Novo Tratado dos Direitos Humanos aprovado em Genebra

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O Conselho de Direitos Humanos endossou em Junho, em Genebra, o Protocolo ao Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais. A resolução – proposta por Portugal – foi aprovada por consenso e pode ser considerada a segunda vitória na adopção de um documento importante na protecção dos direitos dos cidadãos. O próximo passo está agendado para o Outono deste ano quando for a votação final, talvez já em Outubro, na Assembleia-Geral das Nações Unidas, em Nova Iorque.
Considerado como um novo Tratado dos Direitos Humanos, o Protocolo coloca a protecção dos direitos económicos, sociais e culturais  – como o direito ao trabalho, à alimentação, à saúde e à água, entre outros – em pé de igualdade com os direitos civis e políticos.

Iniciadas em Fevereiro de 2004, as negociações prolongaram-se até 4 de Abril deste ano, quando os representantes da quase totalidade dos Estados-Membros da Organização das Nações Unidas (ONU), reunidos em Genebra, aprovaram o texto final do Protocolo ao Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais – depois de quatro anos de intensas negociações.
Pouco mais de dois meses depois, a 18 de Junho, o documento conseguiu a aprovação, por consenso, junto do Conselho de Direitos Humanos, sedeado também em Genebra. Mas também ali, o documento foi objecto de negociações, como revelou a «O Emigrante/Mundo Português», a jurista portuguesa Catarina de Albuquerque, que presidiu os trabalhos de elaboração do Protocolo, ao longo dos quatro anos.
Desde dúvidas apresentadas à última hora por representantes de países que não estiveram presentes nos trabalhos de elaboração do Protocolo, a países que ameaçaram pedir um voto de protesto ao texto final – mas que acabaram por mudar de intenções – foi necessário explicar as razões do documento e as concessões feitas.

Outono na ONU

Agora, aquele que é considerado um novo Tratado dos Direitos Humanos, segue para a terceira fase do seu processo de adopção: a votação final junto da Assembleia-Geral da ONU. Uma etapa, agendada para o Outono, e que poderá ser concluída já em Outubro.
Apesar de tudo apontar para que a votação decorresse apenas em Novembro, o facto de ter sido aprovado por consenso junto do Conselho de Direitos Humanos, deu ainda mais visibilidade ao documento, e poderá vir a agilizar o seu processo de aprovação.
Até lá, o trabalho para a aprovação final de um documento que nasceu de uma iniciativa portuguesa, prende-se com a tentativa de manter o Protocolo coeso, ou seja, que “não haja a reabertura do texto”, explicou Catarina de Albuquerque. “Em Nova Iorque, ainda será maior o número de países presentes na votação e temos que estar atentos. Aqui aplica-se perfeitamente a expressão «até ao lavar dos cestos, é vindima»”, sublinha a jurista.
Em nota emitida pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, o Governo português considera que a adopção do Protocolo ao Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais será “uma vitória para o sistema de protecção dos direitos humanos da ONU, para todas as vítimas de violação destes direitos e também para Portugal, que apoia esta causa há décadas”.
A acontecer, a aprovação junto da ONU, em Nova Iorque, inicia um novo processo. O Protocolo que regula direitos fundamentais de todos os seres humanos terá depois que ser ratificado pelos Governos de pelo menos dez países. Por isso, Catarina de Albuquerque afirmava em Junho a «O Emigrante/Mundo Português», não acreditar que o documento entrasse em vigor ainda este ano. Segundo a jurista, o processo deverá “demorar algum tempo”, até porque, explicou, há países que vão esperar: preferem que outros governos avancem com a aprovação e a entrada em vigor nos seus países. Querem “ver para crer”, ou seja, que comecem a surgir as queixas relacionadas com violações dos direitos e acompanhar o processo de análise e condenação, no caso de ser confirmada a veracidade dos factos. Só então decidirão se aprovam e adoptam o novo Pacto.
Nada que espante a jurista portuguesa. “Com todos os outros tratados tem sido assim, é um processo gradual”, explicava. Até porque Catarina de Albuquerque tema certeza de ter até mais do que dez países com aprovação garantida. “Quanto mais não seja, os da América Latina e os de África. Só aí temos 80”, brincava.

UMA INICIATIVA PORTUGUESA

Eleita para presidir aos trabalhos de elaboração do Protocolo, Catarina de Albuquerque está ligada a negociações no âmbito das Nações Unidas dede 1997, e no que se refere aos direitos económicos, sociais e culturais, desde 2001. Recordou que foi Portugal a avançar com o processo de elaboração do novo Protocolo, num trabalho de persistência iniciado nos anos 80 por Costa Lobo, embaixador de Portugal junto das Nações Unidas em Genebra. “Foi aí que se começou este trabalho de formiguinha: levar à Comissão dos Direitos Humanos, uma resolução sobre a protecção dos direitos económicos, sociais e culturais. (…) Depois, o testemunho foi sendo passado. O embaixador António Ricoca Freire também levou avante esta «chama», assim como o embaixador José Júlio Pereira Gomes, que foi quem a passou a mim. Depois, eu levei avante as negociações desta resolução. Fiquei com «o bebé nos braços» no momento certo, quando as conversações já estavam maduras o suficiente para se negociar um tratado”, explicou.
Ao longo dos quatro anos de negociações, houve momentos difíceis, como revelou a jurista a «O Emigrante/Mundo Português», numa entrevista publicada na edição de 6 de Junho último.
“Participaram os quase 200 Estados-membros da ONU, além de centenas de ONG’s e de organizações internacionais. O princípio foi difícil”, revelou a jurista, que destacou o longo trabalho “para ganhar a confiança das pessoas e fazer com que os representantes de países, nomeadamente os africanos, percebessem que eu estava lá para os ouvir, para lhes dar atenção, que acreditava que as suas preocupações eram dignas de atenção”.
“Quando elaborei o documento de reflexão e depois o primeiro projecto de protocolo tive sempre em conta as preocupações e pretensões, por exemplo, dos países africanos. E eles perceberam que eu os ouvia. Houve um trabalho árduo para ganhar a confiança deles”, sublinhou ainda.
Para a jurista, a questão de maior relevância na adopção do novo Pacto Internacional dos Direitos Económicos, Sociais e Culturais é o facto de colocar os direitos nomeadamente à alimentação, ao trabalho e à saúde, entre outros, ao mesmo nível dos direitos civis e políticos. Isto porque, actualmente, para as violações dos direitos civis e políticos – liberdade de expressão, prisões arbitrárias, torturas, etc – já haver há décadas, mecanismos de queixas nas Nações Unidas. “Para uma pessoa que sofre de má nutrição crónica, falta de cuidados de saúde, falta de acesso a medicamentos indispensáveis à sua sobrevivência, não há nada”, destaca.
Apesar de há 60 anos atrás, a Declaração Universal dos Direitos Humanos ter consagrado todos os direitos, tanto aos civis e políticos, como económicos, sociais e culturais, a «Guerra Fria» veio dar mais visibilidade a uns em detrimento dos outros. “Com a Guerra-Fria e com a «associação» dos direitos económicos, sociais e culturais ao chamado Bloco de Leste, o mundo ocidental passou a ser visto como o defensor dos direitos civis e políticos. Começou, a partir de então, a haver um tratamento diferenciado de um bloco de direitos, relativamente a outros”, explicou a jurista na entrevista ao jornal.
Por isso, acrescenta que, do ponto de vista simbólico, este Protocolo “volta a fechar o círculo e a pôr tudo como estava há 60 anos atrás”.

Ana Grácio Pinto

 

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