“No entanto, todos os cuidados devem ser tomados, nomeadamente nas deslocações ao centro da cidade, evitando zonas de grande concentração de pessoas”, alerta o secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, José Luis Carneiro.
O Governo português está a recomendar aos portugueses a viver em Harare, capital do Zimbabué, que tenham cuidados redobrados nas deslocações para o centro da cidade. Pede ainda que evitem zonas de grande concentração de pessoas, depois da agitação que começou a aumentar na tarde de ontem.
A tensão no Zimbabué começou a aumentar na tarde de terça-feira, 14 de novembro, depois de vários tanques terem sido vistos em direção a Harare, um dia depois de o chefe das forças armadas do país, o general Constantino Chiwenga, ter condenado a demissão do vice-presidente do país e advertido que seriam tomadas “medidas corretivas” se se mantivesse a ‘purga’ de veteranos no partido de Robert Mugabe – o político de 93 anos que está no poder desde a independência do Zimbabué, em 1980.
Em declarações à agência Lusa, o secretário de Estado das Comunidades Portuguesas disse que as informações que as autoridades portuguesas dispõem indicam que se trata de “acontecimentos circunscritos à dimensão política e aos atores políticos do Zimbabué” e que “não está a alastrar à restante comunidade”. “No entanto, todos os cuidados devem ser tomados, nomeadamente nas deslocações ao centro da cidade, evitando zonas de grande concentração de pessoas”, alertou José Luis Carneiro.
O governante referiu ainda que o Governo está em contacto com os serviços consulares, “que por sua vez estão em contacto com serviços consulares da União Europeia e a acompanhar o evoluir da situação”, numa região onde residem cerca de mil portugueses. Os serviços da embaixada portuguesa em Harare estão a enviar mensagens aos residentes portugueses informando que, devido à situação no país, aconselham a manter a calma e evitar agrupamentos. Sugerem ainda que sejam evitadas deslocações ao centro da cidade.
Português diz que vida decorre sem problemas
A comunidade portuguesa, que em todo o país está estimada em cerca de 1.200 pessoas, mantém-se calma e a vida em Harare decorre normalmente, disse à Lusa um emigrante português a viver na cidade.
António Simões, de 50 anos e natural da África do Sul, proprietário de um restaurante a menos de um quilómetro do centro de Harare e há 24 anos no país, salientou que a única diferença para um dia perfeitamente normal é a presença de militares nas ruas e avenidas mais movimentadas junto ao palácio do Governo, parlamento e ministérios. “Apenas é proibida a circulação automóvel junto a estes locais, mas as pessoas podem atravessar a zona a pé, sem problemas”, salientou, contatado por telefone em Harare a partir de Lisboa.
António Simões diz que mantém o estabelecimento aberto e que está a servir almoços normalmente, não existindo confrontos nem escaramuças. Pelo menos é isso que está a ser indicado na televisão e rádio oficiais, já nas mãos dos militares, que têm apelado à população para manter a calma e continuar com a vida normalmente, evitando apenas as zonas controladas pelos militares, acrescentou à Lusa.
Se em Harare a situação é pautada pela normalidade, quebrada apenas pela presença de militares nalgumas ruas da capital, em Bullawayo, segunda maior cidade do país, apenas se sabe da crise político-militar pela televisão e rádio oficiais. Contatado telefonicamente pela Lusa a partir de Lisboa, o empresário português Rodrigo Tavares, 74 anos e há 41 no país, explicou, a partir de Bullawayo, onde residem 33 portugueses, que nem polícias nem militares patrulham as ruas. Segundo o antigo Tesoureiro da Comunidade Portuguesa ali residente e natural de Vendas Novas (Portugal), não há qualquer sinal visível de preocupação entre a população.
“Educação e civismo da população”
Em Harare, António Simões adiantou à agência Lusa que os únicos sons de confrontação que ouviu foram os de duas explosões – “há quem fale de três” – ocorridas “cerca da 1h da madrugada” (23h de terça-feira em Lisboa), mas diz que, desde então, nada mais aconteceu. O empresário português adiantou, por outro lado, ter conhecimento de que houve pequenas escaramuças quando os militares tentaram deter alguns ministros do Governo de Robert Mugabe nas respetivas casas.
Mas António Simões, destaca que o “nível superior de instrução, educação e civismo da população” o leva a pensar que a crise político-militar estará resolvida nas próximas 24 a 48 horas sem derramamento de sangue.
“Ao contrário de outros países africanos, em que a presença de militares nas ruas é um mau presságio, não há no Zimbabué uma tradição de violência, pois é um povo educado e com um nível de instrução superior e não há qualquer tipo de hostilidade, até porque não existe também uma oposição militarizada que possa agravar a situação”, explicou.
A atual crise no Zimbabué surgiu após a destituição, na semana passada, do vice-presidente Emmerson Mnangagwa, que era apontado como sucessor de Mugabe, tal como a primeira-dama Grace Mugabe. Mnangagwa há muito considerado o delfim do Presidente, foi humilhado e demitido das suas funções e fugiu do país após um braço-de-ferro com a primeira-dama.
Figura controversa conhecida pelos seus ataques de cólera e dirigente do braço feminino do partido do marido, Grace Mugabe, de 52 anos, tem muitos opositores tanto no partido como no Governo. Com este afastamento, fica na posição ideal para suceder ao marido, que, apesar da idade avançada e da saúde frágil, foi nomeado pela Zanu-PF como candidato às eleições presidenciais de 2018.