Continuando a escrever sobre a minha estadia na Região de Magalhães e Antárctida, vou em seguida relatar mais uma experiência inolvidável e perfeitamente singular, ou seja, a visita que fiz a uma pinguinera.
Assim, visto que a partir de Punta Arenas é relativamente fácil aceder às duas maiores colónias de pinguins existentes no sul do Chile, que são a de Seno Otway e a da Ilha Madalena, decidi um dia visitar a primeira delas, situada a cerca de 70 km a noroeste da capital da Região.
Nesta pinguinera podem ser vistos Pinguins Magalhânicos ou de Magalhães, uma das 18 espécies de pinguins identificadas em todo o Mundo, na sua totalidade distribuídas pelo hemisfério sul, das quais 9 vivem no Chile.
Não me recordo de anteriormente a esta visita à colónia ter visto pinguins, e agora, depois do contacto directo com a espécie de Magalhães, no que respeita à beleza, não fiquei "fan"…
Os pinguins são aves que perderam totalmente a capacidade de voar, adequando-se a uma vida aquática, e que se caracterizam por um corpo robusto, possuindo asas adaptadas para nadar, plumagem compacta e impenetrável, branca e preta, ou cinzenta escura, no dorso, excepto no caso do Pinguim Rei, espécie que também se encontra no Chile, que apresenta alguma coloração.
No caso particular do Pinguim Magalhânico, a sua cabeça é branca e preta, as costas negras e o peito branco, possuindo duas tiras pretas na plumagem do pescoço, que, segundo alguns estudos, poderão viver entre 25 e 30 anos, e atingir uma altura de 70 cm.
Esta espécie é também a única que vive na Região de Magalhães e Antárctida, e daí a proveniência da sua designação.
Foi pois esta ave, que dedica grande parte do ano à reprodução, e que, durante esse período, todos, inclusive os não aptos para procriar, vivem em terra, que no princípio deste ano tive oportunidade de ver de perto, no seu habitat natural, dedicada a uma das mais naturais e frequentes funções de qualquer ser vivo, isto é, reproduzir-se.
Conforme referi anteriormente, a pinguinera de Seno Otway não é muito distante de Punta Arenas, todavia, para fazer os já mencionados 70 km foi necessária cerca de uma hora e meia, dado que grande parte do percurso é feito em vias de terra batida, algumas delas não primando então pela qualidade.
A colónia tem uma superfície de 80 hectares, estendendo-se ao longo de 2 km de praia, e ocupa uma área de planície com predomínio de vegetação herbácea, possuindo uma fauna local rica em quantidade e diversidade, destacando-se zorros, lebres e aves marinhas.
A colónia Seno Otway é mais pequena que a da Ilha Madalena, estimando-se ter uma população de 3.000 pinguins, enquanto que na segunda se encontrarão cerca de 150.000 aves.
Antes de ter efectuado esta visita, fui avisado sobre as muito difíceis condições ambientais – chuvas intensas (a precipitação anual ronda os 500 mm), ventos muito fortes e gélidos, ausência de qualquer local onde, pontualmente, me pudesse abrigar destas "agressões" do clima, forte incidência dos malefícios causados pelos efeitos do buraco na camada de ozono.
Face ao exposto, tomei precauções – camisa de flanela, colete, parka, cachecol, luvas, chapéu impermeável para me proteger da chuva e óculos com lentes fotocromáticas.
Exceptuando o chapéu (apesar da total ausência de Sol e do céu muito nublado, não choveu, e se chovesse, não sei bem como o iria aguentar na cabeça!…), tudo o que levei me deu um jeitão!
Outro alerta feito esteve relacionado com os pinguins – é que estas aparentemente simpáticas criaturas não gostam de ser observadas de muito perto, pelo que conviria não o tentar fazer, pois, por vezes, registam-se algumas investidas destas graciosas aves, que se sentem ameaçadas por visitantes mais curiosos…
E compreende-se, pois os pinguins estão a assegurar a criação de novas vidas!
Tive cuidado, e, mesmo que por uma ou outra vez tenha estado relativamente perto destas aves, nada me aconteceu.
Os Pinguins de Magalhães chegam anualmente à zona de nidificação de Seno Otway, entre Setembro e Outubro, vindos das costas do sul do Brasil e das Ilhas Falkland, território sobre soberania Britânica, situado a sul do Continente Americano, também muito conhecidas pela sua denominação em Castellano, ou seja, as Ilhas Malvinas.
Para mais fácil localização destas ilhas, permito-me recordar a Guerra das Malvinas, que ocorreu entre 2 de Abril e 14 de Junho de 1982, quando a Junta Militar que então conduzia os destinos da Argentina, tentou ocupar o território, e o Governo Inglês, liderado pela então chamada "Dama de Ferro", Margaret Thatcher, respondeu de imediato, causando uma derrota humilhante para a Nação Sul-Americana.
Este insucesso da Junta Militar da Argentina acabou por ter uma feliz consequência – levou à queda da ditadura militar então vigente naquele País e à restauração da democracia no ano seguinte.
Retomando o tema destas "NOTAS DE VIAGEM" – os ninhos dos pinguins consistem em buracos resultantes de escavações que eles fazem no terreno, onde deixam um ou dois ovos, e, excepcionalmente, três.
O nascimento dos primeiros "bebés" começa a registar-se sessenta dias depois da chegada dos pinguins.
Ainda mais alguns pormenores relacionados com estas aves, que considero deveras interessantes.
Os pinguins, na época de acasalamento, voltam sempre ao lugar onde nasceram.
Os pinguins são monogâmicos, os casais são sempre os mesmos, e apenas regressam à colónia no período de reprodução.
Os machos e as fêmeas fazem turnos entre si para alimentar e tomar conta das crias: cada manhã, cerca das 10h, e à tarde, por volta das 5h, os casais de pinguins mudam de turno – um vai pescar, enquanto o outro regressa da mesma função para cuidar dos jovens recém-nascidos; quando esta mudança de guarda começa, os pinguins em fila indiana, e muito "ordeiramente", vão e regressam do mar.
A sua alimentação consiste, principalmente, em pequenos peixes e crustáceos marinhos, e mergulham de oito em oito horas para se alimentarem, e, para tal, podem ir até 30, 35 metros de profundidade.
Contudo, nesta actividade, têm de ter muito cuidado com o seu principal inimigo, o Leão Marinho, que, igualmente, mergulha no mar para se alimentar…
Como já referi, os pinguins estão na colónia entre Setembro e Março, mas a melhor altura para serem vistos é de Novembro a Fevereiro, pelo que tendo eu lá estado em fins de Janeiro, tive oportunidade de observar a maior parte do que tenho vindo a descrever.
A visita a Seno Otway faz-se caminhando por passadeiras em madeira, que cobrem uma extensão da colónia ainda apreciável, podendo-se andar em plena área de nidificação de Pinguins de Magalhães.
Existem alguns pontos especiais de observação, entre os quais realço um junto ao mar, que permite ver um número imenso de pinguins próximo da água, sobre cascalho e pedras de maior dimensão, visto que não existe areia, ou então, entrando e saindo do mar – aqui existe uma construção em madeira, já bem perto dos pinguins, que esconde o visitante da sua vista, mas deixando que ele os veja através de uma ranhura, mais ou menos larga, possibilitando a observação do seu modus vivendi naquela zona.
Outro local, é uma torre, estrategicamente situada, que após se aceder ao topo por uma escada em ferro, local onde só cabem duas pessoas, se tem uma vista panorâmica da colónia.
Foi muito interessante ver pinguins "de sentinela" junto aos buracos na terra, onde se situavam os seus ninhos, perscrutando os visitantes que paravam para os ver melhor, ou ainda, observá-los em "bicha de pirilau", como se chamava na tropa aos militares avançando em fila, quando se dirigiam para o mar ou para os ninhos, ou também vê-los entrar no oceano para pescar…
Gostei de sentir o ambiente adverso, os ventos muito fortes e frios, o mar "agressivo", a estepe, a que os meus olhos não conseguiram ver o fim…
Mas , os Pinguins de Magalhães não me entusiasmaram em particular…
Todavia, foi mais uma experiência singular, que, no seu cômputo geral, me agradou.
Rui Oliveira e Sousa
Outubro de 2006
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