O Governo anunciou medidas duras que incluem redução da despesa e aumento de impostos. O objectivo é garantir a redução prevista do défice do Estado. Para a oposição, estas medidas são o reconhecer dos erros do Governo.
O primeiro-ministro, José Sócrates, e o ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, fizeram-se acompanhar do ministro da Presidência, Pedro Silva Pereira, numa comunicação ao país durante a qual as expressões “medidas duras” e “medidas dolorosas” não passaram despercebidas.
Depois de um ano de grandes mudanças nos mercados mundiais, José Sócrates afirmou que só agora tomou medidas de corte de salários e de novos aumentos de impostos porque só agora entendeu “em consciência” que não lhe restava qualquer outra alternativa.
“Não tomámos estas medidas de ânimo leve, porque exigem uma grande decisão por parte daqueles que têm responsabilidades”, começou por argumentar o líder do executivo. “Estas medidas só são tomadas quando um político entende, em consciência, que não há nenhuma outra alternativa. Foi essa a conclusão a que cheguei agora”, justificou José Sócrates.
Ainda de acordo com o primeiro ministro, em maio passado “a economia portuguesa estava a recuperar – como ainda está a recuperar, porque apresentámos já crescimento económico este ano. Ora, era muito importante que nenhuma medida pudesse afectar esse crescimento económico de forma intensa”.
Para 2011, Portugal terá de reduzir o défice orçamental dos 7,3 por cento (previstos para o final de 2010) para os 4,6 por cento. Para José Sócrates, esta trajectória de consolidação orçamental “é das maiores entre todos os países europeus”.
O primeiro ministro justificou ainda as medidas de austeridade decretadas pelo Governo pela necessidade de Portugal defender o seu modelo social e ganhar credibilidade nos mercados externos.
Neste contexto, o ministro de Estado e das Finanças, Teixeira dos Santos, complementou a esta informação argumentando que o Governo não podia ignorar as dificuldades de financiamento que a economia portuguesa tem vindo a atravessar, em particular desde a agudização da situação na Irlanda, que estará a gerar um efeito em cadeia.
O que aí vem
De acordo com Teixeira dos Santos, o corte das despesas com funcionamento equivalem a 0,6 por cento do PIB, tal como a poupança com os cortes nas despesas com a Segurança Social.
A poupança que o Governo espera arrecadar com a redução nas despesas com medicamentos e meios complementares de diagnóstico equivalem a 0,3 por cento do PIB, e as redução nas transferências para os vários sub-sectores será equivalente a uma poupança de 0,2 por cento.
Já o corte nos investimentos gerará uma poupança de 0,2 por cento do PIB, e nas outras despesas mais 0,1 por cento.
O ministro da Finanças afirmou também que já informou o serviços de que as despesas com investimento estão congeladas até ao final do ano, para além dos cortes já previstos em sede de PIDDAC (Programa de Investimentos e Despesas de Desenvolvimento da Administração Central) para 2011.
O governante anunciou ainda a eliminação do quarto e do quinto escalões do abono de família e o aumento extraordinário de 25 por cento nos primeiros dois escalões. De acordo com o ministro, estas medidas serão para entrar em vigor já este ano, e juntam-se ainda às reduções das ajudas de custo, horas extraordinárias e acumulação de funções no Estado.
O ministro explicou também que a redução do número de trabalhadores contratados “já está em curso”, e que serão aumentadas as taxas dos serviços públicos, em especial na Justiça e na Administração Interna e ainda a contribuição dos trabalhadores para a Caixa Geral de Aposentações, que subirá 1 ponto percentual.
O ministro anunciou também que vai reduzir em 5 por cento o peso total salarial da função pública, incidindo de for-ma progressiva nos salários acima dos 1.500 euros. Teixeira dos Santos explicou que os cortes salariais serão entre os 3,5 e os 10 por cento, de modo a atingir uma redução de cinco por cento na massa salarial total.
De acordo com Teixeira dos Santos, o escalão mais baixo, entre os 1.500 e os 2.000 mil euros, sofrerá um corte de 3,5 por cento, chegando-se aos 10 por cento nos escalões mais altos.
O corte será mantido após 2011, independentemente das negociações salariais que têm lugar todos os anos.
Outra medida anunciada foi a do aumento da taxa normal do IVA em dois pontos percentuais, passando para os 23 por cento.
O Governo anunciou também a criação de um novo imposto sobre o sector financeiro, à semelhança do que acontece em outros países europeus.
Os cortes não chegam
Para além destas medidas, o Governo só vai cumprir o défice de 7,3 por cento previsto no Orçamento de Estado deste ano graças à transferência do fundo de pensões da Portugal Telecom para o Estado, num encaixe no valor de 1,6 mil milhões de euros.
O ministro Teixeira dos Santos, anunciou que o acordo “está para muito breve”, até final do ano. Um pouco antes da conferência de imprensa, a PT tinha anunciado que estava em negociações com o Governo para uma eventual transferência do fundo.
O ministro justificou esta transferência com “a despesa extraordinária relativa à aquisição dos submarinos (contrato celebrado em 2004) e a execução abaixo do previsto da receita não fiscal”.
O que diz a oposição
O secretário geral do PCP, Jerónimo de Sousa, disse rejeitar as medidas de austeridade, que classificou como “uma ofensiva brutal” aos rendimentos do trabalho que “nada vai resolver”.
“Trata-se de uma brutal ofensiva, tanto na parte da receita como particularmente na parte da despesa. Vai levar à desvalorização dos salários, a mais desemprego”, disse Jerónimo de Sousa.
Na sua opinião, estas medi-das “não vão resolver nenhum dos grandes problemas nacionais” e vão contribuir para aumentar o desemprego.
Já o PSD apelou ao Governo para que reconsidere o novo aumento de impostos anunciado, e manifestou-se “disponível para apreciar” o Orçamento do Estado para 2011 quando este for apresentado no Parlamento.
O conselheiro nacional Nogueira Leite afirmou que o Partido “considera um mau princípio recorrer a sucessivos aumentos de impostos”, pondo famílias e empresas a “pagar a inoperância do Governo na gestão da coisa pública”.
Do lado do CDS-PP, a deputada Cecília Meireles defendeu que o Governo “deve assumir a responsabilidade de ter falhado”, frisando que os anúncios feitos pelo primeiro ministro “são a prova disso mesmo” e de que “estava errado” o caminho seguido “nos Programas de Estabilidade e Crescimento”.
Numa “análise preliminar” às medidas, Cecília Meireles assinalou como “surpreendente” que “todas estas medidas sejam compagináveis com a manutenção do TGV, da terceira travessia (sobre o Tejo) e do novo aeroporto, e isso é importante que seja realçado”, defendeu.
Entretando, a CGTP anunciou uma greve geral para o dia 24 de Novembro. A UGT considera aderir ao protesto.