O tempo é de férias, mas numa aldeia de Bragança a escola permaneceu aberta, com mestres do mundo rural a partilharem saberes e lições da vida do campo em troca de carinho e da alegria das crianças. Portela é uma Aldeia Pedagógica que está a tentar lutar contra o desaparecimento das tradições ancestrais…
Na aldeia, junto a Bragança, “não há quase crianças” e é “um orgulho” ver por ali tantas para o mestre Hermínio Tomé, de 74 anos, que num dia de final de julho, mostrava a horta aos 55 meninos, dos três aos cinco anos, do Colégio do Sagrado Coração de Jesus de Bragança. “Quantas mais vierem melhor. Para mim, é um orgulho ver por aqui estas crianças”, destacava.
Já Maria Adelina, com 78 anos tem as galinhas mais famosas da aldeia e nas muitas visitas ao seu galinheiro nunca viu “miúdos tão terríveis”, que é como quem diz: destemidos.
“Os que têm vindo, parece que lhes tinham medo. Estes não”, contou. Nem dos animais nem medo de fazer perguntas como a de um petiz que quis saber o que as galinhas fazem à noite. “Dormem como nós”, explicou a mestre.
Nova vida para Portela
Esta Aldeia Pedagógica é um projeto da Azimute, uma associação de jovens para dinamizar a aldeia, com preocupações sociais e ambientais e sede na antiga escola primária, que fechou por falta de crianças.
“Isto dá alegria aqui ao povo. A gente aqui não tem miúdo nenhum, quando eles vêm, parece que encontramos outra alegria”, garantiu Adelina.
Há “meia dúzia de anos” que Rosário Rodrigues anda a fazer pão para as crianças verem. Mais uma vez, esta mestre de 68 anos levou uma manhã inteira a amassar, aquecer o forno e a cozer, ajudada pelos pequenos “padeiros” enfarinhados das brincadeiras e extasiados por meterem a mão na massa.
“Eu faço, não estou aqui para falar”, ripostou a mestre padeira, pouco apreciadora de perguntas dos jornalistas, mas que, perante o frenesi da pequenada, esquece imediatamente o desconforto do mediatismo e o calor do forno associado ao tórrido verão transmontano. “É bom para as crianças e para a aldeia que é movimento e movimento é vida”, constata.
O pátio de Rosário é um mundo de descobertas para os mais novos que tocam nos coelhos, vêem as galinhas, afagam os cães e até brincam com a porca.
Mal chegou à aldeia, Fábio notou logo a diferença: “há muitas mais hortas, mais árvores”. Gostava de “viver na aldeia porque tem animais” e ele gosta da natureza e a crise até lhe deu uma ajuda: “este ano não posso ir de férias e então vou para a Aveleda”, outra aldeia, a da família, onde descansará no verão ao lado do rio.
Algumas destas crianças vivem na cidade mas têm ligação à aldeia, ainda assim a visita à Portela é “uma vivência diferente” na opinião das educadoras Lídia Augusto e Ana Luísa Vaz.
Já por ali passaram mais de 700 crianças, segundo o presidente da Azimute, João Cameira que, quando pensou o projeto fez um inquérito às pessoas da aldeia para saber o que estavam disponíveis a ensinar e perceber se teriam de receber alguma coisa.
“A maioria respondeu carinho e outras atenção. E é isso que lhe damos”, contou. “Também se perdeu muito a ligação entre as crianças e os mais velhos – os avós – e aqui também tentamos que esses laços sejam reforçados”, sublinhou.
O projeto é financiado pelas fundações Calouste Gulbenkian e Montepio Geral e quer tornar-se sustentável com receitas próprias das visitas e da venda de produtos feitos na aldeia.