Volto hoje novamente a Cusco.
A cidade, situada na região dos Andes, mais propriamente no sudeste do Vale Huatanay ou Vale Sagrado dos Incas, a sul do País, fruto das inúmeras riquezas históricas que possui, há muito que é considerada a capital arqueológica das Américas, tendo sido declarada Património Cultural da Humanidade, pela UNESCO, em 9 de Dezembro de 1983.
O nome da cidade tem origem na palavra da língua Quechua Qosqo ou Qusqu, que significa umbigo, dado que, segundo a mitologia Inca, nela confluíram o mundo inferior (Uku Pacha), o mundo visível (Kay Pacha) e o mundo superior (Hanam Pacha), pelo que foi chamada o umbigo do mundo atendendo à sua posição face ao universo.
Com a chegada dos conquistadores Espanhóis, o seu nome passa para o Castellano como Cusco.
A cidade, que remonta aos séculos XI ou XII, segundo as lendas indígenas, foi fundada por Manco Capac, juntamente com a sua irmã e esposa Mama Ocllo, dizendo-se que o lugar lhes foi revelado pelo deus Sol (Inti), depois de uma peregrinação ao sul do Vale Sagrado dos Incas em busca do lugar exacto para a urbe.
Cusco, ao assumir em meados do século XIII, o título de capital do Tahuantinsuyu ou Império Inca, tornou-se na cidade mais importante dos Andes, sendo também o seu principal centro administrativo e cultural, tendo-se convertido ainda num eixo de culto religioso da região, bem como na cidade habitada mais antiga de toda a América.
Já em artigo anterior escrevi sobre a extensão deste Império, todavia, e mais uma vez, sublinho que, no seu apogeu, o domínio Inca chegou até Quito, hoje capital do Equador, a norte, atravessando mesmo as margens do Rio Ancasmayo, na actual Colômbia, e a sul, atingindo o Rio Mawle, no Chile, sendo limitado a ocidente pelo Oceano Pacífico, e a oriente, alcançando a bacia Amazónica, compreendendo, pois, os habitantes de 4.500 quilómetros de cadeias rochosas, situação que espelha bem a dimensão e a importância que os Inca tiveram no continente Americano.
Com a decadência do Império Inca, em 1532, o conquistador Francisco Pizarro invadiu e saqueou a cidade, estabelecendo o domínio espanhol em Cusco no dia 15 de Novembro de 1533.
Após a tomada do poder pelos Espanhóis, a maior parte dos edifícios foi arrasada por iniciativa de clérigos católicos, com o duplo objectivo de destruir a civilização Inca, e, com as suas pedras, construir as novas igrejas cristãs, bem como outros imóveis ao serviço do invasor.
Foi pois usual, que as edificações espanholas aproveitassem como base as volumosas paredes construídas em pedra pelos Incas.
Ainda sobre esta matéria específica, e apenas por curiosidade, relato o seguinte episódio: em 1950 verificou-se um grande terramoto, que provocou o colapso de mais de um terço dos imóveis de Cusco; também foi destruída uma antiga construção de padres dominicanos, tendo então ficado à vista que a mesma fora edificada em cima do Templo do Sol Koricancha, outrora construído pelos Incas, que, todavia, resistiu ao tremor de terra!
Perante esta ocorrência, que está muito longe de ser única, deve ser realçado que, como consequência de a maior parte do seu Império se situar em zonas sujeitas a tremores de terra, os Incas apuraram de tal forma a técnica das suas construções em pedra, que conseguiram conferir-lhes um carácter quase que anti-sísmico, que os séculos que se lhe seguiram vieram confirmar de um modo inequívoco.
Somente para reforçar o que acabei de escrever, é de referir que, já aquando do violento terramoto de 1650, quando quase todos os edifícios coloniais ficaram destruídos, Koricancha resistiu às forças da natureza!
Cusco é uma típica cidade que foi alvo da colonização espanhola.
A tradicional Plaza de Armas, o local mais concorrido de Cusco, foi estabelecida por Pizarro na principal praça da cidade durante o Império Inca, então chamada Huacaypata ou Praça do Guerreiro, e que se encontrava rodeada pelos palácios dos soberanos de então.
A Praça, que foi lugar de importantes acontecimentos da história de Cusco, tais como a celebração pelos Incas do Inti Raymi ou Festival do Sol, a proclamação da conquista de Cusco por Francisco Pizarro ou a execução daquele que foi considerado o cacique da resistência indígena contra a administração espanhola, José Gabriel Condorcanqui, conhecido como Tupac Amaru II, foi transformada com a chegada dos Espanhóis, que construíram os belos edifícios que, ainda hoje em dia, a circundam.
Também foi durante a dominação espanhola, que foram edificadas as admiráveis arcadas coloniais em pedra que rodeiam a Praça, bem como as quatro igrejas ali existentes.
Continuando a ser, tal como no passado, o coração da cidade, é um local amplo, muito bonito, com algum verde, extremamente movimentado, servido por inúmeros restaurantes, papelarias, lojas de artesanato e de souvenirs, cybercafés, etc..
Ainda na Plaza de Armas, encontram-se dois edifícios que não podem deixar de ser visitados quando se vai até Cusco, e que são a Catedral e a Igreja da Companhia de Jesus.
Na realidade, a primeira catedral de Cusco é a Igreja do Triunfo, construída em 1539 sobre a base do palácio Inca Wiracocha, mas, na actualidade, é apenas uma capela auxiliar da Catedral.
A actual Catedral, edificada entre 1560 e 1664, na qual os Espanhóis utilizaram blocos de pedra levados de Sacsayhuamán, notável construção situada a alguns quilómetros de Cusco, sobre a qual escreverei nas próximas “NOTAS DE VIAGEM”, tem uma fachada renascentista, possui uma importante mostra de ourivesaria colonial, bem com altares em madeira esculpida, e, ainda, diversas obras da Escola Cusqueña de Pintura.
A Igreja da Companhia, cuja construção foi iniciada pelos jesuítas em 1576 sobre as bases do palácio Inca do imperador Huayna Capec, é considerada um dos melhores testemunhos do estilo barroco colonial do continente.
A sua fachada é de pedra esculpida e o altar-mor revestido a folhas de ouro.
Estando a escrever sobre Cusco, e, ainda em relação ao cansaço físico que mencionei nas anteriores “NOTAS DE VIAGEM”, as suas ruas empedradas, nomeadamente as que se situam no centro arqueológico da cidade, que, na sua maioria, têm muito a ver com o traçado da época Inca, também não ajudaram nada aos vários efeitos negativos que a altitude provocou no meu organismo…
Estes típicos e característicos arruamentos, já por si só, não são muito facilitadores da locomoção de uma pessoa, mas num local situado a mais de 3.300 metros acima do nível do Mar, foram uma dificuldade acrescida com que tive de me defrontar!
No próximo artigo irei então concluir estes textos sobre a minha visita a Cusco.
Rui Oliveira e Sousa
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