”. Uma ligação que Ricardo Baptista Leite considera importante igualmente no setor económico.“Há a perspetiva económica das empresas portuguesas de cá que podem exportar para novos mercados ou para o chamado mercado da saudade. Mas também para apoiar as empresas de origem portuguesa, sedeadas por esse mundo fora, podendo ajudá-las a reencontrar a Europa, a reencontrar Portugal. Podemos fortalecer estes laços económicos que são importantes não só para os vários empresários e os seus trabalhadores, mas também para o próprio país”, afirmou.

Clique neste link para ver o vídeo do III Encontro: https://www.youtube.com/embed/BKzYKTtxV3o

 

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