“Regresso” hoje a La Paz, a fim de concluir o relato do que mais me marcou na visita que fiz à capital Boliviana, no princípio do corrente ano.
Aliás, a própria localização da cidade causa logo alguma impressão ao visitante, pois, paralelamente ao facto de estar a 3.649 metros acima do nível do mar, La Paz situa-se numa espécie de leito de um grande e extenso vale, rodeado de montanhas, com muito pouco verde, parecendo uma cratera lunar, pelo que configura uma paisagem nada apelativa.
A cor e a vida da cidade são fornecidas pelas pessoas e pela cultura, que a todo o momento marca a sua presença.
Do mirador “Killi Killi”, que proporciona uma magnífica vista de La Paz, pode-se facilmente constatar o que acabei de descrever, e, ao mesmo tempo, ver como a Capital é uma grande urbe.
A cidade, com o passar dos tempos, foi crescendo pelas encostas que envolvem as zonas baixas onde “nasceu”, pelo que, hoje em dia, vivem largos milhares de pessoas nas áreas altas circundantes.
Relacionado com esta circunstância, Marcelo, o guia turístico que me mostrou os locais mais significativos de La Paz, e que, tal como acontecera com outro guia aquando do passeio ao Lago Titicaca, também era licenciado, neste caso em Economia, contou-me que num passado relativamente recente, foram criados dois municípios na Capital, o do Alto e o da cidade de La Paz das zonas baixas.
Acontece que fruto da orografia do terreno, só existe uma via de comunicação rodoviária para entrar e sair de La Paz, que, obrigatoriamente, passa pelo Alto.
Deste modo, as pessoas do Alto, sempre que quiserem, bloqueiam a cidade, não permitindo que nada, nem ninguém, entre ou saia de La Paz.
Acresce que estes mesmos habitantes, regra geral, são das classes mais desfavorecidas, as zonas habitacionais do Alto, por norma, também são mais degradadas, sentem-se discriminados pelo poder político, e, desta forma, a criação de dois municípios, segundo me dizia Marcelo, só veio agudizar as coisas e potenciar mais problemas sociais.
Porventura, ainda todos se recordarão, que durante vários meses, no período anterior às eleições que levaram Evo Morales à Presidência, o clima social em La Paz estava muito agitado, tendo-se verificado então, em diversas oportunidades, a descida de habitantes do Alto até ao centro de La Paz, para se manifestarem, surgindo muitas vezes, actos de violência e bloqueios da cidade.
Outro local que visitei foi a Praça do Templete, situada no centro de La Paz, onde se pode ver a réplica do Monolito Benet, um símbolo da cultura Aymara, e, que tem o nome de quem o descobriu.
Deste sítio, assaz movimentado, designadamente, com muito trânsito automóvel, pela sua relativa proximidade, pode avistar-se parte do Estádio Hernando Silas, que é o estádio situado a maior altitude em todo o Mundo.
Sendo um local de visita obrigatória para quem, pela primeira vez, se desloca à capital Boliviana, de “diferente” somente o Monolito, não tendo registado nada mais que justificasse a visita.
O que torna La Paz realmente singular, é o conjunto formado pela sua localização à já referida altitude de 3.649 metros, aliada a uma orografia “agressiva”, com uma parte urbanística tipicamente colonial, servida por ruas estreitas, empedradas, e algumas com degraus, onde se encontram algumas praças com traçado característico da época, e, ainda, nomeadamente, na parte central da cidade, muitos edifícios modernos, incluindo mesmo arranha-céus!
O conjunto que acabei de descrever, conforme anteriormente escrevi, pode ser apreciado do mirador “Killi Killi”, mas também estive noutro mirador, do lado oposto ao primeiro, e à noite, onde a vista panorâmica de La Paz é magnífica!
As luzes da cidade enquadradas pela sua topografia, permitiram-me usufruir de uma surpreendentemente bela e espectacular visão de La Paz!
Um sítio particularmente típico em La Paz, e deveras procurado pelos turistas, é o tradicional e misterioso Mercado das Bruxas, onde se poderão aprender (!?) diversos rituais de bruxaria Aymara (…), e, principalmente, comprar artesanato local.
O Mercado situa-se numa rua empedrada, do tempo colonial, onde praticamente só existem lojas e bancas de venda, colocadas no exterior das casas, onde se podem comprar folhas de coca, doces, pequenas figuras significando o que se deseja pedir às divindades (amor, dinheiro, amizade, trabalho, saúde, etc.), miniaturas de deuses Incas de diferentes simbologia (amor, viajante, longevidade, etc.), reproduções do que existe em solo Boliviano, relacionado com o Império Inca, e, ainda, fetos abortados de Lamas!
Não é agradável à vista ver os fetos, secos, sobre as bancadas, para quem os quiser comprar…
De acordo com as crenças locais, os Bolivianos compram os fetos de Lama para os enterrarem nas fundações das novas construções, a fim de que tudo corra bem, não haja acidentes e que a terra esteja contente.
A 15 km de La Paz, encontra-se o Valle de La Luna, que constituiu mais outra visita inesquecível!
Trata-se de uma paisagem perfeitamente inesperada – um conjunto de assombrosas, imponentes, e algumas também estilizadas, formações rochosas, parecendo uma paisagem “lunar”, tal á a sensação provocada num visitante, que se confronta com algo totalmente desconhecido, sendo que o que viu de mais parecido, foi em filmes de ficção científica…
Durante o percurso que é permitido os turistas fazerem, é possível observar algumas formas, que a erosão e o tempo moldaram, como, por exemplo, a que parece o rosto de um senhor de idade, conhecida como “A cara do bom Avô“, ou ainda a que é semelhante a um “Chapéu de Senhora“.
Finalmente, ainda um breve apontamento sobre prato típico que comi em La Paz: Fritanga, que, conforme o que então me explicaram, é carne de porco tostada e depois cozida em salsa vermelha e alho, acompanhada de milho cozido e batata.
Bem bom!
Acompanhei a refeição com cerveja Paceña, que foi a melhor das que bebi na Bolívia (também provei Huari e Paceña Pico de Oro).
Porco e milho são alimentos muito utilizados na alimentação Boliviana.
Aliás, também comi outro prato tradicional, com porco frito, milho e batata, mas não me recordo já de como era e qual o sabor que teve…
Mas recordo-me de Fritanga e da Paceña!
Rui Oliveira e Sousa
Junho de 2006
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