Depois de oito anos a trabalhar na Suiça, Paulo da Silva viu concretizado o objectivo de melhorar a sua vida profissional. Paulo deixou de ser um ajudante para se tornar num trabalhador especializado e viu o seu salário ser aumentado em mais 550 francos suíços. A ascensão chegou depois de ter frequentado em Portugal, um curso de formação profissional destinado a emigrantes portugueses na Suiça, trabalhadores no sector da construção, no âmbito do «Projecto Portugal». Lançado em 1987, numa parceria entre instituições suíças e portuguesas, o projecto ajudou cerca de 1600 emigrantes portugueses a tornarem-se trabalhadores especializados. Paulo da Silva foi um dos últimos emigrantes portugueses, a fazê-lo.
A 27 de Março, a Sociedade Suiça de Empreiteiros rescindiu unilateralmente o projecto…
Paulo da Silva frequentou a formação em Lisboa, durante Janeiro e Fevereiro deste ano. O curso, com a duração de 320 horas, permitiu-lhe adquirir novos conhecimentos na sua área de trabalho e ainda na área das novas tecnologias e da segurança no trabalho. Paulo deixou de ser um ajudante para se tornar num trabalhador especializado e viu o seu salário ser aumentado em mais 550 francos suíços.
Há oito anos na Suiça, a trabalhar no sector da construção, decidiu fazer um curso que além de lhe permitir aumentar o salário, transformou-o num operário especializado. “Até Dezembro tinha o meu trabalho e daí não passava, era sempre a mesma coisa. Quis avançar. E consegui isso, subi logo de categoria”, contou ao Emigrante/Mundo Português. Paulo diz que aprendeu “bastante” e se pudesse, gostaria de fazer outros.
Mas este português natural de Ferreira do Zêzere participou naquele que terá sido o último ano de cursos de formação realizados no âmbito do «Projecto Portugal».
Criado em 1987, o programa de formação, acordado entre a Suíça e Portugal, no âmbito das relações de cooperação entre os dois países, envolvia instituições dos dois países: por parte da Suiça, a federação patronal, os sindicatos e o «Parifonds» (o instituto com responsabilidades na administração dos fundos profissionais), e o Instituto de Emprego e Formação Profissional e a Direcção-Geral dos Assuntos Consulares e das Comunidades Portuguesas, do lado de Portugal.
Segundo Manuel Beja, ex-sindicalista e conselheiro das Comunidades Portuguesas na Suiça, durante as duas décadas de existência, o projecto “ajudou a ultrapassar a grande carência de mão-de-obra especializada no sector da construção suíça”. Cerca de 1600 trabalhadores portugueses frequentaram os cursos realizados no âmbito do acordo, nos centros de formação, no Porto, Braga, Vila Real, Lisboa e Guarda, postos à disposição por Portugal.
“A motivação dos interessados, reconhecida pelos próprios patrões, contribuiu para o sucesso do projecto e ajudou a garantir a qualidade de trabalho”, referiu ainda o conselheiro num comunicado enviado ao Emigrante/Mundo Português.
Em declarações ao jornal, Manuel Beja diz acreditar que a decisão da Sociedade Suiça de Empreiteiros de rescindir unilateralmente a participação no programa, deve-se ao conflito que a opõe aos sindicatos do sector, Unia e Syna, em relação à renovação do Contrato Colectivo de Trabalho (ver caixa). “Os empreiteiros, em vez de procurar um entendimento, atacam com os fundos profissionais, rescindem a sua presença nos fundos que têm o objectivo de fomentar a formação profissional, e abandonam o Projecto Portugal. Isso vai prejudicar muito os nossos compatriotas que trabalham no ramo da construção, vai impedir o desenvolvimento da sua formação”, sublinha.
Fundos “congelados”
Realizados todos os anos, no Inverno, os cursos profissionalizantes eram frequentados por mais de 60 portugueses, que durante os dois meses de formação ainda recebiam 80 por cento do salário. A formação era subsidiada pelos fundos reunidos no «Parifonds», uma parte dos quais retirado do salário dos trabalhadores. “Cada um fazia um desconto de 0,7 por cento destinado aos fundos. Uma grande parte da verba era para a formação profissional, outra era para manter os custos do Contrato Colectivo de Trabalho, nomeadamente, de uma estrutura que fazia o controlo nas empresas para verificar se o contracto estava a ser respeitado ou não, se os salários mínimos correspondiam ao que estava definido”, explicou Margarida Pereira, do Sindicato Unia.
Com o fim, a 1 de Outubro último, do Contrato Colectivo de Trabalho, o desconto deixou de ser feito do salário dos trabalhadores e apenas as empresas continuaram a contribuir. Como resultado, há menos verbas a entrar e a única contribuição é feita pelas empresas. “É com esses fundos que eles agora, unilateralmente, querem gerir a formação e apresentar o seu próprio catálogo de ofertas profissionais. Até aqui, muitas das ofertas profissionais eram decididas e organizadas em cooperação com os sindicatos”, alerta a sindicalista portuguesa.
Margarida diz que agora, “é como se os fundos estivessem congelados”, já que, a princípio, estes só podem voltar a ser activados com a concordância das duas partes. Já Manuel Beja teme pelo futuro das verbas e pergunta o que a Sociedade dos Empreiteiros vai fazer “aos milhões de francos que pertencem aos trabalhadores e se encontram nos cofres” da «Parifonds».
A decisão dos empreiteiros suíços, transmitida no dia 27 de Março durante uma reunião com membros dos sindicatos surpreendeu sindicalistas, trabalhadores e as comunidades portuguesa e espanhola (existia também um programa similar para os trabalhadores emigrantes espanhóis). A surpresa foi grande já que numa publicação divulgada um mês antes, a Sociedade de Empreiteiros apresentou um catálogo de ofertas de formação profissional que referia cortes em alguns cursos no estrangeiro, mas mantinham os cursos em Portugal e em Espanha.
Margarida Pereira considera a atitude “inaceitável” e concorda com Manuel Beja, sublinhado que “está enquadrada neste conflito que existe na Suiça entre os sindicatos e a associação patronal”. Para a sindicalista, a decisão da Sociedade Suiça de Empreiteiros “demonstra também a falta de consideração e o desrespeito pelos trabalhadores estrangeiros emigrantes. Era uma das possibilidades que os trabalhadores portugueses e espanhóis tinham de conseguir um diploma profissional e passarem a trabalhadores qualificados.
Acções de protesto
Depois das cartas dirigidas às embaixadas de Portugal e de Espanha, os sindicatos estão agora a aguardar as respostas. Do lado português, Margarida Pereira diz que estão ainda a tentar marcar uma reunião para discutir o assunto com as autoridades portuguesas “e ver que medidas se pode tomar”.
Além da intervenção junto do governo suíço, os sindicalistas estão já a programar uma acção de protesto com a comunidade portuguesa, que deverá ocorrer junto à sede da Sociedade Suiça de Empreiteiros. “Ainda não há data estipulada, estamos a tentar a mobilizar a comunidade, principalmente os trabalhadores que já beneficiaram desta formação”, revela.