ANTÓNIO FRIAS MARQUES: “O IMI deve ser um imposto que não custe a pagar”

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A Associação Nacional de Proprietários (ANP) representa cerca de 10 mil senhorios, sensivelmente metade no Norte e metade no Sul, a maioria pequenos proprietários. Sediada na Rua D. Pedro V no Bairro Alto em Lisboa, presta assistência jurídica, assessoria fiscal aos seus associados, informações úteis (aumentos de renda, etc.) assim como a gestão de propriedades e administração de condomínios. Nesta entrevista, António Manuel Frias, presidente da associação portuguesa de proprietários, falou ao Emigrante/Mundo Português sobre o mercado habitacional em Portugal e todos os problemas que o mesmo encerra, antes da lei das rendas ter sido publicada…

Esta associação congrega associados donos de prédios, de ruas inteiras e até de quarteirões, mas também aqueles que são apenas donos do andar que habitam. Em Portugal há milhares de proprietários emigrados que investiram as suas poupanças em apartamentos que tem arrendados. Portugal é, aliás, um dos países onde a taxa de proprietários é das mais elevadas. A nossa cultura leva-nos a ter a nossa própria casa, mas nos dias que correm, muita coisa está a mudar neste capítulo, sendo a aposta no arrendamento uma solução apontada. Para já, na Europa, só a Espanha tem mais proprietários de imóveis que Portugal…

MP- Como está o panorama do país em termos de habitação, em que de um momento para o outro nas cidades, vilas e aldeias se encontram tantos letreiros “vende-se”?
AFM- Nós em Portugal grosso modo, como residentes somos 10 milhões de habitantes. Em média cada família tem 2,5 pessoas, portanto calcula-se que para essas pessoas são precisos 4 milhões de alojamentos, como estão construídos seis milhões de alojamentos, há excesso de oferta e,  portanto eu pasmo como ninguém reparou nisto. Sabemos que destes,  4 milhões de agregados familiares usufrui de uma segunda habitação, portanto sobrará em números redondos um milhão de alojamentos, daí que haja 800 mil casas para venda no país e cerca de 65 mil para arrendar. Não é de admirar o excesso de oferta.
Um milhão de alojamentos é muito dinheiro investido. Existem urbanizações inteiras vagas. No interior e motivado pelo êxodo da população e emigração há aldeias a acabar, em que está tudo à venda. A emigração quando decide comprar já não compra na sua terra natal, mas investem nas cidades e mais no litoral. Todos sabemos que foram eles, os que emigraram, os maiores investidores na compra e construção de habitação em Portugal, mas presentemente não temos habitantes para tantas casas.
MP- Os  mais de cinco milhões de portugueses e luso descendentes residentes fora de Portugal, apesar de terem a sua habitação, ainda serão uma “tábua de salvação”nas vendas de imobiliário em  Portugal, mesmo como forma de rentabilização das suas  poupanças, pela segurança de investir em bens imóveis? O governo, não está a ser sensível e,  em termos de IMI preparava-se a taxar os que tem imóveis em Portugal e que residem nos ditos “países – paraísos fiscais” com taxas de IMI gravosas. O que nos diz sobre isto?
AFM- Temos uma lista em Portugal com pelo menos sessenta países com regime fiscal favorável e, quem faz as leis não sabe que há portugueses lá fora e que tem casas em Portugal e vai daí consideram Andorra como países de regime fiscal benéfico ( o que nem isso é verdade – já foi) e então os nossos compatriotas que lá trabalham, viram-se bafejados com o IMI agravado de 0,5 para 7,5%. Isto é um exemplo de uma loucura e só terem-se lembrado disso, é uma coisa fora do comum, uma barbaridade! Depois lá teve que vir a Assembleia da República legislar em sentido contrário, mas que os avisos de pagamento foram emitidos foram. Isto é desconhecer a realidade dos portugueses que vivem lá fora. Outro exemplo é os portugueses que vivem nas Ilhas Jersey. Isto não pode acontecer!

Comprar para investimento e aposta no arrendamento. Há segurança no arrendamento em Portugal? Temos lei que proteja os que investem para arrendar?

A segurança é pouca, daí que os que vivem lá fora, tenham receio de arrendar. Aluga-se e depois deparam-se com os sub alugueres,  inquilinos que deixam de pagar as rendas,  que dão prejuízo nas habitações,  que deixam de pagar a electricidade, água e gás, quando os arrendamentos são feitos com os contratos do gás, água e luz em nome dos donos. O que aconselhamos em geral, aos nossos associados é de não fazerem nenhum contrato com ninguém sem exigir primeiro um fiador. Se o fiador for casado a esposa do fiador também tem que assinar, ou vice-versa. Se não houver fiador pode exigir uma garantia bancária e independentemente disso obter informações sobre o inquilino, que depois de o meter dentro de casa é muito difícil tirá-lo. Era difícil com a antiga lei e com a nova, só nos pronunciamos depois da mesma ter dado provas. Deve ser-lhe pedida a declaração de rendimentos, o IRS, pois se não tiver rendimentos declarados, não poderá pagar uma renda. De renda de casa ninguém pode pagar mais do que 1/3 dos seus rendimentos, no limite dos limites (33%) do que ganha. Conhecemos senhorios que arrendaram casas por metade do rendimento mensal dos inquilinos.  Se ganha mil euros não pode ter uma renda superior a 300 euros. Já sabe que mais tarde ou mais cedo esse arrendatário vai entrar em incumprimento. Também os inquilinos não podem aspirar a ter uma casa barata. Se um quarto em Lisboa ronda os 250 euros, não pode aspirar a ter uma casa por menos de 500 euros. Portanto tudo tem que ser bem avaliado e ponderado, pelas duas partes.  Nós só defendemos o arrendamento legal, com registo nas finanças e em que tudo é declarado. Se os senhorios não tiverem esse cuidado, irão ter muitos problemas e despesas para reaver o seu bem.

Qual a pergunta mais frequente feita à ANP nos tempos que correm?
As pessoas perguntam um bocado de tudo. Despejos de inquilinos que não pagam a renda são das perguntas mais frequentes, em que se tem que recorrer aos tribunais, que como sabemos estão “entulhados” de processos. Defendemos que deviam ser os julgados de paz, que funcionam bem em Portugal e em que não se precisa de advogado e onde se paga só 75 euros de taxa de justiça a ter poderes para “despejar” os inquilinos faltosos. Os julgados de paz tem poderes sobre as relações entre senhorio e inquilino, mas não podem decretar o despejo, só o tribunal. Devido ao excesso de processos em tribunal, o senhorio não recebe a casa de volta e o inquilino continua a ocupá-la sem pagar. Portanto é urgente mudar estas leis.

A avaliação de imóveis em curso vai trazer grandes alterações em termos de IMI – Imposto Municipal sobre Imóveis?
Várias vezes escrevemos ao Ministro das Finanças, deste e do anterior governo, que tinha que haver uma avaliação do património, pois não fazia sentido, por exemplo, haver andares no mesmo prédio, em que por motivo de uma herança, tinha havido novas avaliações e um proprietário pagasse mil euros e o vizinho do lado, que não teve alterações algumas pagasse 50 euros. Casos desses são aos milhares e isto não é correto. Nós no entanto contestamos a fórmula com se calcula o IMI. Aliás contestamos o IMI, que  é um imposto que consideramos absurdo! É uma invenção da ministra das Finanças (Manuela Ferreira Leite), em 2003, que não incide nem sobre o rendimento, nem sobre consumo. Haver impostos sobre o património, custa a engolir. A haver  impostos deve ser sobre o rendimento e consumo!
Interrogamo-nos sobre porque havemos de pagar sobre uma coisa que não rende, antes pelo contrário, só dá despesa. O IMI deve ser um imposto que não custe a pagar, e propusemos que todos pagassem um pouco mais, porém  verificamos que este governo, arranjou uma fórmula completamente enviesada e absurda, em que entram uma série de fatores, entre eles o preço por metro quadrado, que é neste momento de 603 euros. Quando começou, em 2004, era de 600 euros e chegou a atingir um pico máximo de 615 euros, por volta de 2006. Estávamos numa época em que as pessoas que fazem as leis julgavam que as árvores cresciam até ao céu. Comprava-se um apartamento por 50 mil euros – se pedissem 60 mil também davam –, e o banco até lhe dizia para levar mais dez mil para comprar a mobília. Só que em 2008 as Finanças tiveram de baixar o preço do metro quadrado, que está hoje muito perto do valor inicial.
Hoje estamos a assistir ao absurdo em que o valor do imobiliário está em queda livre – porque o imobiliário vale zero, (só vale quando se consegue vender e não há compradores) –, e os valores patrimoniais e fiscais que estão a ser encontrados estão muito acima do hipotético valor real do andar. Ou seja, estou a pagar mais por uma coisa que não vale nada, porque não a consigo vender.  A avaliação que está a ser feita, e que tinha dez anos para ser feita, ao que parece vai estar concluída no prazo previsto, que é 2013.
Como é que as Finanças, num momento em que este setor está colapsado, têm o atrevimento de estar a valorizar imóveis com uma fórmula pretensamente científica que permite chegar a estes valores? Prédios a valor até cinco mais, ou seja uma receita para o Estado (autarquias) em 2015 que era de 1 milhão duzentos tal mil euros passará para cinco milhões. Quando apresentámos esse problema ao Ministro das Finanças disse-nos que não! Então vai aumentar para quanto? Ninguém sabe, mas as notificações que estão a enviar são feitas de uma forma capciosa, para as pessoas não entrarem em revolta. Em Portugal, as pessoas recebem uma notificação que diz qual é o valor patrimonial do imóvel mas abstêm-se de dizer quanto é que ela vai pagar de IMI em 2013, só fazendo as contas. E as pessoas, às vezes, custa-lhes fazer contas. Para nós, e para as coisas serem clarinhas e esclarecedoras, se o imóvel tem um valor patrimonial de 50 mil euros é dizer que para o ano o valor a pagar é 250 euros, aplicando a taxa máxima.

Todas as câmaras aplicam a taxa máxima?
Quase todas as câmaras aplicam a taxa máxima. Em Lisboa, a taxa máxima que agora é de 0,7, eles cobram 0,675. Mas as necessidades de financiamento da câmaras são muitas e as grandes fontes de receita, que eram as licenças de construção e o IMT – Imposto Municipal de Transmissões, estão em quebra, pelo que sobra o IMI, que é o que vai servir para pagar as estruturas camarárias. Em muitos concelhos do país as câmaras são o principal empregador, e isso é pago pelo munícipes.

As pessoas já perceberam que vão ter de pagar muito mais IMI?
Não. Quando interiorizarem vão cair para o lado. Nós temos um inquérito permanente aos nossos associados para monitorizar a média dos aumentos e posso dizer-lhe que quando o valor patrimonial passa para o triplo a pessoa pode dar-se por muito satisfeita, porque quer dizer que vai pagar cerca do dobro do IMI. Mas estamos a assistir a casos em que o IMI aumenta vinte vezes.
O que a ANP propôs foi que os que estavam a pagar muito descessem e que os que estavam a pagar pouco subissem, para isto ficar equilibrado. Mas isto não vai ficar equilibrado. O que vai acontecer é que os que estavam a pagar muito ficam a pagar mais 25%, porque a taxa passou de 0,4 para 0,5. É muito dinheiro. Isto vai ser um bolo incrível. A troika, no Memorando de entendimento, diz que o imposto sobre o património devia aumentar 150 milhões de euros em 2013, ou seja, entre 10% a 15% – sabemos que no ano anterior o imposto foi à volta de 1,1 milhões de euros. Com os aumentos que aí vêm, isto está a ir muito além da troika. Ninguém sabe onde isto vai parar.
Outro problema, o proprietário recebe a avaliação e tem trinta dias para contestar, mas a notificação é-lhe metida na caixa do correio, o carteiro assina, a pessoa pode não estar em casa e,  quando chega já passou o tempo. esquecem-se dos que estão fora – os emigrantes, que vão receber na sua caixa de correio em Portugal.  Ao reclamar, contestando a notificação da avaliação – dentro do prazo,  e para isso paga,  204 Euros, e eles não cobram logo – se baixar não paga nada, se se mantiver ou subir paga.
O que aconselhamos aos nossos associados é fazerem uma simulação com os nossos avaliadores para verem se vale a pena reclamar ou não. Depois há outro tipo de reclamação, que é passado três anos (tempo em que não se pode mexer) é pedir uma revaliação do imóvel que neste caso é gratuita.

No caso de uma casa estar devoluta, a taxa de IMI é ainda mais elevada. Isto é para forçar o arrendamento e a conservação?

Isso é outra coisa que nos põe o cabelo em pé, o pagamento a triplicar para as casas que estão devolutas – e para isso basta não haver consumo de água ou de electricidade. Isto está previsto na lei. O que acontece hoje é que, nomeadamente nas unidades destinadas a comércio, serviços ou indústria, há ruas inteiras vazias. Isto foi feito numa perspectiva de que os proprietários são uns malandros e têm as casas vazias porque querem, porque gostam. Em Portugal, neste momento, é difícil  alugar uma loja porque a atividade económica está muito paralisada.
A maior parte dos arrendatários tem pedido para baixar as rendas, até para metade. Há comerciantes que estavam a pagar 2 mil euros – que houve uma altura em que as rendas estiveram um bocado elevadas –, a passar para mil. Um dos objetivos era, além de equilibrar os valores do IMI, estimular o mercado de arrendamento. Mas as rendas não baixam…não podem baixar.
O proprietário de imobiliário em Portugal é a pessoa que conseguiu juntar, poupar, para comprar. Há vidas de trabalho e de pessoas que se privaram, tiveram uma vida de renúncia, como se dizia antes, para ter qualquer coisa sua têm de ser acarinhadas, não têm de estar sempre a levar por tabela. Temos o exemplo dos emigrantes que se esforçaram primeiro para construir uma casa na terra, restaurar a casa que herdaram e depois compraram um andar. Temos depois o problema das leis do arrendamento  há muitas casas que estão devolutas em zonas históricas das cidades mas que vêm de contratos de dezenas e dezenas de anos em que o inquilino, quando foi embora ou morreu, deixou a casa num estado de pós-guerra civil. Estiveram ocupadas 50, 60 ou mais anos e não houve manutenção, porque as rendas eram irrisórias e não permitiam obras.

Mas que propostas tem a ANP para mudar a situação do arrendamento, que tudo aponta será o modelo futuro de ao invés se comprar tanto, como em muitos países da Europa, alugar mais?
 Fomos à Assembleia da República e apresentámos propostas, porque ninguém sabe onde há-de meter estas questões do arrendamento – já passou pelos ministérios quase todos. A nossa proposta para corrigir as rendas era utilizar o índice de desvalorização da moeda publicado pelo Ministério das Finanças. De há quarenta anos para cá a moeda desvalorizou 50 vezes. Então, um contrato feito com uma renda de 5 euros vezes o fator de desvalorização dá 250 euros nos dias de hoje.
Esta seria a renda equivalente. Há muitos anos, em todas as ruas do país havia andaimes para fazer a conservação dos edifícios. Porque havia uma lógica entre o rendimento e a conservação. Porque não tenhamos ilusões: quem tem de pagar a manutenção do apartamento é o inquilino, não é o senhorio. Não há omeletes sem ovos. A partir do momento em que se congelaram as rendas deixou de ser possível fazer obras. Só em  Lisboa há 135 mil agregados interessados em arrendar!

António Freitas

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