A certificação de acordo com os níveis linguísticos estabelecidos no QuaREPE (Quadro de Referência para o Ensino do Português no Estrangeiro), a regulação da avaliação dos professores, a simplificação do concurso dos professores e a validade por dois anos do concurso e da comissão de serviço dos professores são as principais novidades do acordo de alteração ao regime jurídico do Ensino do Português no Estrangeiro (EPE), assinado a 23 de junho pelo secretário de Estado das Comunidades Portuguesa e o Sindicato dos Professores no Estrangeiro. Dias depois, José Cesário assinou um acordo similar com outros sindicatos.
“O nosso propósito, Governo e Camões-Instituto para a Cooperação e para a Língua, foi introduzir um conjunto de elementos novos na legislação que são extremamente importantes”, afirmou José Cesário. O governante salientou a “postura construtiva” do Sindicato dos Professores no Estrangeiro e da Fenprof durante o processo de discussão do acordo, pela “preocupação” permanente sobre a “melhoria do sistema do ensino do português no estrangeiro”.
“Da parte do governo, o objetivo foi introduzir no sistema (de ensino do EPE) os elementos indispensáveis que garantam mais qualidade e a sua subsistência, de maneira a responder de uma forma generalizada à procura que tem”, revelou ainda em declarações aos jornalistas após a assinatura do acordo, que decorreu no Ministério dos Negócios Estrangeiros, em Lisboa.
A simplificação do concurso dos professores foi um dos aspetos sublinhados pelo titular da pasta das Comunidades Portuguesas.
O concurso “vai passar a ser muito mais simples”, com uma prova de avaliação de conhecimentos como elemento fixo, podendo ter outros que não são obrigatórios, explicou José Cesário, que em declarações posteriores revelou que deixará ainda de haver a prova de avaliação psicológica. Sobre a validade por dois anos do concurso e da comissão de serviço, o governante afirmou ser “uma evolução significativa que dá uma estabilidade diferente, quer ao sistema, quer aos professores”.
A certificação das aprendizagens dos alunos de acordo com os níveis linguísticos é uma das novidades do acordo de alteração ao regime jurídico do Ensino do Português no Estrangeiro. “Vamos começar por definir o que vai ser avaliado, ou seja, quais os programas, as tarefas essenciais que os alunos terão que cumprir por cada um dos níveis linguísticos”, explicou o secretário de Estado das Comunidades que destacou ainda outra elemento definido no documento: as ações de formação dos professores.
“O Instituto (Camões) já tinha um vasto programa de formação para professores que vai, em parte, adaptar a esta realidade”, explicou o governante, sublinhando que as ações de formação deverão abranger todos professores, integrem ou não a rede tradicional do EPE.
Abrir a escola aos pais
José Cesário garantiu ainda que o novo regime de ensino de português no estrangeiro trará “uma abertura da escola à família”, porque os pais passarão a ter conhecimento sobre um conjunto de elementos “fundamentais relativamente ao ensino dos seus filhos”, como o programa de ensino e aprendizagem e o plano global de ensino da turma.
Elementos “que até aqui dispunham nalguns casos em que os professores lhes facultavam, mas não de uma forma organizada e sistemática”, afirmou o governante, que destacou ainda a eliminação de algumas diferenças de tratamento entre os diversos tipos de professores no terreno. “Para nós há professores, não há professores do primeiro ciclo, do segundo, do ensino secundário, alguns tinham acesso a determinado tipo de funções, outros não. A partir de agora todos passam a ter acesso às mesmas funções, inclusivamente as direções dos centros de língua portuguesa”, explicou, revelando ainda que passará de dois para três dias o período em que o professor é obrigado a apresentar-se depois de ser colocado numa determinada escola.
A questão da propina…
A introdução da propina anual de 120 euros que os filhos dos emigrantes terão que pagar no próximo ano letivo pelas aulas de português no âmbito do EPE, foi o único ponto do documento em que o Sindicato mostrou desacordo. Enquanto o secretário de estado das Comunidades sublinhou que o pagamento da propina é “muito importante”, o presidente do Sindicato dos Professores no Estrangeiro defendeu que “é mais um esforço que se vai pedir a pessoas que tiveram que sair do país para conseguir ganhar uma nova vida”.
José Cesário ressalvou que a propina é “um elemento que poderá ser utilizado ou não pelo Executivo”, mas garantiu ser “indispensável” para a introdução no sistema de elementos qualitativos, como “a avaliação, a formação para os professores, os incentivos à leitura e a escolha dos manuais escolares”. O governante lembrou que serão contempladas no pagamento, algumas situações de exceção, como as famílias monoparentais, pais desempregados, famílias numerosas ou as crianças que vivem com avós, acrescentando que poderá haver ainda situações de pagamento faseado da propina.
Carlos Pato afirmou ser “uma medida impopular”, ressalvando que “é preciso coragem política para a implementar”. Mas acrescentou que os sindicatos sentem-se entre “dois fogos”. “Por um lado dizer que não concordamos porque é um esforço económico que vamos pedir aos pais, e por outro temos a sustentabilidade do subsistema (do EPE) e dos postos de trabalho dos professores”, explicou. A instituição da propina anual levou o SPE/FENFROF a inserir no acordo uma declaração final em que afirma ser “muito negativa” a criação de uma propina nesse subsistema de ensino a ser paga pelas famílias, considerando-a “uma medida que descrimina os cidadãos portugueses na diáspora e contraria o artigo constitucional que garante a gratuitidade do ensino público”.
A propina será cobrada já neste ano letivo, estando a depender da aprovação do decreto-lei e portaria que a regulamenta, que terá de ser aprovado pelo Presidente da República. “Admito que tenhamos dois meses” até à publicação, disse José Cesário.
A rede do EPE, de responsabilidade do Governo português, está presente da Europa (Suíça, Reino Unido e Ilhas do Canal, Alemanha, Luxemburgo, Bélgica, Holanda, França, Espanha e Andorra), África (África do Sul, Namíbia, Suazilândia e Zimbabué) e Américas (Canadá, Estados Unidos e Venezuela). No próximo ano letivo, terá 57.212 alunos (56.191 em 2011/2012), distribuídos por 3.603 cursos ministrados por 400 professores.
José Cesário quer Conselhos Consultivos para a Educação
José Cesário revelou ainda que no âmbito do novo regime jurídico do ensino do português no estrangeiro, o Governo decidiu introduzir um novo elemento que “pode vir a ser muito importante para a regulação de algumas questões locais”. Trata-se dos Conselhos Consultivos para a Educação.
“No âmbito da revisão futura do regulamento consular eu avançarei com a proposta, e espero vir a traduzi-la na prática, de Conselhos Consultivos para a Educação”, explicou o governante afirmando que os atuais conselhos consultivos por área consular são demasiado vastos.
“Faz todo o sentido que existam conselhos consultivos específicos, de acordo com determinadas áreas e esta da educação é fundamental”, justificou, sem adiantar pormenores sobre quem irá integrar esses conselhos. José Cesário disse ser a favor de um conceito de comunidade educativa que defenda o envolvimento “de todas as forças vivas que estão de alguma forma ligadas à escola”.
Carlos Pato diz que certificação e formação são fundamentais
As ações de formação para professores e a certificação dos cursos dos alunos são para o secretário-geral do SPE, duas questões importantes para a valorização do ensino. Carlos Pato considerou “fundamental” a certificação, por ser uma forma “de se credibilizarem os cursos”.
“O que acontecia é que quando chegavam ao final de um percurso de 12 anos, era atribuído a cada aluno um certificado de frequência. Agora temos os diversos níveis a serem atingidos e o nível de eficiência também. E quem trabalha no estrangeiro sabe que o português é uma língua já exigida no mercado e trabalho”, destacou o responsável do SPE. Quanto à formação, sublinhou que o sindicato tem defendido há muito o alargamento “a outros professores que estão empregados por entidades estrangeiras”, como é o caso da Alemanha. “Sempre que houver uma ação de formação, queremos que também lhes seja divulgada”, afirmou.
Sobre o número de professores da rede do EPE, que o secretário de Estado das Comunidades estimou em 400 (são 450 se forem contabilizados os leitores de português), Carlos Pato disse ser suficiente, apenas tendo em linha de conta “o dinheiro que existe para poder gastar”. Carlos Pato disse serem do conhecimento do sindicato, “os constrangimentos” do atual orçamento para Instituto Camões para a gestão do EPE, mas pediu a José Cesário e a Ana Paula Laborinho que “esta rede tenha suporte” e que “a oferta dos cursos para os alunos se mantenha”, para que não seja preciso “assistir a cortes forçados, sem cabimento, como tivemos no final do ano passado”.
Ana Grácio Pinto
apinto@mundoportugues.org