A mulher acusada de matar a filha de dois anos, em Monção, confessou hoje que deu um pontapé na barriga da menina no dia em que ela morreu, mas ressalvou que a intenção era atingi-la nas nádegas.
No Tribunal de Monção, no início do julgamento, a mulher, de 24 anos, disse que ficou "nervosa" porque a filha entornou o leite do biberão e sujou a roupa e, por isso, quis dar-lhe "um pontapé no rabo", mas a menina "virou-se de repente", acabando por ser atingida no abdómen.
A arguida disse que estava apenas com umas meias calçadas e que atingiu a filha, Sara, "com pouca força, de raspão, com as pontas dos dedos", jurando que essa agressão foi um caso isolado. De resto, garantiu que dispensava à Sara um tratamento igual ao dos outros três filhos, negando qualquer outra agressão ou negligência em termos de higiene, vestuário e alimentação.
Alegou ainda que as nódoas negras, hematomas, mordidelas e outros sinais de alegadas agressões que a Sara constantemente apresentava se poderiam ter ficado a dever não só a brincadeiras com os irmãos mas também às quedas que a menina daria com frequência, por causa de um problema de locomoção.
Quanto ao dia dos factos, disse que ficou particularmente nervosa porque a menina, que se preparava para sair para o infantário, tinha virado o leite e "não tinha em casa gás para aquecer mais nem comida".
"Não tive intenção de lhe fazer mal nenhum. Estou arrependida, sinto a falta dela, choro muita vez por ela", disse. Culpou também o seu companheiro e pai dos seus filhos pelo seu estado de nervosismo, por alegadamente "não dar dinheiro para as despesas da casa".
Sara morreu a 27 de Dezembro de 2006 em Mazedo, Monção, tendo a autópsia ao corpo da menina revelado lesões traumáticas significativas "a diversos níveis" que foram responsáveis pela morte, segundo disse à Lusa fonte do Instituto de Medicina Legal (IML).
A mãe, que está em prisão preventiva, é acusada pela morte da criança e responde pelos crimes de homicídio qualificado e maus-tratos. Segundo a acusação, deduzida pelo Ministério Público (MP), a menina, no dia em que morreu, terá sido agredida a murro e a pontapé pela mãe, por causa de um "facto frívolo", relacionado com o entornar do leite.
A mãe, sustenta ainda o MP, ficou enfurecida e agrediu a pequena Sara sobretudo no abdómen, nomeadamente com um violento pontapé no fígado, que acabaria por se revelar fatal. A menina começou de imediato a desfalecer, sem conseguir segurar a cabeça, acabando a mãe por a levar, cerca de meia mais tarde, ao Centro de Saúde de Monção, onde daria entrada já sem vida.
O tribunal também já ouviu hoje o pai da Sara, que garantiu não ter conhecimento de quaisquer agressões, e a educadora e a auxiliar do infantário que a menina frequentava, que confirmaram que os pais davam uma tratamento discriminatório àquela filha.
Sara estava referenciada desde 2005 pela Comissão de Protecção de Crianças e Jovens em Risco (CPCJR) de Viseu, distrito de onde os pais são naturais, mas apenas por negligência familiar, não havendo quaisquer indícios de maus-tratos. Entretanto, em meados de 2006, os pais foram viver para Monção e a CPCJR "perdeu-lhe o rasto" até 04 de Dezembro, dia em que a educadora do infantário que ela começou a frequentar naquele concelho alertou para o facto de a menina aparecer na escola com hematomas no corpo e sempre "cheia de fome e mal agasalhada".
Após a denúncia da educadora, e segundo o presidente da Câmara de Monção, José Emílio Moreira, a CPCJR local marcou "imediatamente" uma consulta no Centro de Saúde para o dia seguinte, mas a mãe acabaria por não levar a criança, alegando que "era muito em cima da hora".
O autarca acrescentou que foi marcada outra consulta para o dia 19, mas a criança voltaria a faltar, tendo a mãe alegado, dessa vez, que tinha de ir ao Centro de Emprego.
"Perante isto, foi marcada uma consulta, desta feita em moldes coercivos, para o dia 28, mas infelizmente a menina morreu na véspera", disse ainda.
Após a morte da Sara, a Segurança Social retirou aos pais a tutela dos seus outros três filhos, entregando-os a uma família de acolhimento.
Lusa
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